quinta-feira, 30 de agosto de 2012

TRIBUNAL DO JÚRI - Técnica para ganhar é imunizar os pontos fracos

 
 
 
Abraham Lincoln, o 16º presidente dos Estados Unidos, enfrentou alguns conflitos de grandes proporções em seu governo, como a Guerra Civil Americana e a Libertação dos Escravos. Mas a resolução de conflitos já fazia parte de sua vida há tempos. Por 24 anos (quase metade de sua vida), ele atuou como advogado. Em seu legado, há algumas recomendações para a classe. Ele disse, por exemplo, que o sucesso do advogado em um contencioso é diretamente proporcional ao empenho que ele coloca no caso. E mostrou o que, para ele, era o caminho das pedras para ganhar qualquer litígio nos tribunais: conhecer o caso do oponente melhor do que ele mesmo.
O advogado e professor de Direito Paul Sandler diz que "Lincoln articulou uma verdade básica sobre estratégias no Tribunal do Júri: ganhar envolve a arte da imunização e da contradição. Isto é, o advogado tem de entender bem os pontos fracos e fortes de seu caso, bem como os pontos fortes e fracos da outra parte, para definir sua estratégia. A estratégia proposta por ele é a de "imunizar" seus pontos fracos contra os possíveis ataques da outra parte, refutar os pontos fortes do oponente e atacar seus pontos fracos (apenas os que são significativos para persuadir o júri).
A imunização significa apresentar os pontos fracos de seu próprio caso, antes que o oponente o faça. Isso mostra aos jurados e ao juiz, desde logo, que o advogado examinou todas as facetas do caso. E está preparado para discutir seus pontos fracos e seus pontos fortes, levando à conclusão de que, no conjunto, o seu caso é o único que faz sentido. A apresentação antecipada dos pontos fracos do caso pelo advogado desestabiliza os argumentos de seu oponente, diz o professor. Isso porque, quando o oponente atacar a questão, se o fizer, ele vai trombar com respostas que já estão nas mentes dos jurados. Isto é, à medida que o oponente argumenta, a mente de cada jurado pode processar uma explicação por conta própria, de forma consciente ou inconsciente.
Uma maneira de fazer isso é antecipar para os jurados o que seu oponente vai argumentar. Por exemplo, em um caso de lesão corporal, em que a outra parte vai alegar negligência do demandante (isto é, que a conduta do demandante contribuiu para sua própria lesão), o advogado pode alegar: "A defesa do Sr. Sandler vai sustentar que o Sr. Smith também foi negligente e que sua negligência o impede de solicitar indenização por danos, porém...". A tendência é a de que os jurados, quando ouvirem a outra parte, vão absorver o ataque sem abandonar as razões que o advogado já apresentou, diz o professor.
A explicação completa do ponto fraco do caso pode ser deixada para um momento subsequente, como o do contraditório, em que o advogado terá a oportunidade de demonstrar que o argumento do oponente é imperfeito. Mas a explicação completa exerce um efeito maior sobre os jurados se apresentada antes que o oponente mostre o seu argumento crucial. O professor entende essa técnica como uma espécie de "inoculação" (ou vacinação) contra um possível ataque devastador da parte adversária.
Na contradição, o advogado já ouviu a outra parte e trata de revelar — e atacar — as fraquezas de seus argumentos e provas, com o propósito de torná-los inaceitáveis pelo juiz e pelos jurados, explica Paul Sandler. Enquanto a parte adversária expõe o seu caso ao juiz e aos jurados, o advogado deve anotar rapidamente seus argumentos, para selecionar o que vai contestar e o que vai, pelo menos, "minar" (ou colocar em dúvida). Mas, sem tirar os olhos dos jurados, por muito tempo. As reações dos jurados podem ser uma boa indicação dos pontos que devem ser contraditados. Na hora da contradição, a linha de argumentação deve ser forte, mas não excessivamente longa ou exagerada, a ponto de exaurir a paciência dos jurados e do juiz.
Entretanto, não basta atacar a argumentação do oponente. "É preciso apresentar um caso superior ao dele", diz Paul Sandler. "Em termos simples, isso significa que o advogado deve persuadir o juiz e os jurados de que seus argumentos fazem mais sentido do que os de seu oponente", diz. Quando o advogado cria uma teoria positiva, ele oferece aos jurados mais do que um cenário alternativo aceitável. Ele também ajuda os jurados e o juiz entender que, afinal, a outra parte, a que cabia o ônus da prova, falhou em sua missão.
Exceções são difíceis de existir, mas existem, diz o professor. Por exemplo, se o advogado conseguir demonstrar que a outra parte não satisfez sua obrigação de arcar com o ônus da prova, ele não precisa se preocupar em construir uma teoria positiva no contexto da contradição.

