terça-feira, 31 de julho de 2012

Veja argumentos dos 33 advogados do mensalão

Por Rafael Baliardo

No início de junho, em entrevista à jornalista Mônica Bergamo e ao sociólogo Antonio Lavareda, veiculada no programa Ponto a Ponto, da emissora de TV por assinatura BandNews, o advogado criminalista Márcio Thomaz Bastos desabafou contra o que classificou de “publicidade opressiva da imprensa em casos de grande repercussão”. O mote da entrevista era a “CPI do Cachoeira” e o fato de Bastos defender o explorador de jogos Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira. “[...]O único a segurar a mão do réu no fim da escada, crucificado e contra o vento”, disse o criminalista ao descrever o que é ter toda a opinião pública contra si quando teve — e tem — que defender réus impopulares, geralmente vindos do universo político e que encarnam as mazelas da vida civil do país.
No calor da CPI que resultou na cassação do senador goiano Demóstenes Torres, o criminalista teve até mesmo seus honorários advocatícios questionados quando um procurador do Rio Grande do Sul resolveu acusá-lo de “receptação culposa”, uma vez que o pagamento pelos seus serviços teria origem "ilícita", já que a receita de seu cliente, segundo o procurador, era "fruto de contravenção".
Márcio Thomaz Bastos também é advogado do ex-vice-presidente operacional do Banco Rural, José Roberto Salgado, integrante do Comitê de Prevenção de Lavagem de Dinheiro do banco e réu na Ação Penal 470, o processo do mensalão. No processo, Salgado é acusado de gestão fraudulenta, lavagem de dinheiro, formação de quadrilha e evasão de divisas. Junto dos advogados dos outros 37 acusados, a função de Bastos, que foi ministro da Justiça durante o primeiro mandato do presidente Lula, tem sido descrita como a de criar manobras para retardar o julgamento ou então enfraquecer, amparado em tecnicismos jurídicos, uma provável condenação.
Com o início do julgamento marcado para a próxima quinta-feira (2/7), os criminalistas que cuidam da defesa dos réus chegam, sob os olhares da mídia e da opinião pública, às trincheiras do caso. Maior esquema de corrupção da história recente do país, arremedo dertupado de denúncias ou qualquer coisa entre esses dois extremos, as acusações colocam os 33 advogados do caso sob a alça de mira da imprensa e do crivo popular. Para aqueles que vêm o julgamento como uma chance histórica de se fazer Justiça num país onde grassa a impunidade, o papel da defesa é reduzido a levantar pretextos para evitar que se cumpra o que é justo. Para aqueles que temem o grau de polarização presente no julgamento, a atuação dos advogados tem uma função crucial.
Primeiro movimento
Diferentemente de muitos países, a sustentação oral no Pleno do Supremo Tribunal Federal não se dá em audiência prévia marcada antes de os julgadores firmarem juízo e formularem seus votos. Ainda assim, a participação dos advogados, que devem se revezar entre os dias 3 e 14 de agosto falando aos ministros, está longe de ser meramente protocolar.
Originalmente, a defesa dos quatro ex-dirigentes do Banco Rural estava sob os cuidados de Márcio Thomaz Bastos que, depois de substabelecer a responsabilidade a outros colegas, cuida apenas das acusações contra José Roberto Salgado. A defesa da vice-presidente de Suporte Operacional do banco, Ayanna Tenório Tôrres de Jesus, é do advogado Antônio Cláudio Mariz de Oliveira. Kátia Rabello, ex-presidente do banco, é representada pelo criminalista José Dias Neto e pelos sócios do escritório Campos Júnior Pires & Pacheco, de Belo Horizonte. Vinícius Samarane, ex-diretor estatuário, é também defendido pela banca.
Assim como no caso de Salgado, as defesas dos outros ex-dirigentes do Banco Rural pretendem questionar a competência do Supremo para julgar os 34 réus que não dispõem de foro privilegiado. Apenas os deputados federais João Paulo Cunha (PT-SP), Pedro Henry (PP-MT) e Valdemar Costa Neto (PR-SP) têm prerrogativa de foro. Apesar de ser improvável que os ministros acolham o pedido, como informou a revista Consultor Jurídico, a Questão de Ordem levantada por Márcio Thomaz Bastos com o argumento não se limita a uma solicitação de desdobramento do processo, mas diz que o julgamento de réus no STF sem prerrogativa de foro fere pelo menos dois princípios amparados numa perspectiva constitucional: a do juiz natural e o direito ao duplo grau de jurisdição. Os réus, se condenados, não terão o direito de recorrer da decisão.
Núcleo financeiro
No que toca ao mérito do processo, os advogados dos quatro réus do Banco Rural, que procedem com os trabalhos de defesa de forma separada, lembram que as acusações contra os ex-dirigentes se amparam tão somente na incerteza sobre a regularidade dos procedimentos bancários que envolveram os três empréstimos concedidos, respectivamente, em 2003, em favor da SMP&B Publicidade, da holding Graffiti — ambas do grupo de Marcos Valério — e do Partido dos Trabalhadores. No caso dos ex-dirigentes do Banco Rural, as defesas não entram no mérito da existência ou não do chamado mensalão, uma vez que não pesam contra os executivos as acusações de compra de apoio político, razão de ser da Ação Penal. A defesa do nomeado núcleo financeiro do escândalo do mensalão irá se ater, portanto, apenas nas acusações de crimes financeiros.
Os advogados querem demonstrar que as denúncias contra os ex-dirigentes do banco não mostram qualquer evidência, já que os empréstimos foram considerados legítimos por laudo produzido em perícia técnica do Instituto de Criminalística da Polícia Federal, a pedido do relator do processo, ministro Joaquim Barbosa. Segundo a defesa, não só havia razões formais e financeiras suficientes para a concessão dos empréstimos, como seus trâmites foram regulares, como atestam os laudos. Segundo os advogados, a liquidação da dívida pelo PT na instituição financeira e uma decisão favorável ao banco na Justiça de Minas Gerais, no processo de execução da dívida das empresas do publicitário Marcos Valério, também confirmariam a normalidade das condições sob os quais os empréstimos foram autorizados.
Para os advogados, nem mesmo por gestão temerária podem ser responsabilizados os dirigentes do banco. Ao contrário do que afirma o Ministério Público — que os saques não foram informados ao Banco Central —, o advogados garantem que os saques foram, sim, comunicados ao Conselho de Controle das Atividades Financeiras dentro das normas estabelecidas pelo Banco Central, que na época exigia a indicação do CNPJ da empresa e não o CPF da pessoa autorizada a sacar. Os advogados também rejeitam a tipificação como “lavagem de dinheiro”, uma vez que os recursos movimentados nas contas das empresas de publicidade de Marcos Valério tinham origem conhecida, não havendo razão para se dissimular sua natureza.
Quanto à evasão de divisas, os advogados apontam que o Ministério Público desconsidera o fato de que a remessa de dinheiro para uma conta do publicitário Duda Mendonça foi efetuada entre instituições sediadas no exterior, não ocorrendo, dessa forma, a saída de recursos do país. A defesa ainda observa que instituições financeiras responsáveis pelo depósito listadas pelo Ministério Público como filiais do Banco Rural não são, de fato, filiais do banco, tendo administração independente. O vínculo apontado pela Procuradoria-Geral da República seria, portanto, inexistente.
Núcleo político
Já a estratégia das defesas dos réus do chamado “núcleo político” terão de se deter no mérito da existência ou não de articulação da compra de apoio de parlamentares por membros do governo durante o primeiro mandato do governo Lula.
Um exemplo é a defesa do então deputado Valdemar Costa Neto, ex-presidente do PL e hoje presidente de honra do PR, que está a cargo do advogado Marcelo Luiz Ávila de Bessa.
A defesa aponta a ausência de ato de ofício praticado pelo parlamentar, ou seja, questiona onde a “vantagem indevida” concedida pelo político e fruto da compra de apoio pode ser comprovada. Valdemar Costa Neto é acusado dos crimes de formação de quadrilha, lavagem de dinheiro e corrupção passiva.
A defesa do político sustenta que o Ministério Público Federal “deixou de especificar, tanto na peça inicial acusatória como nas alegações finais, qual (ou quais) ato(s) funcional(is) teria(m) sido praticado(s) pelo denunciado Valdemar Costa Neto em troca de alguma vantagem indevida”. A defesa tentará demonstrar que as relações do político com personagens do escândalo se deram por questões envolvendo a composição de um caixa de campanha conjunto entre o PT e o PL e por eventuais dívidas, pagamentos e movimentações financeiras naturais da administração do caixa de campanha. Para a defesa, não há qualquer evidência que sustente a versão da lavagem de capitais ou associação entre agentes políticos para o cometimento de atos ilícitos que visassem vantagens para o governo Lula.
José Dirceu, ao lado de José Genoíno e Delúbio Soares, é apontado como o epicentro que coordenava todo o esquema de compra de apoio político de parlamentares, sendo os três, de acordo com o Ministério Público, o elo entre a cúpula do PT e o grupo do publicitário Marcos Valério.
A defesa do ex-ministro da Casa Civil será a primeira do núcleo a falar aos ministros nesta sexta-feira (3/8). O cerne do argumento do criminalista José Luís de Oliveira Lima, que defende Dirceu, é a ausência de evidências materiais que sustentem a versão da Procuradoria-Geral da República, além da série de depoimentos de Roberto Jefferson, que denunciou, em 2005, o suposto esquema da compra de apoio político. A defesa afirma que apesar de mais de 500 depoimentos sobre o escândalo, ninguém foi capaz de detalhar e amparar com provas as acusações feitas pelo ex-presidente do PTB.
Tanto Dirceu quanto José Genoíno sustentam que não há evidências que demonstrem que sua atuação, à epóca, se desdobrava além do plano essencialmente institucional. O advogado Luiz Fernando Pacheco, que representa Genoíno, a exemplo da defesa de Dirceu, tentará demonstrar que não há subsídio para se entender que a atuação de Genoíno cruzava, além do plano político, com a as atividades do então secretário de finanças do PT, Delúbio Soares.
Por sua vez, a defesa de Delúbio Soares também argumenta que os empréstimos contraídos juntos aos bancos BMG e Rural foram destinados a dívidas de campanha de partidos aliados à coligação que elegeu o PT em 2003. O acordo foi fruto do entendimento de que os custos de campanha deviam ser repartidos, mas não há evidências que o custeio das dívidas estava condicionado à emissão de votos favoráveis a projetos do governo em trâmite na Câmara, afirma a defesa. O advogado do ex-tesoureiro do PT é o criminalista Arnaldo Malheiros Filho, que reclamou em outras oportunidades das dificuldades de acesso aos autos do processo.
Delator do esquema, o ex-deputado federal Roberto Jefferson internou-se, na quinta-feira (26/7), para retirar um tumor no pâncreas e deve passar os primeiros dias do julgamento hospitalizado. O que distingue a defesa do ex-parlamentar da de outros réus é que os argumentos formulados pelo advogado Luiz Francisco Corrêa Barbosa, que o representa, devem contrariar as declarações do próprio político. A sustentação oral de Barbosa é uma das mais aguardadas por conta da expectativa de que o advogado afirme, como tem feito, que o presidente Lula sempre esteve ciente do suposto processo de compra de apoio parlamentar. Jefferson, que é acusado de corrupção passiva e lavagem de dinheiro, declarou, em outras oportunidades, que o ex-presidente "pode abraçar o pecador, mas não o pecado", dizendo que embora haja discordância entre sua a versão e a do próprio advogado, este tem autonomia para proceder com a defesa.
Núcleo operacional
Para o advogado Marcelo Leonardo, que representa o publicitário Marcos Valério, o prazo de uma hora para a defesa, no caso do réu, é insuficiente. A defesa irá apresentar a mesma preliminar levantada pelo colega Márcio Thomaz Bastos sobre o problema de se julgar, em uma corte constitucional, réus sem prerrogativa de foro. A exemplo de Bastos, o advogado de Marcos Valério menciona precedentes de oito ministros do STF no sentido de desmembrar o processo, insistindo na afronta ao princípio do direito ao duplo grau de jurisdição.
Acusado dos crimes de formação de quadrilha, corrupção ativa, peculato, lavagem de dinheiro e evasão de divisas, Marcos Valério terá a defesa também orientada no sentido de demonstrar que a instrução processual esvazia a tese da existência de um esquema de compra de votos. Para a defesa, faltam evidências do repasse a partidos e tampouco a políticos para que votassem de acordo com o interesse do governo Lula ainda no primeiro mandato.
A defesa deve ainda tentar elucidar que o vínculo de Marcos Valério com alguns dos réus se dava estritamente em termos de sociedade empresarial. E como pessoa jurídica, citando precedentes do próprio Supremo Tribunal Federal, empresas organizadas regularmente não podem ser tomadas por organizações criminosas quando se verifica relação efetiva de prestação de serviços, aponta o advogado.
Sobre as acusações de que o deputado federal João Paulo Cunha, então presidente da Câmara, teria beneficiado a empresa de Valério em uma licitação para prestação de serviços, a defesa cita dirigentes da Congresso Federal, bem como representantes de agências concorrentes, que atestaram a regularidade do processo e que não houve qualquer influência por parte do parlamentar.
Outro ponto abordado pela defesa é que o dinheiro usado nas ações de publicidade do Banco do Brasil vinham da Visanet (atual Cielo), sendo fruto, portanto, de 1% dos valores pagos com os cartões, o que qualifica a origem privada e não pública dos recursos, desmontando a acusação de peculato.
A exemplo da defesa dos ex-dirigentes do Banco Real, a defesa de Marcos Valério aponta, no que se refere aos empréstimos bancários, que o dinheiro sacado tinha origem conhecida e foi sacado por pessoas identificadas, tanto que foi possível incluí-las como réus do processo.
Os advogados de Marcos Valério ainda afirmam que no que toca à acusação de evasão de divisas, a única coisa que foi provada é que ocorreu o que se qualifica por operação dólar-cabo, um meio de compensação entre doleiros e clientes. Para o Ministério Público, é só uma forma de se permitir a evasão de divisas e a lavagem de dinheiro se servindo de câmbio legal. Para a defesa, contudo, o dinheiro “troca de mão no país”, não incorrendo em saída de recursos e não havendo perda de capital nacional. O empresário Marcos Valério e três dos réus ligados a ele no processo da Ação Penal 470 foram condenados também em primeira instância em ações penais análogas ao processo do mensalão.
Um dos réus, o operador de câmbio Carlos Alberto Quaglia, da empresa Natimar, acusado pelo Ministério Público por formação de quadrilha, vai dispor dos serviços da Defensoria Pública. Por se tratar de matéria criminal, por conta de o réu não ter constituído advogado e em razão de o processo ser julgado pelo Supremo Tribunal Federal, o defensor público-geral da União, Haman Tabosa, é quem fará a defesa de Quaglia durante a sustentação oral na alta corte. Por opção, o defensor público-geral não tem dado maiores informações sobre a estratégia de defesa, justamente para se diferenciar do trabalho de consultoria convencional feita por um advogado contratado. A assessoria da Defensoria Pública-Geral da União informou, contudo, que o defensor geral tem se preparado e estudado o caso.
À frente da defesa de Duda Mendonça, publicitário responsável pela estratégia de marketing da campanha presidencial que elegeu Lula em 2002, estão os criminalistas Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, e Luciano Feldens, que substituíram os advogados Tales Castelo Branco e Frederico Crissiúma. A defesa pretende demonstrar que o publicitário é um personagem alheio ao processo, trazido arbitrariamente ao caso por conta do entendimento equivocado do Ministério Público de que o recebimento de cerca de R$ 10 milhões em uma conta bancária no exterior está ligado ao suposto escândalo.
O pagamento efetuado pelo empresário mineiro Marcos Valério em favor de Duda Mendonça e sua sócia, Zilmar Fernandes Silveira, correspondiam pelos serviços de consultoria em marketing prestados na campanha de 2002, diz a defesa. Para os advogados de Duda Mendonça, o vínculo dos publicitários com o PT constitui formalmente uma “relação legal, formalizada em contrato investido de objeto lícito”.
O processo
Trinta e quatro réus, entre os quais políticos da base governista e prestadores de serviços na área de publicidade e marketing são acusados por crimes de corrupção, que envolvem desvio de recursos públicos e/ou de lavagem de dinheiro, tendo como cerne a compra de apoio de parlamentares a propostas de iniciativa do primeiro mandato do governo Lula. Os demais quatro réus, ex-dirigentes do Banco Rural, são acusados de crimes financeiros como gestão fraudulenta e evasão de divisas, por facilitarem empréstimos para subsidiar o esquema.
Para a Procuradoria-Geral da União, houve a compra de apoio de parlamentares com recursos públicos para que políticos votassem em favor de projetos do interesse do governo. Do lado da defesa, carecem evidências e sobram fragilidades técnicas nas acusações de que houve a articulação de um esquema de corrupção desse porte, além da quitação de dívidas de campanha, via caixa dois, sem a utilização de dinheiro público.

