DO SILÊNCIO ADMINISTRATIVO
Inércia
Administrativa Genérica
A
abordagem do tema ora enfocado pressupõe a idéia de que a administração pública
tem o dever de agir, exatamente porquanto da sua atividade é que resultará a
organização e o equilíbrio do Estado e da vida dos cidadãos.
A ação
administrativa é freqüentemente vista
sob a ótica genérica do referencial aos chamados poderes públicos.
A
visão contemporânea de tais poderes está
a mostrar o seu caráter instrumental em relação ao cumprimento da atividade fim,
ou seja dos deveres da administração.
Mais
correto, portanto, falar-se em um dever que se exercita pela via do poder, como
simples mecanismo de consecução do primeiro.
Entre
nós Celso Antônio Bandeira de Mello lança luzes sobre a matéria: (1)
“No passado,
sublinhavam-se muito os “poderes” da Administração. Ao depois, como hoje já se
faz com alguma habitualidade, passou-se a mencionar os “poderes-deveres” da
Administração. Ainda assim, o binômio está mal-expressado. O que se deve
encarecer é que a Administração-e, pois, o administrador-enfeixam
“deveres-poderes”, porquanto os poderes têm destino apenas serviente. O direito
administrativo por isso, não se aglutina-como ingenuamente possam pensar
administradores desmandados em torno da noção de poder, mas congrega-se ao
derredor da idéia de dever e - repita-se - de obsequiosa obediência às
finalidades estipuladas no imperativo legal”. (In. Discricionariedade e
Controle Jurisdicional, editora Malheiros, 1992, p. 54)
Assim,
a administração deve agir para conseguir os seus fins e se não o faz,
compromete a sua inteireza, e o seu próprio perfil ontológico.
Nestes
termos, o omitir-se da administração traduz-se em quadro patológico de extrema
gravidade.
Isso
inobstante no direito pátrio não se tem dado o correto e aprofundado tratamento
à prática abstencionista, cuidando-se quase sempre da análise dos atos
positivos, quer do ângulo da sua perfeição, quer dos reflexos na
responsabilidade do Estado.
A
legislação, por seu turno quase sempre tenta remediar a omissão administrativa
pela simples responsabilização dos agentes públicos, punindo-se o mal feitor,
sem a rigor corrigir o mal.
Em uma
classificação que remonta à Roma Antiga, declaram-se perfeitas as sanções,
quando cogentemente se obtém a prestação não realizada pelo modo natural. Ao
contrário são menos que perfeitas aquelas
que se limitam a impor cargas valorativas negativas ao responsável pelo
ilícito.
Ora, o
cidadão diante da administração guarda a expectativa de que esta cumpra o seu
dever e não é razoável que se afrustre, ainda quando se veunha a punir o agente
relapso
A
inércia administrativa caracteriza-se quando o Poder Público descura-se dos
seus deveres e encargos constitucional e legalmente previstos.
Essa
situação se caracteriza no dia a dia, ora pela ineficiência da máquina estatal,
ora pela má condução da coisa pública outras vezes pela culpa ou dolo do
servidor ou agente.
Em
tais casos haverá dano à coletividade reparável, segundo a hipótese concreta
por meio de indenização civil.
Particularmente
centraremos o debate a uma perspectiva mais reduzida, qual seja a da inércia
específica, resultante do não pronunciamento governamental, em face de ato
provocativo do administrado.
Essa
modalidade singular tem sido conhecida na doutrina sob a rotulação de “silêncio
administrativo”.
Origens e
precedentes no direito comparado.
Costuma-se
estabelecer como origem legal ao tratamento do silêncio administrativo um
Decreto de 02 de novembro de 1864, editado em França, pelo qual seriam
consideradas negadas todas as pretensões dirigidas aos Ministros, que no prazo
de 04 meses não obtivessem resposta.
Posteriormente
a Lei de 17 de julho de 1900, no seu art. 3º, estendeu o tratamento jurídico a
todos os reclamos veiculados perante qualquer órgão da administração pública.