quarta-feira, 29 de agosto de 2012

Em obediência ao Estatuto da Ordem o STF concede prisão domiciliar para advogado

Um advogado de Botucatu (SP) conseguiu o direito de permanecer em prisão domiciliar até o trânsito em julgado de sua condenação pelo crime de tráfico de drogas. A decisão unânime da Segunda Turma do STF foi tomada para assegurar o cumprimento do Estatuto do Advogado e confirma, agora no mérito, decisão liminar tomada no mesmo sentido em setembro do ano passado pelo relator do processo, ministro Celso de Mello.
O artigo 7º da Lei 8.906/94 (Estatuto do Advogado), prevê que os advogados sejam recolhidos em sala de estado-maior ou, na inexistência dela, em domicílio, até possível trânsito em julgado da condenação. A única sala existente no estado de São Paulo fica no Regimento Nove de Julho, na capital, e está ocupada.
A decisão também determinou ao juiz da 1ª Vara Criminal de Botucatu determinar as normas de vigilância e de conduta do advogado. Com informações são do Assessoria de Imprensa do STF.

Coligações beneficiam os partidos, não os eleitores

Como se sabe, o ordenamento jurídico brasileiro contempla dois sistemas de eleição: majoritário e proporcional. No majoritário, como o próprio nome indica, será eleito o candidato que obtiver o maior número de votos. Tal sistema é utilizado para o Senado Federal e para os cargos de chefia do Poder Executivo. Os demais cargos eletivos (vereadores, deputados distritais e estaduais e deputados federais) são providos mediante eleição pelo sistema proporcional.
Se o método do sistema majoritário pode ser considerado simples, o mesmo não se pode dizer do proporcional. No modelo brasileiro, esse sistema baseia-se, inicialmente, no quociente eleitoral, que vem a ser a divisão do número de votos válidos pelo de cadeiras a preencher. Em seguida, verifica-se quantos votos cada partido ou coligação obteve, preenchendo-se as vagas proporcionalmente. Assim, por exemplo, se o quociente eleitoral é igual a 10.000 votos, o partido que obtiver 20.000 votos elegerá dois parlamentares. Há, evidentemente, o problema das sobras e de seu cálculo, do qual não cuidaremos, por não interessar ao objetivo deste pequeno artigo.
O que nos motiva a escrever é algo que percebemos em nosso já longo contato com a matéria eleitoral: a completa falta de sentido e, em alguns casos, a enganação ao eleitor que decorre das coligações partidárias nas eleições proporcionais.
As coligações são uniões momentâneas de partidos políticos, visando a uma determinada eleição. No sistema majoritário, normalmente as coligações são precedidas de acordos políticos que vão repercutir no futuro governo, com divisão de poderes e execução de programas dos partidos coligados. Exemplo recente foi a coligação que congregou PT e PMDB no plano nacional, com a eleição de Dilma Rousseff, integrante do primeiro, para presidente, e Michel Temer, do segundo, para vice. Há, nessas coligações, uma soma de forças real, que transcende a eleição e se espraia pela execução dos mandatos.
Já a coligação para eleições proporcionais, geralmente, tem efeitos apenas no plano eleitoral. Partidos, muitas vezes sem qualquer afinidade programática, se unem com a exclusiva finalidade de somar os votos obtidos por cada legenda e, assim, alcançar maior número de cadeiras no Parlamento. Encerrada a eleição, extingue-se a coligação, sem qualquer repercussão no desempenho, pelos eleitos, de seus mandatos. Trata-se, a meu ver, de um instituto que só beneficia os próprios partidos, sem nenhuma vantagem ao eleitor. Pior: frequentemente ilude aquele que, vendo os partidos coligados, tem a impressão de que tal união significa uma previsão de futura atuação conjunta, quando, na verdade, se trata apenas de estratégia para obtenção de mandatos.
Deve o Brasil manter esse sistema? Penso que não. Quem sabe algum dia, se houver a reforma política de que tanto se fala, o tema receba a merecida atenção.