segunda-feira, 30 de julho de 2012

Julgamento do Mensalão terá 1.078 decisões no STF

POR RODRIGO  HAIDAR

Em recente entrevista à revista Consultor Jurídico, ao falar sobre a Ação Penal 470, o chamado processo do mensalão, o diretor da escola de Direito da FGV-Rio, Joaquim Falcão, afirmou que o Supremo Tribunal Federal “nunca encarou um processo com tantos andamentos e com tantos incidentes, alguns até não previstos”. Como registrou o professor, o processo tem “muito de rotina, mas algo de inédito”. Na verdade, tem muito de inédito.
Os números dão conta do ineditismo. O processo é formado por quase 60 mil páginas divididas em 234 volumes e mais de 500 apensos. São 38 réus, denunciados por 98 crimes, defendidos por 33 equipes de advogados ou escritórios. Cada um dos 11 ministros dará seu veredito sobre cada uma das 98 acusações. Para isso os gabinetes mobilizaram, em média, três assessores para estudar o processo. Na prática, serão proferidas em um só julgamento 1.078 decisões.
Nos casos em que houver condenação, ainda será discutida e definida a dosimetria da pena. Ou seja, qual a punição adequada para o crime cometido pelo condenado. O voto do relator da ação, ministro Joaquim Barbosa, tem mais de mil páginas. O do revisor, Ricardo Lewandowski, não deixa por menos: também ultrapassa as mil folhas. A expectativa é que cada um deles leve até quatro sessões para proferir seus votos.
Não há dúvidas de que se trata do mais longo e complexo julgamento já feito pelo Supremo. Até porque a vocação do tribunal é examinar temas e teses jurídicas e não casos concretos. Os 11 ministros que compõem o tribunal nunca foram obrigados a se debruçar sobre um processo tão trabalhoso, complexo e rico em detalhes.
Na lista de acusações, formação de quadrilha ou bando, corrupção ativa, corrupção passiva, peculato, lavagem de dinheiro, evasão de divisas e gestão fraudulenta de instituição financeira. De acordo com a denúncia da Procuradoria-Geral da República, os réus são peças de um esquema de desvio de recursos públicos para compra de apoio político no primeiro mandato do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
O julgamento começa na próxima quinta-feira (2/8). Não se sabe quando termina. Ministros mais otimistas acreditam que até o meio do mês de setembro a decisão esteja tomada. Outros acham que a decisão pode sair depois das eleições municipais de outubro. Há mais dúvidas que certezas.
Quanto tempo os ministros levarão debatendo questões de ordem e incidentes processuais provocados pelos advogados? Os advogados poderão esclarecer questões de fato a qualquer tempo da tribuna? Haverá tempo hábil para o voto do ministro Cezar Peluso? Ele poderá adiantar o voto? O ministro Dias Toffoli, efetivamente, participará do julgamento? Em caso de empate, qual critério será adotado para resolver o impasse? Como será discutida a dosimetria da pena em caso de condenação?
Rito especialO Supremo montou um cronograma especial para julgar o processo. Serão oito dias ininterruptos para a sustentação oral dos advogados em defesa de seus clientes, com prazo de até uma hora para cada réu. Cinco advogados falarão por dia. A defesa atuará depois do procurador-geral, Roberto Gurgel, que tem prazo de até cinco horas para sustentar a denúncia apresentada por seu antecessor, Antônio Fernando de Souza. A preliminar colocada pelo ministro Marco Aurélio, de se destinar algumas manhãs para apreciação de pedidos de Habeas Corpus não foi enfrentada. Outra questão, esta colocada pelo ministro Lewandowski — de que a adoção do roteiro proposto pela PGR favorece a acusação — talvez nem seja discutida, por se entender que esta escolha cabe ao relator.
Antes disso, contudo, os ministros deverão enfrentar alguns obstáculos colocados pelas defesas. O primeiro deles, como já demonstrado em reportagem da ConJur publicada na semana passada (clique aqui para ler), diz respeito ao fato de 35 dos 38 réus não terem prerrogativa de foro por função. Ou seja, não deveriam estar sob julgamento no Supremo. A tese é apresentada pelos advogados Márcio Thomaz Bastos e Marcelo Leonardo, que defendem, respectivamente, o ex-executivo do Banco Rural José Roberto Salgado e o publicitário Marcos Valério.
Em resumo, os advogados sustentam que apenas três réus têm prerrogativa de foro por função — os deputados federais João Paulo Cunha (PT-SP), Pedro Henry (PP-MT) e Valdemar Costa Neto (PR-SP). E que a decisão de manter no STF o processo contra os outros 35 réus fere ao menos dois princípios fundamentais: o do juiz natural e o direito ao duplo grau de jurisdição — ou seja, de recorrer de uma possível decisão condenatória. Contra as decisões do STF, como se sabe, não há recurso senão ao próprio tribunal.
Outra questão que pode levantar discussões candentes é a recente decisão do Tribunal de Contas da União que julgou regular o contrato de publicidade entre o Banco do Brasil e a empresa DNA Propaganda, de Valério. A decisão foi juntada aos autos a pedido do advogado Marcelo Leonardo depois do fim da instrução penal (leia aqui). O contrato é apontado pela acusação como um dos dutos pelos quais escoava o dinheiro público supostamente desviado para a compra de apoio político.
As decisões do TCU, por óbvio, não vinculam as decisões do Supremo. Mas os ministros costumam dar peso a julgamentos de órgãos técnicos, como TCU, Banco Central e Receita Federal, por exemplo, para encaminhar seus votos.
A depender do encaminhamento do julgamento, o presidente do Supremo, ministro Ayres Britto, poderá ser lembrado que, em 2001, como advogado, afirmou em uma palestra que “o Judiciário tem a força da revisibilidade das decisões do Tribunal de Contas, porém num plano meramente formal, para saber se o devido processo legal foi observado, se direitos e garantias individuais foram ou não respeitados”. Britto também disse na ocasião que “o mérito da decisão, o controle, que é próprio do Tribunal de Contas, orçamentário, contábil, financeiro, operacional e patrimonial, é insindicável pelo Poder Judiciário”.
Depois das sustentações orais de acusação e defesa, os ministros começarão a votar — ou seja, a efetivamente decidir o destino dos 38 réus. A partir daí, serão feitas sessões às segundas, quartas e quintas-feiras, com cinco horas de duração, em média. O ministro Joaquim Babosa vota a partir o dia 15 de agosto, segunda-feira. A previsão oficial é que termine de votar no dia 22, já que a estimativa é que leve quatro sessões.
Por este cronograma, o ministro Ricardo Lewandowski começa a votar no dia 23, quinta-feira, e deve concluir sua decisão no dia 30 de agosto. Aí, já não haveria mais tempo para o ministro Cezar Peluso votar. Isso porque ele completa 70 anos e é obrigado a se aposentar no dia 3 de setembro, justamente quando seguem os trabalhos depois dos votos do relator e do revisor.
O cálculo ainda não leva em conta um fato comum em processos penais: as questões de fato. Em processos subjetivos como as ações penais, é normal que advogados peçam para usar a tribuna para esclarecer fatos apresentados pelos juízes dos quais discordam. Neste caso, serão nada menos do que 33 advogados, sem contar seus assistentes, atentos à leitura dos votos e sedentos por brechas que ajudem seus clientes a escapar da condenação.
Ordem de votaçãoDe olho nesse script é que já se cogitou a possibilidade de o ministro Cezar Peluso votar antes mesmo do revisor da ação, Ricardo Lewandowski. Há ministros que admitem discutir a hipótese por conta da excepcionalidade que se coloca. Peluso não pedirá para adiantar o voto porque quer sair de férias ou tirar licença. Mas porque é obrigado a se aposentar ao completar 70 anos de idade.
A aposentadoria não provocaria qualquer mudança no rito de votação não se tratasse do processo do mensalão. Mas, neste caso, diante de tantas excepcionalidades já admitidas — como o fato de a Corte Constitucional do país praticamente parar por ao menos dois meses para decidir um só processo — a hipótese de quebrar a ordem é discutida.
Outros ministros, contudo, não admitem isso. Afirmam, inclusive, que a quebra daria margem para que os acusados possam levantar a nulidade da decisão do Supremo. E apontam o artigo 135 do Regimento Interno do tribunal para fundamentar seu receio. De acordo com a regra, “concluído o debate oral, o presidente tomará os votos do relator, do revisor, se houver, e dos outros ministros, na ordem inversa de antiguidade”. O parágrafo 1º da norma dispõe que “os ministros poderão antecipar o voto se o presidente autorizar”.
Ou seja, os ministros podem antecipar seu voto, mas depois do relator e do revisor votarem. Caso contrário, não haveria sequer a necessidade de revisão obrigatória no caso de ações penais. Seria como se o mensalão não tivesse revisor. Esse é o ponto de vista dos que não admitem que Peluso possa antecipar seu voto ao do ministro Lewandowski. De qualquer forma, é mais uma questão que pode inflamar as discussões em plenário.