Na
Espanha essa questão surge por força do impacto gerado pela Ordenança Real de
09 de junho de 1947 que estabeleceu como condicionante de acesso a via judicial
o prévio afrontamento da Instituição pública.
Consoante
explicitado em tal norma, a exigência se fazia necessária de tal modo a
permitir que o governo pudesse reparar seus atos e obter soluções mais
adequadas, antes de ser submetido a instância judicial.
Diante
disso, a jurisprudência passou a alertar de modo firme quanto a necessidade de
uma posição terminativa da administração de modo a não inibir o exercício do
direito de ingresso em juízo.
Somente,
entretanto, em 1924 é que se estabeleceu a possibilidade de ultrapassagem da
via administrativa, quando o silêncio, por decurso de prazo seria interpretado,
em princípio, negativamente, isto é, no
sentido de recusar procedência à reclamação.
Na
Itália em 1934 a Lei Comunal e Provincial estabeleceu a admissão do silêncio
como forma negativa de resposta ao pleito.
Na
Argentina, pelo Código de Procedimentos (Lei nº.19.549) se estabeleceu o
princípio da denegação tácita pelo silêncio.
O
mesmo diploma legal contemplou em caráter excepcional e mediante previsão
expressa a perspectiva de que a atitude
silenciosa viesse a ser interpretada de modo positivo, isto é em favor
do administrado.
Estabelecidas
estas premissas vamos verificar qual a acepção e significado do silêncio
administrativo e sua importância na formação do Estado de Direito.
Conceitos e
distinções.
Trabalharemos com a hipótese conceitual segundo a qual
deve-se ter por silêncio administrativo em sentido estrito a atribuição de um
significado de outorga ou negativa de um
pedido ou recurso, uma vez transcorrido o prazo estabelecido para a
administração pronunciar-se.
Nesse
compasso estabelecem-se duas
categorias claramente distintas, quanto
a repercussão do silêncio que podem ser identificadas, como
silêncio negativo e silêncio positivo.
O
primeiro, como já se pontuou resulta em admitir-se como rechaçada a pretensão que não foi respondida ou resolvida no tempo previsto em Lei.
Cumpre
de plano indagar-se qual o proveito que resultaria para o administrado na
extração de tal exegese.
Se
examinarmos a Lei de Mandado de Segurança no Brasil (Lei 1.533 de 31 de
dezembro de 1951), verificar-se no seu art. 5º o descabimento do remédio
heróico contra ato de que caiba recurso administrativo, a que se atribua efeito
suspensivo.
O
Legislador claramente convidou a parte a
residir com anterioridade na instância administrativa, inibindo a exercitação
da ação judicial, se aquela via enseja a suspensão da eficácia do ato.
A
questão se complica, entretanto quando exercitado o recurso administrativo
cabível, a administração não lhe confere solução, procrastinando o desate da
matéria posta ao seu crivo, em situação de insegurança e desconforto para o
interessado.
Nesse
caso, se, induvidosamente, o silêncio
puder ser interpretado como negação do pedido, pelo menos a parte poderá agitar a via judicial, em busca da
estabilidade da relação.
À
falta de Lei específica muitas vezes
tem-se percorrido o tormentoso caminho de buscar-se a Justiça, tão
somente para obter-se a pronuncia administrativa e a partir do resultado
obtido, encetar-se nova lide judicial.
Por
essa forma, a doutrina do silêncio
negativo representa avanço no
campo das relação entre administrado e administrador.
O
segundo ponto que deve ser investigado consiste em saber se é possível
adotar-se o silêncio negativo, sem previsão legal.
O
nosso entendimento inclina-se pela afirmativa, lastreado na circunstância de
que a ausência de pronunciamento deve inequivocamente merecer uma
interpretação, considerando-se que se trata de uma conduta que produz
efeitos na órbita do administrado.