O simples fato de se cogitar que Peluso adiante o voto já provoca divergências. Ainda que consiga votar depois de Lewandowski, o ministro não estaria em plenário ao final do julgamento para dirimir qualquer questão. Nem poderia ajustar seu voto a depender de novas considerações trazidas pelos colegas. Qualquer que seja a decisão, se Peluso votar antes da ordem habitual, o fato provocará protestos e eventuais incidentes processuais.
Caso Peluso não vote, existe a possibilidade de ocorrer empate, ainda que remota, em alguns casos. Aí se abre um novo leque de hipóteses possíveis para o desempate. No Direito Penal, em regra, o réu se beneficia do empate por conta do princípio in dubio pro reu. Ou seja, para condenar, é necessário ter a certeza do crime. Na dúvida, se absolve. Há quem advogue que o princípio vale para pedidos de Habeas Corpus, mas não se aplicaria no caso — clique aqui para ler reportagem da ConJur sobre a discussão. Existe pelo menos um precedente em que o Plenário adotou o entendimento favorável ao réu, em empate, a um Recurso Extraordinário.
Há, ainda, outro cenário possível no caso de o ministro Dias Toffoli se declarar suspeito para julgar o processo. Toffoli trabalhou com José Dirceu, um dos principais réus do processo, na Casa Civil, durante o primeiro mandato do governo Lula, e já advogou para o PT. Sua companheira, a advogada Roberta Rangel, já advogou para os ex-deputados petistas Paulo Rocha e Professor Luizinho. Alguns colegas de Toffoli acreditam que ele deveria se declarar suspeito. Outros entendem que, levados ao pé da letra os fundamentos do impedimento, verificar-se-ia suspeição sobre quase todos os ministros da Casa. Neste cenário, mesmo sem os votos dos ministros Peluso e Toffoli, não haveria risco de empate, já que o Supremo julgaria o caso com os votos de nove ministros.
Crime e castigoAs discussões mais inflamadas prometem ficar por conta da fixação da pena dos eventuais condenados. Neste ponto do processo, os ministros acostumados com a discussão de princípios constitucionais, se fixarão no artigo 59 do Código Penal.
A norma determina que para a fixação da pena o juiz deve levar em consideração “a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social, a personalidade do agente, os motivos, as circunstâncias e consequências do crime, bem como o comportamento da vítima”. O grau de subjetivismo que a regra permite provocará problemas no plenário do Supremo.
Há ministros, por exemplo, que entendem que o fato de o réu responder a outros processos pode ser considerado como antecedente para agravar a pena. Outros não admitem processos em curso. Para estes, antecedente penal ou mesmo civil só com sentença ou condenação transitada em julgado. Ou seja, decisão definitiva.
Alguns ministros mostram-se receosos com a possibilidade de colegas aumentarem as agravantes de crimes para que as penas não caiam na prescrição. Se houver condenação pela pena mínima, muitos casos estão prescritos desde agosto de 2011.
A denúncia do mensalão foi apresentada ao Supremo em abril de 2006. Em agosto de 2007, a denúncia foi recebida pelo plenário do tribunal. O relator, ministro Joaquim Barbosa, trabalhou na instrução da ação penal por quatro anos e meio, até o final do ano passado. No último dia, liberou a ação para o revisor. Lewandowski fez a revisão em tempo recorde, sob pressão até dos próprios colegas.
A partir do dia 2 de agosto, começa o julgamento-espetáculo mais esperado dos últimos tempos, seis anos depois de a denúncia ter chegado ao STF. Sabe-se quando e como começa. Não se tem ideia de quando e como termina. Nem mesmo qual será o Supremo Tribunal Federal que emergirá com a decisão final.

sexta-feira, 27 de julho de 2012

Veja o que os candidatos podem e não podem fazer

A regulamentação do que é permitido ou proibido nas campanhas eleitorais é feita pela Resolução 23.370/2011 do Tribunal Superior Eleitoral. A norma permite, por exemplo, a propaganda política por meio da internet, desde que o candidato tenha o site registrado na Justiça Eleitoral. No caso do Twitter, ele só pode enviar mensagens para os seus seguidores, ou seja, àquelas pessoas que, por iniciativa própria, optaram por acompanhar as mensagens do candidato.
De acordo com a legislação eleitoral, os candidatos, partidos ou coligações podem enviar mensagens eletrônicas no celular. Contudo, caso o eleitor comunique à operadora que não deseja receber essas mensagens, os candidatos têm até 48 horas para suspender o serviço. Se isso não for feito, poderá ser aplicada multa de R$ 100 por mensagem enviada indevidamente.
A legislação prevê ainda que a veiculação de propaganda eleitoral em bens particulares deve ser espontânea e gratuita, sendo vedado qualquer tipo de pagamento em troca de espaço para essa finalidade.
Comum em eleições passadas, atualmente é proibida na campanha eleitoral a confecção, uso, distribuição por comitê, candidato, ou com a sua autorização, de camisetas, chaveiros, bonés, canetas, brindes, cestas básicas ou quaisquer outros bens ou materiais que possam proporcionar vantagem ao eleitor, respondendo o infrator, conforme o caso, pela prática de captação ilícita de voto e, se for o caso, pelo abuso de poder.
Também não é permitida propaganda em postes de iluminação pública e sinalização de tráfego, viadutos, passarelas, pontes, paradas de ônibus e outros equipamentos urbanos. O candidato flagrado descumprindo esta norma terá 48 horas para remover a propaganda e pode receber multa que varia de R$ 2 mil a R$ 8 mil.
Durante todo o período eleitoral é vedada a promoção de "showmício". A legislação permite ao candidato usar carros de som e trios elétricos, desde que não haja shows com a participação de artistas. É proibido o uso de símbolos semelhantes aos governamentais e divulgar mentiras sobre candidatos ou partidos para influenciar o eleitor, bem como ofender outra pessoa durante a propaganda eleitoral, exceto se for após provocação ou em resposta à ofensa imediatamente anterior.
Agressão física, alterar ou danificar propaganda de outros candidatos, oferecer prêmios ou organizar sorteios e a divulgação de propaganda eleitoral em outdoors também é proibido. A legislação permite o uso de cavaletes e bonecos para divulgação, a chamada propaganda móvel. Nesse caso, o candidato deverá respeitar o horário das 6h às 22h para a propaganda.
Nos três meses que antecedem as eleições, a legislação eleitoral veda o repasse de dinheiro da União para os estados e municípios, ou dinheiro dos estados para os municípios, exceto se for para cumprir compromissos financeiros já agendados ou situações emergenciais.
Também é proibida a contratação de shows em inaugurações de obras com verba pública e a participação de candidatos em inaugurações de obras públicas, no caso daqueles que disputam cargo no poder Executivo.
Papel do cidadão O cidadão deve desempenhar papel decisivo na fiscalização das eleições, afirma o secretário-geral do Tribunal Superior Eleitoral, o juiz Carlos Henrique Braga. Segundo ele, apesar de a Justiça Eleitoral estar presente em todo o território nacional, ela não consegue estar ao mesmo tempo nos 5.568 municípios onde serão escolhidos prefeitos, vice-prefeitos e vereadores no próximo dia 7 de outubro.
De acordo com Braga, desde o início do processo, o eleitor deve acompanhar os passos dos candidatos e colaborar para a lisura do pleito. “O grande desafio da Justiça Eleitoral é garantir o processo de escolha completamente isento, sem qualquer mácula”, disse. “Então, temos ressaltado a importância do eleitor. Portanto, após deflagrado o processo eleitoral, o eleitor tem como utilizar de mecanismos que possibilitem a fiscalização”, completou Braga.
“Se o eleitor vir um cartaz colado em uma árvore, por exemplo, ele já pode acionar a Justiça Eleitoral. Em todos os sites da Justiça Eleitoral estamos ressaltando isso, em todos os estados temos os tribunais regionais, em todos os tribunais nos estados temos as ouvidorias e os links para as reclamações”, disse o secretário-geral do TSE.
Nas eleições municipais, o juiz eleitoral de cada cidade tem papel fundamental na fiscalização do processo. Ele é responsável por receber as denúncias e aplicar as penalidades. A comunicação ou denúncia à Justiça Eleitoral também pode ser feita por e-mail e diretamente ao promotor de Justiça Eleitoral. Além dos canais disponíveis no âmbito da Justiça eleitoral, o cidadão também pode fazer denúncias às Polícias Civil e Militar.
Os tribunais regionais eleitorais também atuam na fiscalização, assim como o órgão máximo da Justiça Eleitoral, o TSE. O secretário-geral, porém, recomenda aos eleitores que, primeiramente, façam suas eventuais denúncias ao juiz eleitoral ou ao promotor da Justiça Eleitoral para que a respostas ocorram de forma mais célere.

quinta-feira, 26 de julho de 2012

Psiquiatria forense ainda é subaproveitada no país

Por Hewdy Lobo Ribeiro e Ana Carolina Schmidt

A psiquiatria forense é, de forma ampla e genérica, a psiquiatria a serviço da Justiça. Essa subespecialidade da psiquiatria é aplicada a indivíduos supostamente portadores de transtorno mental que violam a lei; e a indivíduos que necessitam de sua proteção, podendo ter um caráter tanto pericial quanto terapêutico.1
Segundo Abdalla-Filho & Engelhardt1, no Brasil, a prática revela que a recusa de um laudo psiquiátrico por uma autoridade judicial representa uma pequena minoria dos casos, o que reforça a necessidade de uma comunicação de melhor qualidade entre os profissionais de Saúde Mental e os profissionais do campo da Justiça.
Assim, é importante que o perito médico faça as conversões de linguagem médica para que os operadores do Direito possam exercer suas funções legais.2
Abaixo alguns temas em saúde mental relacionados à prática da psiquiatria forense.
InfanticídioO infanticídio é entendido na legislação atual como um crime praticado pela mulher em função de um estado especial. Ao adotar o critério biopsicológico, ou seja, de que, além de haver uma “doença mental”, deverá estar presente também a perda da capacidade cognitiva e/ou volitiva, o Código Penal de 1940 aponta a comprovação médica deste estado.3, 4, 5
Portanto, o papel da perícia forense tem importante lugar em sua caracterização. Através de avaliação da mulher e de suas condições psíquicas no momento da ação, ou omissão, chega-se à conclusão do infanticídio. Para implicar infanticídio, é impreterível que a mulher ao cometer homicídio de sua prole durante o puerpério apresente o estado puerperal. Este estado compreende as alterações da mulher no puerpério, período pós-parto, as quais podem implicar em condições psíquicas que prejudiquem sua capacidade de entender o caráter ilícito dos seus atos.5
Transtornos Mentais do Pós-PartoA disforia pós-parto se caracteriza por alterações leves do humor depressivo, geralmente autolimitadas e com remissão completa, geralmente não apresentando gravidade. Ocorre nos primeiros 7 a 10 dias do pós-parto, durando algumas horas ou dias. Observa-se uma exacerbação dos sintomas entre o quarto e quinto dias do pós-parto.5, 6
A depressão pós-parto é definida assim como a depressão classicamente reconhecida em qualquer época da vida, exceto pelo período que deve ser, de quatro semanas após o parto.7 Ocorre em aproximadamente 10% a 20% das mulheres. Raramente a depressão pós-parto acarretará em suicídio ou até infanticídio. 8
Na psicose pós-parto, os quadros são graves, de ocorrência rara, não existindo uma apresentação típica, podendo cursar com agitação psicomotora, alucinações, ideias delirantes que envolvem a criança. Pode ainda haver delírios que constituem certezas distorcidas e desorganização do comportamento. Nesta população, a taxa de infanticídio nos quadros não tratados está em torno de 4%.9
De acordo com a psiquiatria, a mulher no pós-parto pode ter qualquer destas alterações, cabendo ao perito detectar o prejuízo no entendimento de seus atos, mesmo que transitoriamente. A grande dificuldade está no fato de, na maioria das vezes, a pericianda vai para o exame mental passado algum tempo do fato ocorrido. E, não raro, a avaliação psíquica neste momento não estará alterada. O médico deve esmiuçar os sintomas daquele momento colocando-os numa perspectiva temporal, além de munir-se de avaliações médicas do momento da ocorrência dos fatos como registros de prontuários, leitura atenta dos autos e grande saber técnico. 5
Lei 11.340/2006, Lei Maria da PenhaNa psiquiatria forense, o alvo da avaliação deve ser a violência psicológica dirigida contra a mulher. Diferentemente da violência física, esta é mais difícil de caracterizar-se, já que os sinais deixados figuram na subjetividade.
Uma mulher pode passar toda uma vida sendo diminuída, manipulada por mentiras e desrespeitada por seu marido e sofrer calada, uma vez que não tem a garantia de ser entendida pela sociedade.
É presente a recorrência desses atos, minando as defesas da vítima, resultando em graves repercussões psíquicas10, 11.
Por se tratar de uma conduta subreptícia, a vítima nem sempre percebe essa forma de violência, tendo então dificuldade para se proteger.5
StalkingOutra forma de violência psicológica é o stalking, que se refere à ideia de perseguição persistente e implacável de sua vítima. Em geral o sexo feminino é o mais acometido. Refere-se geralmente à intrusão persistente na vida de uma pessoa, contatos indesejados, ameaças e invasão de sua privacidade. A grande dificuldade de caracterizar esta conduta é que nem sempre o perseguidor comete algum ato ilegal. Todo esse conjunto de ações pode culminar em ameaças de morte, sequestro e até homicídio. Nesse particular, a Lei Maria da Penha sinaliza para a possibilidade de caracterizar o stalking, ao incluir entre as formas de violência a modalidade psicológica.11, 12
Dependência químicaPara a psiquiatria forense a verificação médica da presença da dependência de drogas baseia-se em critérios descritos em manuais de diagnósticos. São critérios clínicos, que definem a dependência: pelo menos um ano de uso, tolerância a substância, abstinência ao interromper o uso com alívio ao consumi-la novamente, passa-se um grande tempo ao utilizá-la ou obtê-la, tentativas fracassadas em deixar o uso, há um comprometimento global no funcionamento do indivíduo, e mesmo ciente destes prejuízos não conseguir abandonar o uso.13, 14
O dependente de drogas geralmente tem um comprometimento da vida em diversos níveis do funcionamento pessoal e o perito poderá utilizar avaliações neuropsicológicas e exames de neuroimagem como instrumentos que complementam na elaboração do diagnóstico. 15, 16, 17
A legislação penal brasileira é clara ao afirmar que o agente deverá ao tempo da ação ou da omissão ter tido comprometidos o seu entendimento e sua autodeterminação para ser considerado inimputável. Assim, mesmo que exista a comprovação da dependência de drogas esta não é por si só excludente de imputabilidade. Para que o sujeito seja culpado é preciso que as funções psíquicas cognitivas e volitivas não estejam comprometidas no momento da ação ou omissão em avaliação. Ainda, deverá existir o nexo causal com o ato delitivo em questão.
Caso haja comprometimento da capacidade de entendimento ou de determinação no momento do ato em julgamento, e que haja claro nexo com a infração penal e a aceitação pelo Juízo, caberá a medida de segurança. De acordo com a penalidade a medida pode ser de internação em hospital de custódia ou tratamento ambulatorial. 15, 18, 19
A Lei 11.343, de 23 de agosto de 2006, mais conhecida como a Nova Lei Antidrogas coaduna-se ao Código Penal que traz em seu artigo 26: “É isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.”
A intoxicação patológica, a intoxicação aguda com delirium e a abstinência com distorções da percepção se enquadram neste artigo.20,21, 24, 25
No caso específico da dependência de drogas o entendimento seria distorcido por psicose induzida por drogas, por exemplo. Já no caso da autodeterminação o prejuízo seria uma incapacidade de autocontrole em razão de abstinência, fissura ou grave impulsividade. 26
Retardo mentalO retardo mental é um quadro neuropsiquiátrico de causa multifatorial que leva a redução das habilidades cognitivas, sociais e laborais em diferentes graus com repercussões nos direitos e deveres estabelecidos pelas leis.27
O psiquiatra forense deve ter a expertise para realizar o diagnóstico de retardo mental, classificá-lo em graus e esclarecer para o portador da deficiência, para os familiares e para Justiça o quanto este déficit repercute nos direitos e deveres deste avaliando e dos seus responsáveis de acordo com as legislações vigentes no Brasil.27
Considera-se que é maior a probabilidade do portador de retardo cometer um crime quanto menos grave for o retardo.29 Quanto mais próxima da normalidade estiver a inteligência do infrator, melhores serão os recursos que ele terá para planejar e executar com eficiência a ação delituosa.
Do ponto de vista criminal, as características importantes são representadas pelos indivíduos retardados chamados de eréticos, denominação usada para aqueles que apresentam hiperatividade, instabilidade afetiva e agressividade, além de irritabilidade e de uma baixa tolerância à frustração. Os indivíduos retardados portadores de tais características apresentam um potencial criminógeno maior do que aqueles que se mostram mais passivos, submissos e dóceis.
A submissão das pessoas portadoras de retardo a uma condição social desfavorável também agrava o risco de envolvimento em infrações penais, uma vez que elas apresentam maior dificuldade de empregar-se e de garantir o próprio sustento, tornando-se, portanto, vulneráveis, tendo que se sujeitar àquilo que lhes for oferecido, o que lhes coloca sob o risco de serem usados em atos ilegais.
Em relação à imputabilidade, os indivíduos com retardo mental profundo, grave ou moderado são inteiramente incapazes de entendimento e determinação, o que os coloca na condição de inimputáveis. As pessoas com retardo mental leve têm sua capacidade de entendimento e determinação comprometida, mas não anulada, o que as pode tornar semi-imputáveis. Já os indivíduos cognitivamente situados no limite chamado borderline, e que não são considerados como retardados, respondem pelas infrações penais com imputabilidade plena.30
ConclusõesA psiquiatria forense é uma área do conhecimento em saúde com estudo em interface com as ciências jurídicas que auxiliam as tomadas de decisões da Justiça em relação aos indivíduos portadores de transtornos mentais que cometem delitos.
No Brasil a atuação do psiquiatra forense ainda é subaproveitada e ter a possibilidade de fazer esta publicação é motivo de eterna gratidão por esta oportunidade excepcional de esclarecimento para os operadores do Direito.
Referências
1. ABDALLA-FILHO, Elias; ENGELHARDT, Wolfram. A prática da psiquiatria forense na Inglaterra e no Brasil: uma breve comparação. Rev. Bras. Psiquiatr., São Paulo, v. 25, n. 4, Oct. 2003.
2. Palomba GA. Tratado de psiquiatria forense civil e penal. São Paulo, Atheneu, 2003.
3. Pinheiro B. Teoria geral do delito. Rio de Janeiro, Elsevier, 2009.
4. Rudá, AS. Limites temporais do estado puerperal nos crimes de infanticídio. Jus Navigandi [internet], Teresina, ano 15, n.2635, [atualizada em 18 Set 2010]. Disponível na Internet: http://jus.uol.com.br/revista/texto/17433(28 Jan 2011).
5. Ribeiro HL; Terrell A; Cabral ACJ.Particularidades na Avaliação Psiquiátrica-Forense da Mulher. Tratado de Saúde Mental da Mulher. Editora Atheneu. No Prelo.
6. Vasconcelos AJA, Melzer DL. Disforia do Pós-Parto. In: Vasconcelos AJA, Teng CT. Psiquiatria perinatal. São Paulo, Atheneu, 2010. p.71-88.
7. American Psychiatric Association. Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais DSM-4-TR, 4. ed. Porto Alegre, Artmed, 2000.
8. Ribeiz SRI, Chang TMM, Teng CT. Depressão Pós-Parto. In: Vasconcelos AJA, Teng CT. Psiquiatria perinatal. São Paulo, Atheneu, 2010. p. 89-105.
9. Júnior JR, Ribeiro CS, Ribeiro HL. Psicose puerperal. In: Vasconcelos AJA, Teng CT. Psiquiatria perinatal. São Paulo, Atheneu, 2010. p 107-17.
10. Baruki LVRP, Bertolin PTM. Violência contra a mulher: a face mais perversa do patriarcado – quem tem medo do lobo mau? In: Bertolin PTM, Andreucci ACPT. Mulher, sociedade e direitos humanos. São Paulo, Rideel, 2010. p 297- 324.
11. Trindade J. Manual de Psicologia Jurídica para operadores do direito, 5.ed. rev. atual. e ampl. Porto Alegre, Livraria do Advogado, 2011.
12. Hirigoyen, MF. Assédio Moral: a violência perversa no cotidiano, 12 ed. Rio de Janeiro, Bertrand Brasil, 2010.
13. Classificação de Transtornos Mentais e de Comportamento da CID-10: Descrições Clínicas e Diretrizes Diagnósticas – Coor. Organiz. Mund. Da Saúde; trad. Dorgival Caetano. – 10. ed. Porto Alegre: Artes Médicas, 1993.
14. American Psychiatric Association. Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais. 4. ed. Porto Alegre: Artmed; 2000.
15. Simon RI. Leis e Psiquiatria. In: Hales RE, Yudofsky SC. Tratado de Psiquiatria Clínica. 4 ed. Porto Alegre: Artmed, 2006. p. 1475- 1515.
16. Cohen C, Ferraz FC, Segre M. Saúde Mental, crime e justiça. 2. Ed. São Paulo: Edusp; 2006.
17. Kaplan HI, Sadock BJ, Grebb JA. Psiquiatria Forense. In: Kaplan HI, Sadock BJ, Grebb JA. Compêndio de Psiquiatria: Ciências do Comportamento e Psiquiatria Clínica. Trad. Dayse Batista. – 7.ed. – Porto Alegre: Artmed; 1997. p.1088-1104.
18. Baltieri DA, Rigonatti SP. Aspectos básicos da Psiquiatria forense. In: Alvarenga PG, Andrade AG. Fundamentos em Psiquiatria. Baueri: Manole; 2008. p.521-45.
19. Palomba GA. Tratado de Psiquiatria Forense Civil e Penal. Palomba GA. São Paulo: Atheneu; 2003.
20. Pinheiro B. Arrependimento Posterior ou Arrependimento Post Factum Benéfico. In: Pinheiro B. Teoria Geral do Delito. Rio de Janeiro: Elsevier; 2009. p. 159-166.
21. Greco Filho V. Tóxicos: prevenção – repressão. Comentários à Lei n. 11.343/2006 – Lei de Drogas. – 13. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2009.
22. Chalub M, Telles LEB. Álcool, drogas e crime. Rev Bras Psiquiatr. 2006; Oct;28 (II supl):S69-73.
23. Valença AM, Chalub M, Mendlowicz MV, Mecler K, Nardi AE. Responsabilidade penal nos transtornos mentais. J Bras Psiquiatr 54(4): 328-333, 2005.
24. Moraes T, Fridman S. Medicina forense, psiquiatria forense e lei. In: Taborda JGV, Chalub M, Abdalla Filho E. Psiquiatria Forense. Porto Alegre: Artmed, 2004. p.21-29.
25. Abdalla-Filho E; Ribeiro HL. Retardo Mental. In: In: Taborda JGV, Chalub M, Abdalla Filho E. Psiquiatria Forense. Porto Alegre: Artmed, 2011. p.450-468.
26. Hall I. (2000). Young offenders with a learning disability. Advances in Psychiatric Treatment 6:278-286.
27. Vargas HS. (1990). Modificadores psicopatológicos da responsabilidade penal e da capacidade civil. In: HS Vargas. Manual de Psiquiatria Forense. Rio de Janeiro: Biblioteca Jurídica Freitas Bastos. p 195-393.