O art.
5º, inciso XXXIV, “a” da Constituição Federal assegura:
“ O direito de petição
aos Poderes Públicos em defesa de direitos ou contra ilegalidades ou abuso de
poder”.
Logo é
evidente que ao direito de pedir corresponde o direito de obter a resposta e ao considerar-se que essa resposta poderá
ser positiva ou negativa é possível interpretar-se a ausência de manifestação
explícita, em um sentido ou em outro.
Assim
quando a Constituição estatui que nenhuma lesão se exclui da apreciação do
Poder Judiciário esta lesão pode advir tanto de atos como de comportamentos.
Chegaremos
pois à conclusão de que em regra a
administração quando não explicita o seu posicionamento assume comportamento,
do ponto de vista lógico equivalente ao da negativa, como regra.
Não se
ignora, que no plano privado em princípio deve prestigiar-se a máxima latina,
segundo a qual: “ qui tacet utique non facetur”, porque o particular, salvo as
determinações legais ou contratuais não está obrigado a se manifestar.
Ao
contrário, o Poder Público diante do direito de petição tem o dever
correspondente de resposta, na medida em que não lhe é dado o “non liquet”,
porquanto o seu absenteísmo deve ser tomado como recusa, salvo situações que
adiante serão examinadas.
A
nossa ilação é, pois, no sentido de que
se deva conferir ao silêncio característica negativa sempre quando a natureza
do ato o comporte e a Lei não vede expressamente tal interpretação ou não lhe atribua outro
efeito.
Tal
raciocínio tem espeque, inclusive, na
teoria do ordenamento jurídico, segundo a qual ao particular o que não lhe está proibido, está facultado.
Forma-se
assim, como é sabido, um contínuo de licitudes e um descontínuo de ilicitudes,
no âmbito da cidadania.
Porisso,
o pleito exercitado pelo particular, a rigor submete-se frente a administração,
a uma possibilidade de veto, veto este que deve ser exercitado em um
determinado tempo.
Cabe
agora saber, se a Lei não fixa um prazo para manifestação administrativa, até quando
se deve aguardar o desfecho da postulação.
O
problema não é singelo, tendo em vista a dificuldade de uniformização temporal
para o proferimento das decisões, face a diversidade de grau de complexidade de
cada matéria.
Não
será, todavia, a lacuna legal que haverá de reduzir a pó o direito assegurado
constitucionalmente.
Nesse
caso, há de buscar-se o critério da razoabilidade, sem dúvida nenhuma categoria
jurídica enquadrável no elenco dos chamados conceitos fluídos ou imprecisos,
mas nem por isso inapropriável pelo interprete do direito.
Mais
uma vez chama-se à colação Bandeira de Mello:
“ Logo, tem-se que
aceitar, por irrefragável imposição lógica, que, mesmo que vagos, fluidos ou
imprecisos, os conceitos utilizados no pressuposto da norma (na situação fática
por ela descrita, isto é, no “motivo legal”) ou na finalidade, têm algum
conteúdo mínimo indiscutível. De qualquer deles se pode dizer que compreendem
uma zona de certeza positiva, dentro na qual ninguém duvidaria do cabimento da
aplicação da palavra que os designa e uma zona de certeza negativa em que seria
certo que por ela não estaria abrigada. As dúvidas só tem cabida no intervalo
entre ambas. Isto significa que em inúmeros casos será induvidoso que uma
situação é, exempli gratia, urgente, ou que seguramente não o é; que há um
interesse público relevante ou que certamente não há; que dado cidadão tem
reputação ilibada ou não a tem; que possui ou não possui notável saber; que
determinado evento põe em risco a segurança pública, a moralidade pública, a
tranquilidade pública ou, pelo contrário, que não as molesta”. (in. op cit.
pag.29)
Estabeleça-se,
pois, que à falta de Lei, deve-se entender que a manifestação administrativa
deve-se exercitar, segundo as circunstâncias, em prazo RAZOÁVEL.