quarta-feira, 25 de julho de 2012

Procurador bate boca com advogado em audiência do caso Cachoeira

'Fica o senhor quieto e eu falo', disse o advogado de um dos investigados.
'Quem tem que se colocar no seu lugar é vossa excelência ', foi a resposta.

Mariana Oliveira, Iara Lemos e Versanna CarvalhoDo G1, em Goiânia

O procurador da República Daniel Resende e o advogado Douglas Dalto Messora, que defende um dos réus do processo referente à Operação Monte Carlo, bateram boca na manhã desta quarta-feira (25) durante audiência na Justiça Federal em Goiãnia.
Durante o depoimento do agente da Polícia Federal Renato Moreira, Messora - que defende Gleyb Ferreira, acusado de fazer parte do grupo de Cachoeira - mencionou que o policial disse que fazia "dedução" em relação aos dados contábeis dos acusados. O procurador, então, argumentou que o agente deixou claro que fazia dedução com base no relatório de contabilidade.
"O senhor fala e eu fico quieto. Fica o senhor quieto e eu falo", disse o advogado, que completou, se dirigindo à testemunha: "O senhor tem um bom defensor".
O procurador rebateu: "Não, eu sou o fiscal da lei." O advogado disse: "O senhor é fiscal da lei e eu sou defensor." Em tom de voz alto, o procurador disse: "O senhor colocou palavras na boca da testemunha. Quem tem que se colocar no seu lugar é vossa excelência."
O juiz do caso, Alderico Rocha, interviu e pediu que o advogado continuasse com as perguntas. O advogado disse: "Vou tirar a palavra dedução porque o ilustre procurador fica chateado."
Este é o segundo dia de audiências para ouvir testemunhas de acusação e defesa do processo referente à Operação Monte Carlo, na qual o bicheiro Carlinhos Cachoeira foi preso no fim de fevereiro. O contraventor e mais sete são réus na ação penal.
 
Gravata rosa
O bicheiro Carlinhos Cachoeira chegou pouco antes das 9h desta quarta à sala de audiências. Ele chegou vestido com um terno cinza claro, camisa branca e gravata rosa. Acompanhado de agentes armados da Polícia Federal, ele cumprimentou com sorriso a mulher, Andressa Mendonça, e familiares que acompanham a audiência.
O bicheiro, que passou a noite na sede da PF em Goiânia, foi conduzido à Justiça Federal por volta das 8h em um comboio de carros da PF. Ele estava deitado no banco de trás de uma das viaturas.
Andressa Mendonça, mulher de Cachoeira, chegou por volta das 8h40 e falou brevemente com os jornalistas. "Estou tranquila, pois confio em Deus", disse. Antes de entrar no auditório onde os depoimentos serão realizados, Andressa foi revistada pela Polícia Federal.
Na sala da audiência, Andressa cumprimentou com um abraço Idalberto Matias, o Dadá, que também é réu no processo junto com o marido dela, mas está em liberdade. Depois, ela conversou com o advogado Leonardo Gagno, que defende Dadá e outros dois réus, os irmãos Raimundo e José Olímpio Queiroga. Ela cumprimentou ainda Wladimir Garcez, outro réu da ação.
Depoimentos
O juiz Alderico Rocha, 11ª Vara da Justiça Federal de Goiânia, retomou a audiência para o depoimento de testemunhas do processo. Está previsto ainda o interrogatório de sete réus, mas ainda não está certo que os depoimentos vão acontecer nesta quarta.
Das testemunhas de acusação indicadas pelo Ministério Público Federal – duas foram ouvidas na terça (24) e são ouvidos nesta quarta os depoimentos de outras duas. Além disso, ainda precisarão ser ouvidas quatro testemunhas indicadas pelos réus. Inicialmente dez pessoas foram convocadas, mas os advogados de defesa dispensaram seis.
A previsão é a de que Lenine Araújo de Souza, apontado como braço-direito de Cachoeira, seja o primeiro dos réus a prestar depoimento. Lenine chegou a ser preso na Operação Monte Carlo, mas já está em liberdade.
Além de Cachoeira e Lenine, os outros réus do processo são Gleyb Ferreira da Cruz, apontado na denúncia como auxiliar do contraventor; Idalberto Matias de Araújo, o Dadá, suspeito de ter feito grampos ilegais a mando de Cachoeira; Wladimir Garcez, apontado como elo entre Cachoeira e o governo de Goiás; José Olímpio de Queiroga Neto, suspeito de atuar na abertura e fechamento de pontos de jogo ilegal; e Raimundo Washington de Sousa Queiroga, irmão de José Olímpio.
O oitavo réu do processo, Geovani Pereira da Silva, acusado de ser o contador da quadrilha, está foragido desde a Operação Monte Carlo e não será ouvido pela Justiça. Os sete réus que falarão foram presos na Operação Monte Carlo, mas somente dois permanecem detidos, Cachoeira e Gleyb.

Defesa não precisa rebater todas acusações no júri

Por João Ozorio de Melo

Muitas vezes a acusação consegue antecipar que a defesa terá argumentos muito fortes para apresentar aos jurados na sustentação final. Se o trabalho da defesa for bem feito, o efeito será devastador para a acusação. O júri vai certamente inocentar o réu. Como impedir o sucesso da defesa? Existem técnicas: uma é bombardear os jurados com alegações contra o réu, para que a defesa passe a maior parte de seu tempo respondendo diligentemente a cada uma delas, em vez de se ater a seu próprio plano.
Não irá sobrar muito tempo à defesa para apresentar aos jurados seus pontos fortes, se a acusação apresentar, por exemplo, cerca de 20 alegações contra o réu, que, teoricamente, têm de ser refutadas. Assim, a acusação consegue equilibrar a situação, deixando aos jurados apenas a faculdade de decidir quais argumentos foram melhor apresentados, o que mais impressionou suas mentes.
As alegações contra o réu ou as respostas a cada uma delas? Melhor isso do que deixar a defesa aproveitar todo o seu tempo para apresentar seus argumentos claramente superiores, que irão devastar todo o trabalho da acusação. Colocar a defesa para se defender das alegações, em vez de atacar com suas próprias, é uma armadilha e tanto. Digna dos melhores jogadores de xadrez, diante de um quadro adverso no tabuleiro.
Cabe à defesa não cair nessa armadilha, diz o advogado e professor de Direito, Elliott Wilcox, editor do site TrialTheather. A melhor técnica, para ele, é responder apenas a quatro ou cinco argumentos da acusação, informando aos jurados que tais pontos merecem contestação. E aproveitar o resto do tempo, agora bem maior, para despejar a carga completa de bons argumentos a favor de seu cliente. E definir o caso a seu favor.
Melhor dito, do que feito, avalia o professor. Nem sempre os advogados de defesa conseguem superar uma urgência que sentem de responder a todas as alegações da acusação, uma a uma. Muitas vezes os advogados têm a percepção de que, se todas as alegações da acusação não forem respondidas, os jurados poderão contabilizar os pontos não respondidos a favor da acusação e, quem sabe, decidir contra seu cliente. E isso poderia sugerir que o cliente foi condenado por má representação do advogado.
A maioria dos advogados criminalistas pensam assim, mas não deviam, diz o professor. Isso é um defeito que adquirem na Faculdade de Direito, quando são ensinados a contra-atacar todo e qualquer ataque. No dia a dia do tribunal do júri, porém, isso é uma prática perigosa, argumenta. "Na verdade, a defesa corre o risco de dar credibilidade a argumentos impotentes da acusação, validando a existência deles ao se empenhar para respondê-los", afirma o professor.
Na realidade, o que finalmente importa é o que mais impressiona os jurados. O que fica na mente deles, quando se encaminham para a deliberação. Os detalhes desaparecem ou tendem a ser abandonados, quando alguns pontos realmente relevantes se sobrepõem. Além disso, se a defesa se dá ao trabalho de responder a todas as alegações da acusação, quando chegar o momento de apresentar os seus pontos realmente fortes, os jurados já estão cansados e já perderam o interesse na sustentação.
Pode ser que os jurados, diante de tantos argumentos apresentados pela acusação, sequer se deram conta de que alguns pontos importantes não foram tocados. A acusação, na confusão de tantas alegações, pode ter sabiamente deixado de lado uma ou duas provas realmente relevantes, um testemunho definitivo do caso. O trabalho de apresentá-los é da defesa, que deve se concentrar em seus pontos fortes e minimizar — ou mesmo desconsiderar — o resto.
Mas a escolha dos pontos fortes a serem rebatidos não é obra de qualquer inspiração que possa cair dos céus, no momento certo. É apenas a continuação de um bom trabalho que, nessa hora, consiste em identificar o que realmente interessa aos jurados. E quais são os pontos mais importantes da acusação que devem ser rebatidos pela defesa?
Via de regra, a força de cada argumento é determinada por três fatores. Ele explica: persuasão lógica, persuasão jurídica e persuasão emocional. Ao ouvir qualquer argumento, entre tantos, que carregue uma carga emocional, jurídica ou lógica, uma campainha de alerta deve tocar na cabeça do advogado. Está aí, provavelmente, um argumento digno de resposta. E entre eles, o mais perigoso é o que carrega uma carga emocional — ainda mais se vem acompanhado de um dos outros fatores (lógico ou jurídico). Um fator lógico, sem carga emocional, é um candidato a descarte.
Cabe ao advogado "julgar" os argumentos, à medida que são apresentados. O cenário mais comum, durante a sustentação final da acusação, é ver a defesa tomando nota diligentemente de todos os argumentos da acusação para, em sua vez, respondê-los um a um. Mais conveniente seria empregar pouco tempo nas anotações e muito tempo na observação das reações dos jurados, durante a sustentação oral da acusação. Os jurados se manifestam por meio da linguagem corporal e por tantas outas reações. Essa será, talvez, a melhor indicação para o advogado do que é relevante ou não no trabalho da acusação.

terça-feira, 24 de julho de 2012

JUIZA AUTORIZA CANDIDATURA DE CONDENADO PELO TCE/RN

Apesar de a Lei da Ficha Limpa prevê enquadramento de políticos que tiverem contas rejeitadas pelo Tribunal de Contas, a Justiça do RN abriu precedente para que essas condenações não tornem políticos inelegíveis. A juíza convocada do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte (TJ-RN), Welma Menezes, suspendeu nesta quarta-feira (18), os efeitos de determinação do Tribunal de Contas do Estado (TCE/RN), que desaprovou as contas do ex-prefeito de Portalegre, Manoel de Freitas Neto, tornando-o, em tese, inelegível. Freitas é candidato no município.
A magistrada ordenou que seja dada ciência ao juiz da Comarca para imediata exclusão do nome do ex-prefeito dos registros emitidos à Justiça Eleitoral pelo TCE/RN, até deliberação da 3ª Câmara Cível, onde tramita o processo.
Manoel de Freitas Neto teve as contas reprovadas pela corte de contas, fato que o tornou, em tese, inelegíve.Devido a isso, acabou condenado a uma pena de multa e a devolver aos cofres públicos quantias especificadas pelos próprios conselheiros do TCE/RN. A Câmara de Vereadores da cidade ainda não se debruçou sobre o assunto.
A defesa do ex-prefeito sustenta que o mesmo foi incluído indevidamente na lista de inelegíveis do TCE/RN, uma vez que o mesmo não se enquadraria em qualquer hipótese de inelegibilidade, ou seja, vício insanável, ato doloso e improbidade administrativa.
A juíza convocada Welma Menezes deferiu o pedido de Manoel de Freitas Neto sob a justificativa de a análise neste momento processual deve se limitar ao juízo de admissibilidade e a averiguação de requisitos sumários. “Não há, no momento, espaço para discussões mais profundas sobre o tema. Estas ficam reservadas para a apreciação final do recurso”, assinalou a magistrada.

Divórcio é decorrência natural do casamento por amor

Por: Por Rodrigo da Cunha Pereira

O divórcio é uma natural decorrência do casamento por amor. Antes, quando os casamentos eram arranjados e feitos por diversos tipos de interesse, e a família era muito mais um núcleo econômico e reprodutivo do que o espaço da afetividade, eles não se dissolviam. Aguentava-se até a morte. Amantes e infidelidades tinham que ser suportadas pelas mulheres, cuja resignação histórica é quem os sustentava, à custa da não consideração de seus desejos. Em 28 de junho de 1977 o então senador Nelson Carneiro, o grande responsável por todas as evoluções no Direito de Família daquela época, conseguiu, por intermédio da Emenda Constitucional 9, quebrar o princípio da indissolubilidade do casamento. Esta movimentação pro divórcio iniciou-se na América do Sul pelo Uruguai em 1907, seguido pela Venezuela (1942), Equador (1948), Argentina (1987), Paraguai (1991) e, por fim, o Chile, em 2004.
A importância política e social do divórcio vai além da reafirmação do estado laico. A ele estão atrelados valores básicos que devem sustentar uma democracia: liberdade e autonomia privada. Em 13 de julho de 2010, a Emenda Constitucional 66, proposta pelo Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), por meio do então deputado Sérgio Barradas Carneiro, finalmente conseguiu instalar o divórcio verdadeiramente laico no Brasil. Ela pôs um ponto final às discussões iniciadas na década de 1970, quando o jogo de forças políticas, representadas pela igreja católica, não admitia, como ainda não admite, que um casamento se dissolva em vida. Católico que é católico não se divorcia.
Naquele embate de quase 40 anos atrás, foi necessário fazer muitas concessões para que se aprovasse a Emenda Constitucional que introduziu o divórcio no Brasil. Só se podia divorciar uma única vez, tinha-se que esperar cinco anos de separação de fato para requerer o divórcio e manteve-se o anacrônico e ridículo desquite (expressão substituída por separação judicial) que é uma espécie de purgatório, ou limbo entre casado e divorciado. Mesmo assim, a introdução do divórcio só foi possível porque o presidente da República da época, Ernesto Geisel, não era católico e não simpatizava com as “forças antidivorcistas”.
O discurso dos parlamentares contrários à simplificação do divórcio em 2010 era o mesmo de 1977, superficial e espiritualmente pobre, agora reforçado pela retórica da bancada evangélica, de que a facilitação do divórcio banaliza e destrói as famílias. Certamente, nem eles mesmos acreditam nessa bobagem, mas precisam se sustentar nos discursos fáceis e que podem lhes render votos. Essas resistências acontecem até mesmo no ambiente jurídico em que se pressupõe que Direito e religião devem ficar em instâncias separadas, para que se possa ter boas religiões e um bom Estado.
E assim se passaram 35 anos de divórcio no Brasil. Quebraram-se resistências, e reafirmou-se o estado laico através de novas medidas e simplificações do divórcio em 2010: não há mais prazos para requerê-lo; eliminou-se o inócuo instituto da separação judicial (apesar de algumas resistências até mesmo entre alguns juristas) e substituiu-se o discurso da culpa pelo da responsabilidade. Em outras palavras, o Estado não procura e não crucifica mais um culpado pelo fim do casamento. Ou seja, em briga de marido e mulher, o Estado não mete mais a colher.
O aumento da taxa de divórcios em 70% entre o ano de 2000 e 2010 é apenas decorrência do amadurecimento da legislação e constatação de que o divórcio anda paralelo às relações amorosas. Compreensível, o sentimento é volátil e quebradiço. O desejo encaminha, mas também desencaminha e o amor às vezes acaba. E os filhos? O casal com filhos, obviamente tem uma responsabilidade maior com a manutenção do casamento. Mas isto não significa que deverão ficar casados a qualquer custo. Filhos estarão melhores na medida em que os pais estiverem mais felizes. E afinal, a gente casa para ser feliz e se divorcia, também, à procura da felicidade.

Tempo de sustentação oral do advogado é de 15 minutos

Foi publicada hoje, no Jornal Valor Econômico, notícia a respeito de julgamento de processo perante a 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, no qual teria sido afirmado que não há dispositivo legal que garanta ao advogado o tempo mínimo de 15 minutos para sustentação oral de suas razões de recurso, uma vez que o inciso IX, do artigo , da Lei 8.906 /94, teria sido "excluído do ordenamento jurídico, em sua integralidade, pelo Supremo Tribunal Federal (STF)".
Há um sério equívoco em tal informação. O advogado possui, sim, a garantia legal de prazo mínimo para sustentação oral de suas razões de recurso, nos termos do artigo 554, do Código de Processo Civil e 613, do Código de Processo Penal . A declaração de inconstitucionalidade do inciso IX, do artigo , da Lei 8.906/94 foi acolhida pela maioria dos Ministros do Supremo Tribunal Federal (ADI 1.105), em decorrência da previsão de sustentação oral após a prolação do voto do relator e não em decorrência da fixação de prazo para sustentação oral, que, conforme os Ministros reconhecem expressamente no referido julgado, já era garantida pela nossa legislação processual civil e penal.
Há, excepcionalmente, possibilidade de redução desse prazo apenas quando há diversas partes e procuradores em um mesmo processo. Nesses casos, não há notícias de abusos ou dificuldades para os advogados, nas diversas sustentações de razões de recursos.