Aí
está um conceito plenamento suscetível de ser aprisionado factualmente, de modo
a permitir-se saber, com relativa margem de segurança se a administração
extrapolou ou não, em termos de tempo, a faixa de razoabilidade.
A
rigor poder-se-ia invocar o postulado inglês para sustentar que os atos devem
ser praticados e a resposta ser dada, na omissão da Lei “as soon as possible”,
vale dizer, logo que possível.
De
qualquer modo, não se poderá perder o horizonte das raízes históricas no
direito comparado, suscetíveis de instrumentar a interpretação analógica.
Como
já fixado, no direito francês estabeleceu-se um prazo de 04 meses, no máximo
para qualquer solução.
Na
Espanha idêntico lapso foi adotado pelo regulamento administrativo de 1954.
O
mesmo ciclo temporal foi estabelecido na Itália.
No
Brasil podemos desenvolver o discurso, por via indireta. É que a ação
mandamental está sujeita a prazo decadente de 120 dias, quando então o ato
administrativo não mais pode ser atacado, por essa via.
Fixou-se
assim um período máximo de tolerância para o administrado. Usando-se o mesmo
parâmetro e para criar-se um critério isonômico, a mesma regra poderá ser
aplicada quanto ao silêncio da administração, estabelecendo-se assim tal
período, em qualquer hipótese como o máximo admissível para a pronúncia
tempestiva.
Isso
não quer dizer, que dadas as circunstâncias possa o prazo ser substancialmente
menor, quando a demanda encaminhada não envolva maior complexidade “verbi
gratia” o fornecimento de certidões.
A
razoabilidade será aferida ademais tanto em função da natureza da tarefa a ser
empreendida pelo órgão público, quanto diante da urgência ou da utilidade da
outorga ou do deferimento pretendido.
Daí é
que não se pode permitir ao Poder Público prazo tal, que torne inútil o
pronunciamento.
O que
é preciso insistir é no fato de que a ausência de previsão legal nem impede a
adoção do silêncio negativo, nem muito menos
o entendimento da existência de um lapso prazal.
Urge
agora contemplar a chamada figura do
silêncio positivo de aplicação menos frequente, exatamente pelas peculiaridades
de que se investe.
Haverá
silêncio positivo quando a abstenção administrativa possa importar em concessão da pretensão deduzida.
Fiorini
em sua obra “Derecho Administrativo”(2), traz o depoimento, no sentido de que
no sistema Argentino, enquanto o silêncio negativo é a regra, o silêncio
positivo decorre sempre de lei.
Essa
observação, pode, a grosso modo, ser generalizada nos sistemas jurídicos
contemporâneos que dão tratamento à matéria.
Garrido
Falla (3) já havia assinalado algumas dificuldades inerentes a exegesa positiva
do silêncio.
Questionou,
por exemplo a dificuldades de que se teria de submeter a administração, a um
pronunciamento não emanado de forma direta.
A
observação procede quando se tem em
conta a perspectiva de obter-se um benefício que dependa diretamente da interferência da entidade pública, como
será o caso do funcionário que postule
adicional remuneratório por tempo de serviços.
Nesse
caso, com muita probalidade a atribuição de tal efeito resultará inócua, a
exigir a implementação da vantagem, pela via judicial.
Não
será assim, todavia, quando se cogite de licença para prática de uma
determinado ato, cujo exercício dependerá apenas do particular, desde que o
Poder Público não o obstacule.
É a
situação especificamente da licença para construção ou edificação onde o
interessado há de buscar a aquiescência do Poder Público, que se desatará em
procedimento inteiramente vinculado.
Muito
especificamente a legislação do Município de Salvador num dos poucos exemplos
encontradiços, a tal respeito, permite que o munícipe inicie a construção, se
decorrido o prazo a obtenção do Alvará não foi este concedido.