Adicional noturno incide em período inferior a uma ho

Não há exigência legal de que o adicional noturno incida apenas sobre o período completo de uma hora após as 22 horas. Foi o que decidiu a 2ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho ao acolher recurso de um professor e restaurar sentença que determinou o pagamento de adicional noturno pelo trabalho feito por ele até às 22h40.
Para o relator do recurso, ministro José Roberto Freire Pimenta, neste caso, o adicional noturno é, de fato, devido, já que o artigo 73, parágrafo 2º, da CLT não exige que ele incida apenas sobre o período completo de uma hora após as 22 horas. Portanto, "o fato de o professor ter trabalhado em apenas 40 minutos no período noturno não afasta o seu direito à incidência do adicional sobre esse período", explicou.
O professor entrou com reclamação trabalhista contra a Sociedade Educacional de Divinópolis Ltda., onde desempenhava suas atividades até as 22h40, em três dias da semana. A escola não lhe pagava adicional noturno pelos 40 minutos posteriores às 22h, horário em que o adicional passa a ser devido, nos termos do artigo 73, parágrafo 2º, da Consolidação das Leis do Trabalho.
A primeira instância reconheceu o direito do professor e determinou o pagamento do adicional noturno proporcional ao tempo trabalhado após o início do período noturno. No entanto, tal decisão foi reformada pelo Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (MG), que considerou indevido o adicional nessa situação, já que não se completou uma hora noturna por inteiro, tendo a jornada avançado parcialmente além das 22 horas.
O professor recorreu ao TST e manteve suas alegações. O voto do relator foi seguido por unanimidade. Com informações da Assessoria de Imprensa do TST.
Processo: RR-100800-15.2009.5.03.0098

quinta-feira, 19 de julho de 2012

Dados cadastrais não estão protegidos por sigilo

A nova Lei de Lavagem de Dinheiro (Lei 12.683), em vigor apenas desde o dia 9 de julho, já começa a mudar os parâmetros das decisões judiciais sobre sigilo. Em decisão desta terça-feira (17/7), o Tribunal Regional Federal da 5ª Região franqueou o acesso de donos de linhas telefônicas a dados cadastrais de usuários de quem recebem chamadas. Os desembargadores entenderam que a nova lei trouxe dispositivo que reforça o entendimento de que o sigilo protegido pela Constituição não se refere a dados cadastrais. Cabe recurso.
A 2ª Turma do TRF-5, por maioria de votos, manteve decisão de primeira instância que determinou à Agência Nacional de Telecomunicações a regulamentação do acesso, pelos destinatários de ligações, a dados de linhas telefônicas emitentes. O colegiado afirmou não ver ilegalidades em pedido feito por meio de Ação Civil Pública. O Ministério Pùblico Federal entrou com a ação atendendo ao pleito de Márcio Marques Rodrigues, de Sergipe, que representou contra a Oi. O usuário questionava a falta de proteção a que estão sujeitos os clientes da operadora quando são vítimas de golpes mediante ligação telefônica.
“Os dados cadastrais não estão agasalhados no inciso X do artigo 5º da Constituição Federal, de modo que não se contrapõe ao princípio da inviolabilidade da intimidade e permissibilidade de acesso a essas informações, sem prévia autorização judicial, como, aliás, reconhecido pelo legislador, com a inserção do artigo 17-B da Lei de Lavagem de Dinheiro. Máxime, no caso dos autos, em que se está, apenas, garantindo ao destinatário o direito de saber os dados referentes às pessoas que promovem chamadas para os seus aparelhos telefônicos”, afirmou o juiz federal convocado Walter Nunes da Silva Júnior, autor do voto condutor do acórdão.
Em julho de 2008, Rodrigues informou ao MPF ter sido vítima, por duas vezes, de golpes via ligações telefônicas e que, numa das vezes, foi simulado o sequestro de sua filha. O MPF instaurou procedimento administrativo para apurar os fatos e passou a enviar ofícios a todas as operadoras, requisitando informações de como se processa o fornecimento de números dos telefones e informações dos titulares de linhas que deram origem a ligações criminosas ou suspeitas. Em resposta, todas as operadoras informaram que não disponibilizavam de tais informações por impedimentos constitucionais. O MPF ingressou na Justiça.
A sentença de primeiro grau determinou que a Anatel regulamentasse o acesso dos usuários aos dados cadastrais de interlocutores não identificados, no prazo de 120 dias, independentemente de ordem judicial. A decisão obrigou as operadoras a fornecer o nome do titular da linha que originou a ligação e o número de identificação no Cadastro de Pessoas Físicas da Receita Federal.
A Anatel apelou, alegando ilegitimidade ativa do MPF para promover a ação, por não estarem presentes os direitos difusos — massa de indivíduos — ou coletivos — pessoas ligadas por uma relação jurídica —, bem como sua ilegitimidade passiva, em virtude da agência não possuir relação direta com os consumidores, pois a questão discutida na ação se limitaria ao interesse privado.

quarta-feira, 18 de julho de 2012

Preso tem direito de dar entrevista a quem quiser

Por Elton Bezerra

Criminalistas criticaram a decisão do juiz Bruno André Silva Ribeiro, da Vara de Execuções Penais do Distrito Federal, que negou pedido de autorização de visita do jornal Folha de S.Paulo ao interno Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira. Além de barrar a entrevista do jornal, o juiz vetou também o acesso de toda a imprensa ao réu, segundo a Assessoria de Imprensa do TJ-DF.
Para Paulo Sérgio Leite Fernandes, a decisão viola direitos fundamentais garantidos pela Constituição. “O juiz não pode especificar como quando e por que o réu pode ser entrevistado. Isso significa um constrangimento enorme às garantias e liberdades individuais. Ele está preso, mas não está privado de comunicação com o mundo externo. Isso não acontecia nem no tempo da inquisição”, afirma.
Ele disse que Cachoeira tem direito de escolher inclusive o veículo para o qual deseja conceder entrevista.
“Não se pode obrigar o réu a conceder entrevista a uma multiplicidade de órgãos de imprensa. Primeiro porque ele precisa confiar em quem o entrevista; em segundo lugar, ele pode não querer abrir a todos aquilo que só quer conceder a quem ele confia; em terceiro, porque proibi-lo é restringir um tipo de comunicação que a Constituição não proíbe.”
O entendimento é semelhante ao de Andrei Zenkner, que lembrou que entrevistas de presos envolvidos em casos rumorosos não são novidade. “Foi o que ocorreu no caso Eloá Pimentel, em que seu pai, então recolhido em Maceió, concedeu entrevista para o programa Fantástico no dia 12 de fevereiro.”
O advogado classificou a autodefesa como um direito assegurado a todo cidadão, preso ou em liberdade. “Havendo expressa manifestação de interesse pessoal do preso em conceder entrevista a meio de comunicação, e não havendo risco algum à segurança da casa prisional onde ele se encontra custodiado, é impossível falar-se em óbice processual, tampouco constitucional”, diz.
Custódia do Estado
Ao justificar sua decisão, o juiz negou o pedido de entrevista do jornal Folha de S.Paulo a partir da distinção entre "interesse público" e "interesse do público". Ele afirmou que “não se pode confundir interesse público, resguardado constitucionalmente, com o simples interesse do público, consistente na mera curiosidade sobre o que o réu possivelmente possa revelar, ‘com exclusividade’, para um meio impresso”.
Ribeiro defendeu que o interesse público vem sendo observado pela Justiça e que Cachoeira terá o direito de dar sua versão dos fatos em audiência já marcadas para os próximos dias.
“Em um Estado Democrático de Direito há tempo, modo e sede próprios para o réu dar sua versão dos fatos, nada justificando sua escolha pontual por um veículo específico de imprensa, à moda de talk-show, especialmente enquanto recluso e sob responsabilidade da Justiça”.
O juiz disse também que a concessão da entrevista implicaria um tratamento distinto do dispensado a todos os demais reclusos, o que contrariaria a isonomia da Justiça.

terça-feira, 17 de julho de 2012

MINISTÉRIO PÚBLICO DE OLHO EM MONTANHAS/RN -FARRA DAS PINTURAS DE PRÉDIOS PÚBLICOS

Devido as diversas denúncias que chegaram ao Ministério Público Estadual,  o mesmo recomendará à Prefeita de Montanhas, conhecida por "LETINHA"; que promova a pintura, às suas próprias custas, de todos os prédios públicos do município que porventura se encontrem nas cores que identifica a Prefeita e a sua coligação partidária.
O objetivo da recomendação é evitar a promoção pessoal, como também a da coligação e ao partido no qual se encontra filiada, sob pena de responder AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA..
Segundo o entendimento jurisprudencial, “comete ato de improbidade administrativa por ferir o principio da impessoalidade e da moralidade administrativa, o administrador que, ao promover a reforma e pintura de diversos imóveis municipais, deliberadamente opta por aplicar nesses bens públicos cores em injustificada correlação com a bandeira do partido político ao qual pertence ou a utilizada em sua campanha política anterior.”
De acordo com informações, o Ministério Público Eleitoral determinará um prazo de 30 dias para que as medidas sejam adotadas, devendo ser apresentado fotos e notas fiscais que comprovem que as repinturas dos prédios públicos foram realizadas com verbas pessoais da Prefeita e não da Prefeitura. Em caso de não cumprimento, o MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL promoverá medidas judiciais cabíveis, como até mesmo o cancelamento do registro da candidatura da prefeita LETINHA.

FONTE: ASPAC

Lei tira inquéritos da lista de antecedentes criminais

A ficha de antecedentes criminais não pode mencionar inquéritos. A previsão está na nova Lei 12.681, de 2012, sancionada no último 5 de julho, que modifica o Código de Processo Penal. O recém-inserido artigo 20 determinou que “nos atestados de antecedentes que lhe forem solicitados, a autoridade policial não poderá mencionar quaisquer anotações referentes a instauração de inquérito contra os requerentes”. A redação antiga estipulava que a autoridade policial apenas asseguraria sigilo aos inquéritos.
A nova lei cria também o Sistema Nacional de Informações de Segurança Pública, Prisionais e sobre Drogas, o Sinesp. Na prática, o banco de dados vai concentrar, entre outras informações, ocorrências criminais informadas à Polícia, registros de armas de fogo, entrada e saída de estrangeiros, desaparecimentos, execuções penais e mandados de prisão, como noticiou a Consultor Jurídico.
O criminalista Hugo Leonardo elogiou a mudança. “A exibição das informações pretéritas se relaciona com o superado direito penal do autor, que estigmatiza o indivíduo na sociedade", diz. “A alteração valoriza a concepção moderna do direito penal e aperfeiçoa a adequação do dispositivo ao princípio constitucional da não-culpabilidade, principalmente ao se reconhecer que os elementos do inquérito policial são indícios passíveis de eventual corroboração em juízo ou descarte após esclarecimentos a surgirem no curso da investigação. Eles são dados imprestáveis para divulgação.”
Para Renato Stanziola Vieira, sócio do escritório André Kehdi & Renato Vieira Advogados, a regra deveria ter vindo com uma lei exclusiva. “A mudança não é tão grande, mas é importante. Na prática, significa que não podemos sair por aí fornecendo registros da vida pretérita das pessoas. Essas informações não podem constar nas fichas criminais, que são documentos que não requerem tanta formalidade”, diz.
O advogado lembra ainda do texto da Súmula 444 do Superior Tribunal de Justiça, segundo a qual é “vedada a utilização de inquéritos policiais e ações penais em curso para agravar a pena-base”.

Lei de lavagem viola princípio da não-culpabilidade



Publicada em 10 de julho de 2012, a Lei 12.683/2012 alterou substancialmente a legislação que rege a lavagem de capitais (lei 9.613/1998) e segundo o legislador possui o escopo de tornar mais eficiente à persecução penal dos crimes de lavagem de dinheiro.
Referida legislação intitulada por alguns de “nova lei de combate à lavagem de dinheiro” trouxe várias alterações no que concerne aos aspectos substantivos e adjetivos da lei que, aliás, veio para tornar mais rigorosa a fiscalização e deveras gravosa a reprimenda para o delito de branqueamento de capitais.
Uma das principais inovações adveio com a revogação do rol taxativo dos crimes considerados graves e “antecedentes” da lei 9.613/1998 (tráfico, terrorismo, crimes contra a administração pública, extorsão mediante seqüestro, contrabando ou tráfico de armas, crimes de colarinho branco, praticados por organização criminosa). Ou seja, pelo texto da novel legislação, qualquer crime ou contravenção penal pode ser considerado como delito antecedente à lavagem de dinheiro (Artio 1º, da Lei 12.683/2012).
Em que pese esta recente mudança, nos parece que não agiu corretamente o legislador, criando uma verdadeira banalização da lei de lavagem, ao ampliar indiscriminadamente a figura dos intitulados “crimes antecedentes”.
Ao agir assim, o legislador deu o mesmo tratamento aos crimes considerados graves e aos delitos de menor potencial ofensivo, pois segundo a novel lei são tratados da mesma forma quem comete crimes considerados graves e dissimula a origem do capital considerado ilícito (ex: tráfico de drogas, extorsão mediante sequestro) e aqueles que cometeram contravenções (ex: explorar jogos de azar) ou crimes de menor potencial ofensivo (ex: transportar madeira sem guia florestal) e dissimulam a origem do dinheiro.
Ora, como se aplicar a mesma pena de lavagem (pena mínima de 3 anos) para quem efetuou branqueamento de capitais oriundos de intensa atividade de tráfico internacional de drogas (várias toneladas) e se aplicar a mesma reprimenda a quem apenas transportou alguns metros cúbicos de madeira (pequena quantidade) sem autorização legal? Seria crível se aplicar uma pena mínima de três anos para a lavagem decorrente do transporte ilegal de madeira, se a pena máxima para o transporte ilegal (delito originário) seria apenas 1(um) ano? Seria razoável aplicar a mesma pena se a lavagem do tráfico importou em alguns milhões de reais, e a do transporte ilegal de madeira em pouco mais de dez mil reais?
Como se vê, prevê o legislador idêntica punição para situações distintas e sem o mesmo grau de gravidade, o que além de ferir o princípio da proporcionalidade, revela-se um grande retrocesso.
No que tange a chamada colaboração premiada, referido instituto agora poderá ser concedido a ‘qualquer tempo’ (artigo 1º, parágrafo 5º, da Lei 12.683/2012). O que em outras palavras significa dizer que, com o advento da nova lei, o benefício da delação premiada poderá ser aplicado mesmo depois do édito condenatório, o que antes não era previsto na legislação.
Tal alteração, ao contrário da dos crimes antecedentes, é digna de aplausos.
Por fim, a pior alteração, em nossa singela opinião, recai no afastamento do servidor público de suas funções, em caso de indiciamento (artigo 17-D, da Lei 12.683/2012). Isto significa dizer que basta apenas o indiciamento pela autoridade policial para que o servidor público seja automaticamente afastado de suas funções.
Causa preocupação a desfaçatez com que se suprime direitos no nosso País.
Destarte, qualquer medida cautelar que restrinja direitos deve ser fundamentada por autoridade judiciária, sob pena de nulidade. É preocupante outorgar poderes ao Delegado de Polícia, com a devida vênia, para afastar um servidor do exercício de suas funções sem qualquer controle judicial, onde um simples indiciamento poderá gerar contornos irreparáveis.
Como medida cautelar, o afastamento apenas deverá ser determinado quando existirem elementos que demonstre que a permanência no cargo poderá gerar risco de continuidade delitiva, ou seja, para a efetividade do processo. No entanto, tal verificação e determinação será de competência exclusiva do órgão de controle judicial e jamais da autoridade policial.
Não se desconhece posicionamentos já externados no sentido de se aplicar o ‘afastamento preventivo’ previsto na Lei do servidor público (artigo 147 da Lei 8.112/1990) ao processo penal, sob fundamento de que na referida legislação o servidor poderá ser afastado preventivamente, sem decisão judicial, razão pela qual esta novel legislação apenas consignou este entendimento.
Todavia, com o devido respeito, não podemos olvidar, em primeiro lugar, que o indiciamento não se confunde com a formação de culpa que deverá ser analisada apenas pelo judiciário por parte do julgamento de mérito, sob pena de antecipação de pena.
E, em segundo lugar que, como medida cautelar, o afastamento apenas poderá ser determinado pelo judiciário se presentes os pressupostos necessários.
Logo, não se pode atribuir poderes ao delegado de polícia para afastar o servidor público de suas funções, sob pena de violação ao mandamento constitucional.
Com efeito, pode-se dizer que esta nova previsão legal, além de violar exaustivamente o princípio da não-culpabilidade, se mostra equivocada, haja vista que o afastamento apenas pode ser decretado pelo juiz, de forma fundamentada, como toda e qualquer decisão judicial.
Em arremate, entendemos que a lei trouxe avanços e retrocessos, e esses últimos precisam ser combatidos para que não tenhamos mais uma lei com contornos midiáticos a violar o sagrado devido processo legal, que possui com um dos seus substratos o princípio da razoabilidade.

segunda-feira, 16 de julho de 2012

Juros cobrados devem ser discutidos em tribunais

Por Izner Hanna Garcia

Poucos meses atrás, na esteira de discussões econômicas, assistimos nossa presidente manifestar repetidas vezes contra as altas taxas de juros e dos spreads praticados pelos bancos brasileiros.  Em consonância com esta crítica o Banco Central reduziu sistematicamente a Selic que está em 8,5% ao ano.
Não obstante, obviamente, todos sabem que este patamar de 8,5% ao ano não é a baliza do custo financeiro que é praticado pelo sistema bancário brasileiro. As taxas de juros para as operações de empréstimo pessoal em junho aumentaram, em média, 0,07 ponto percentual (p.p.), passando de 5,43% ao mês (a.m.) para 5,5%, informa a Fundação Procon-SP.
Em um exercício de aproximação tomemos que o custo financeiro médio no Brasil seja hoje de 50% ao ano.
Façamos agora um exercício comparativo. O custo financeiro médio no EUA, quando alguém (empresa ou pessoa física) vai até um banco e contrata um empréstimo, é de 7% ao ano.
Assim, hipoteticamente, tomemos um capital de US$ 1 milhão ou R$ 2 bilhões.
Nosso colega norte americano, tomando um empréstimo de US$ 1 milhão pagará US$ 70 mil ao ano de juros.
O brasileiro, tomando um capital de R$ 2 milhões (arredondando a cotação do dólar para R$ 2,00), pagará, de juros, R$ 1 milhão ou US$ 500 mil ao ano.
Chocante, não?!
O que aqui pagamos em um ano os americanos pagam em 8 anos.
Não é difícil compreender que esta conjuntura, quando se tem no crédito uma das fundamentais condicionantes de uma economia, é fator sumamente prejudicial ao Brasil e à nossa economia e sociedade.
Este custo do crédito, tão exorbitante e discrepante, simplesmente inviabiliza qualquer possibilidade de que o tomador, com a aplicação do capital emprestado, gere retorno que lhe permita remunerar tais juros.
Literalmente tomar um empréstimo no Brasil significa simplesmente transferir renda e capital para o agente financeiro visto que não há negócio possível que possa fazer frente a este juro.
Neste ponto, certamente, poderá o leitor estar indagando: mas isto é um fato econômico e não tem relevância jurídica. Coisa de economistas.
Pensar assim é subtrair à ciência jurídica sua grandeza.
O Direito é uma ciência humana e tudo que ao homem interessa é do interesse do direito.
Pensemos, por exemplo, na clonagem humana. Esta matéria, em princípio, está afeita à ciência médica e biológica. Contudo, vez que traz reflexos ao homem ao Direito é dever tratar e regulamentar.
Da mesma forma as relações econômicas de uma sociedade. Alguém poderá negar que as relações financeiras e creditícias têm relevância e reflexos para toda sociedade?
O primeiro passo para compreensão da abrangência desta questão é ter em mente que o sistema bancário “opera e trabalha” com o capital de toda sociedade, funcionando quase como “caixa único” de uma nação.
Os bancos exercem sua atividade, em larga medida, com capital que não lhes é próprio e sim com capitais que amealham de toda sociedade e para tanto são instituições que, para funcionarem, tem regulação especial.
Este fato, em si, já denota que a atividade bancária é enquadrada dentro daquelas que, à despeito de exercidas por entes privados, tem relevância social e, por tal, são regulamentadas de maneira especial.
Um banco não é uma quitanda de verdura que qualquer um, sem maiores regulamentações, pode abrir. É necessária uma carta patente que representa um dever e um privilégio. Somente os bancos podem exercer a função de captar o dinheiro da sociedade.
Assim e por esta razão a permissão da prática do custo financeiro exorbitante que vige em nossa economia contraria, sem qualquer justificativa, a legalidade.
A ofensa legal inicia-se à agressão ao artigo 192 da Constituição Federal que, em seu caput, estabelece claramente que: "O sistema financeiro nacional, estruturado de forma a promover o desenvolvimento equilibrado do país e a servir aos interesses da coletividade, em todas as partes que o compõem, abrangendo as cooperativas de crédito, será regulado por leis complementares que disporão, inclusive, sobre a participação do capital estrangeiro nas instituições que o integram”.
O texto constitucional é claríssimo, não há possibilidade para tergiversar: promover o desenvolvimento equilibrado do País.
Como falar em “desenvolvimento equilibrado” quando o custo financeiro praticado é de 50% ao ano?
Mas deixemos de lado a Constituição. Já nos acostumamos à realidade de que os princípios constitucionais são, em muitos casos, somente “intenções”.
Vamos à esfera das leis ordinárias e especiais.
O Superior Tribunal de Justiça já pacificou (Ação Direta de Inconstitucionalidade 2.591/DF) que as operações bancárias estão submissas ao Código do Consumidor. Se este julgado omitiu-se de regular os juros em si não ficou omisso da decisão que toda e qualquer atividade bancária está submetida a este diploma.
Assim, não há razão jurídica para afastar da análise jurídica de uma operação bancária os princípios norteadores do Codigo do Consumidor que, no seu artigo 6º inciso V, estabelece que: “Artigo 6º São direitos básicos do consumidor: V - a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas”.
Ora, como negar que o custo financeiro (juros) de 50% ao ano é desproporcional e excessivamente onerosa?
Vamos além. Lembremos do artigo 421 do Código Civil. Ali o legislador criou uma fundamental condicionante à liberdade de contratar: a função social do contrato.
Voltemos agora ao conceito de banco. Acaso pode-se dizer que um banco deve e pode somente perseguir seus lucros, desconsiderando a função social que exerce na sociedade como agente relevante no desenvolvimento (ou não) como se fosse uma quitanda de verdura?
Se admitirmos que os bancos podem cobrar seus juros na forma como hoje praticam, transformando as operações bancárias em verdadeira expropriação financeira dos tomadores, (mormente quando considera-se que pagam aos seus depositantes tão e só 8,5% ao ano frente aos 50% que cobram dos tomadores) estaríamos fazendo letra morta do artigo 192 da Constituição Federal, do Código do Consumidor (artigo 6º inciso V) e do Código Civil (artigo 421).
Frente à omissão do governo (Banco Central) a batalha pela legalidade deve ser travada no cotidiano das cortes fazendo-se sumamente importante que todos os profissionais do direito (juízes, promotores e advogados) tenham como compreensão que a questão dos juros não é um debate econômico, alheio ao Direito.