Embora
possa por muitos ser considerado um avanço e estamos em companhia destes, não
há negar a existência de alguns
transtornos decorrentes de tal postura.
É
facilmente perceptível a dificuldade de comercialização de um imóvel, cuja
licença de construção não foi expressamente concedida, pela insegurança de que
se nutrirão os espíritos dos adquirentes em potencial.
Tudo
isso porque em verdade como bem assinalado na doutrina, para configuração do
silêncio positivo é necessário que o ato
vindicatório se encontre em estrita conformidade com a lei. Mais do que isso,
que o requerimento não apreciado, tenha sido instruído com todos os documentos
que possibilitariam sua regular apreciação.
Afora
esses aspectos, gera-se uma outra dificuldade, qual seja a de ir-se a juízo para pacificação do direito deduzido,
quando por presunção legal já este teria
sido acatado.
Como
anota com propriedade Ernesto Garnica(4):
“ Sob a perspectiva
do interessado a efetivação do silêncio positivo é sobretudo duvidosa. Quando
seja discutível se o pedido se acomoda ou não à legalidade o interessadoa se
opta por atuar, ver-se-á submetido a um inevitável risco; como anotou
Santamaria Pastor, o interessado se encontrará ante o dilema de fazer ou não
fazer o uso do silêncio sem que ao menos possa em princípio provocar os
tribunais para que aclare a sua situação, já que não pode atuar como demandante para que se confirme um ato
presumido, por silêncio positivo”. (In. El Silencio Administrativo en el
Derecho Español, editora Civitas S/A., 1992, pag.179).
Ainda
é de se registrar que o silêncio positivo deve ser restrito àquelas situações
resultantes de procedimentos e atos vinculados, de tal sorte a emprestar-lhes
um mínimo grau de certeza.
Andou
bem, entretanto, no particular, o Código de Procedimentos Administrativo da
Espanha, quando no seu art. 95 estabeleceu a existência de silêncio positivo em
relação a recursos administrativos pendentes, quando a decisão de origem é
favorável ao administrado.
Nesse
caso, tendo sido a relação jurídica acertada na instância inferior não se
justifica que se lhe impeça a executoriedade por conta da passividade do órgão
hierárquico de maior grau.
É de
registrar-se por fim o nosso sentimento de que ao se cuidar de silêncio
positivo deveremos contar com lei expressa, ao contrário do que defendemos
quando se cuida de silêncio negativo.
De outras
nodalidades de silêncio
A
dicotomia simplista entre silêncio negativo e silêncio positivo não abrange
todo leque de situações que juridicamente podem ocorrer.
Certamente
há de se ter presente que em determinadas situações não se poderá cogitar nem
de interpretação negativa, nem de interpretação positiva, por estrita
impossibilidade lógica, devendo-se nesse caso limitar-se o legislador a
estabelecer a responsabilização do agente retardatário.
Tal
ocorrerá quando o ato administrativo resulte de uma construção a ser elaborada
pelo agente público.
Não
será possível, portanto diante de uma licitação cujo resultado não foi
declarado, de modo a proclamar-se vencedor um entre vários concorrentes,
lograr-se a atribuição de uma solução em favor de um ou de outro,
ultrapassando-se a organização estatal.
Em
hipóteses que tais o remédio será mesmo compelir-se o administrador a praticar
o ato, já que não se concebe alternativa diversa.
O
mesmo se diga em relação ao professor de Universidade Pública que dispõe de um
prazo para atribuição de notas a determinadas provas, mas por não atendê-lo,
não dará azo, a que por exemplo se repitam notas anteriores ou se venha a suprir
a avaliação por outro modo.
Para
esses casos construímos o enlace
conceitual de atos administrativos insubstituiveis.
Poderíamos
ainda falar no que rotularemos como silêncio preclusivo, onde o decurso
do tempo dispensa pura e simplesmente a prática do ato.
Tal
situação se verifica no direito parlamentar brasileiro, quando
exemplificativamente uma comissão técnica deixa de opinar na oportunidade
adequada sobre certo projeto, que então é encaminhado a Plenário, com supressão
da instância.
Em
algumas outras situações a emissão de parecer é dispensada, quando o
parecerista transpõe a barreira temporal.
Nesses
casos, a formalidade é simplesmente dispensada e a manifestação administrativa
torna-se inexigível.
Da
manifestação tardia da administração
Questão
que vem a baila concerne a possibilidade de vir a administração a atuar em
processo administrativo, findo o prazo que a lei lhe concedeu, e quando
portanto já se podem extrair os efeitos
do silêncio.
Pensamos
que a questão deve ser encaminhada em torno da indagação a quem aproveitam os
efeitos do silêncio.
Se
concluímos que se trata de instituição
de proteção do administrado, não haverá dúvida de que poderá este beneficiar-se
da solução tardia quando se profira em seu favor, ainda quando o decurso de prazo
lhe pudesse autorizar a conclusão negativa.
Sem
dúvida, entretanto, se a parte ao captar o sentido negativo do silêncio já
atuou na via judicial, não cabe a administração pugnar pela improcedência da
lide, porquanto induvidosamente a alçada da decisão foi transferida a outra
esfera.
É
certo que o reconhecimento do pedido ainda que extemporâneo deverá ser sempre
levado em conta, mesmo em sede judicial, quando a ação perderá o objeto, sem
prejuízo da responsabilidade da administração pelos danos causados.
Questão
outra a ser deslindada é aquela em que o silêncio negativo possa ter-se
operado, com afetação de direitos de terceiros, beneficiados pela não
concessão.
Nesse
caso, entendemos não ser possível a afetação de direitos oriundos da presunção
de não outorga, dado que não podem ser prejudicados aqueles que agiram em boa
fé.
É
preciso que se tenha em conta que a relação travada entre o administrado e a
administração pública pode projetar efeitos externos que devem ser
resguardados.
Esse
aspecto mais se flexibiliza, quando não tenhamos prazo certo fixado em lei.
De
qualquer modo em sede do direito brasileiro a equação pode ser encontrada nos
termos da súmula 473 do Supremo Tribunal Federal, segundo a qual:
“S. 473 - A
administração pode anular seus próprios atos quando eivados de vícios que os
tornam ilegais, porque deles não se originam direitos, ou revogá-los por motivo
de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos e
ressalvada, em todos os casos a apreciação judicial”.
Desse
modo, tal como se tivesse praticado o ato de modo concreto, o administrador
pode anular ou revogar os efeitos emergentes da prática silencial, atendidas as
consequências exteriorizadas na súmula, cuja matiz doutrinária sabe-nos
acertada.
Esse
entendimento deve-se ressaltar prevalece tanto em relação ao silêncio negativo,
quanto ao positivo, sendo que neste último só será admissível a via anulatória
em face do respeito que o Poder Público deve ao ato jurídico perfeito e
acabado.
O estágio
brasileiro
Adiantamos
no início desse trabalho o incipiente tratamento dado a matéria no cenário
nacional, onde a legislação esparsa e não sistematizada está em companhia da
ausência de maiores avanços na
construção científica do tema.
É
certo que em sede de jurisprudência podemos registrar a existência da súmula
429, que admite genericamente o uso de Mandado de Segurança contra omissão da
autoridade, sem contudo traçar com maior clareza a extensão do conceito de tal
conduta omissiva, nem precisar suas exatas consequências.
De um
modo geral o tema vem tratado entre nós com ênfase no direito de indenização ao
prejudicado, à luz da teoria do abuso de poder.
Nesse
sentido os trabalhos clássicos de Caio Tácito(5), o abuso de poder
administrativo no Brasil e Seabra Fagundes(6) - Responsabilidade no Estado
Indenização por retardada decisão administrativa.
Pretende
pois este ensaio avivar o interesse dos artifices do direito no debate de tão
empolgante questão.
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