terça-feira, 28 de agosto de 2012

PROCESSOS ADMINISTRATIVOS E O SILÊNCIO ADMINISTRATIVO


DO SILÊNCIO ADMINISTRATIVO
Inércia Administrativa Genérica
A abordagem do tema ora enfocado pressupõe a idéia de que a administração pública tem o dever de agir, exatamente porquanto da sua atividade é que resultará a organização e o equilíbrio do Estado e da vida dos cidadãos.
A ação administrativa é freqüentemente vista  sob a ótica genérica do referencial aos chamados poderes públicos.
A visão contemporânea de tais poderes  está a mostrar o seu caráter instrumental em relação ao cumprimento da atividade fim, ou seja dos deveres da administração.
Mais correto, portanto, falar-se em um dever que se exercita pela via do poder, como simples mecanismo de consecução do primeiro.
Entre nós Celso Antônio Bandeira de Mello lança luzes sobre a matéria: (1)
“No passado, sublinhavam-se muito os “poderes” da Administração. Ao depois, como hoje já se faz com alguma habitualidade, passou-se a mencionar os “poderes-deveres” da Administração. Ainda assim, o binômio está mal-expressado. O que se deve encarecer é que a Administração-e, pois, o administrador-enfeixam “deveres-poderes”, porquanto os poderes têm destino apenas serviente. O direito administrativo por isso, não se aglutina-como ingenuamente possam pensar administradores desmandados em torno da noção de poder, mas congrega-se ao derredor da idéia de dever e - repita-se - de obsequiosa obediência às finalidades estipuladas no imperativo legal”. (In. Discricionariedade e Controle Jurisdicional, editora Malheiros, 1992, p. 54)
Assim, a administração deve agir para conseguir os seus fins e se não o faz, compromete a sua inteireza, e o seu próprio perfil ontológico.
Nestes termos, o omitir-se da administração traduz-se em quadro patológico de extrema gravidade.
Isso inobstante no direito pátrio não se tem dado o correto e aprofundado tratamento à prática abstencionista, cuidando-se quase sempre da análise dos atos positivos, quer do ângulo da sua perfeição, quer dos reflexos na responsabilidade do Estado.
A legislação, por seu turno quase sempre tenta remediar a omissão administrativa pela simples responsabilização dos agentes públicos, punindo-se o mal feitor, sem a rigor corrigir o mal.
Em uma classificação que remonta à Roma Antiga, declaram-se perfeitas as sanções, quando cogentemente se obtém a prestação não realizada pelo modo natural. Ao contrário são menos que perfeitas aquelas que se limitam a impor cargas valorativas negativas ao responsável pelo ilícito.
Ora, o cidadão diante da administração guarda a expectativa de que esta cumpra o seu dever e não é razoável que se afrustre, ainda quando se veunha a punir o agente relapso
A inércia administrativa caracteriza-se quando o Poder Público descura-se dos seus deveres e encargos constitucional e legalmente previstos.
Essa situação se caracteriza no dia a dia, ora pela ineficiência da máquina estatal, ora pela má condução da coisa pública outras vezes pela culpa ou dolo do servidor ou agente.
Em tais casos haverá dano à coletividade reparável, segundo a hipótese concreta por meio de indenização civil.
Particularmente centraremos o debate a uma perspectiva mais reduzida, qual seja a da inércia específica, resultante do não pronunciamento governamental, em face de ato provocativo do administrado.
Essa modalidade singular tem sido conhecida na doutrina sob a rotulação de “silêncio administrativo”.
Origens e precedentes no direito comparado.
Costuma-se estabelecer como origem legal ao tratamento do silêncio administrativo um Decreto de 02 de novembro de 1864, editado em França, pelo qual seriam consideradas negadas todas as pretensões dirigidas aos Ministros, que no prazo de 04 meses não obtivessem resposta.
Posteriormente a Lei de 17 de julho de 1900, no seu art. 3º, estendeu o tratamento jurídico a todos os reclamos veiculados perante qualquer órgão da administração pública.
Na Espanha essa questão surge por força do impacto gerado pela Ordenança Real de 09 de junho de 1947 que estabeleceu como condicionante de acesso a via judicial o prévio afrontamento da Instituição pública.
Consoante explicitado em tal norma, a exigência se fazia necessária de tal modo a permitir que o governo pudesse reparar seus atos e obter soluções mais adequadas, antes de ser submetido a instância judicial.
Diante disso, a jurisprudência passou a alertar de modo firme quanto a necessidade de uma posição terminativa da administração de modo a não inibir o exercício do direito de ingresso em juízo.
Somente, entretanto, em 1924 é que se estabeleceu a possibilidade de ultrapassagem da via administrativa, quando o silêncio, por decurso de prazo seria interpretado, em princípio,  negativamente, isto é, no sentido de recusar procedência à reclamação.
Na Itália em 1934 a Lei Comunal e Provincial estabeleceu a admissão do silêncio como forma negativa de resposta ao pleito.
Na Argentina, pelo Código de Procedimentos (Lei nº.19.549) se estabeleceu o princípio da denegação tácita pelo silêncio.
O mesmo diploma legal contemplou em caráter excepcional e mediante previsão expressa a perspectiva de que a atitude  silenciosa viesse a ser interpretada de modo positivo, isto é em favor do administrado.
Estabelecidas estas premissas vamos verificar qual a acepção e significado do silêncio administrativo e sua importância na formação do Estado de Direito.
Conceitos e distinções.
Trabalharemos  com a hipótese conceitual segundo a qual deve-se ter por silêncio administrativo em sentido estrito a atribuição de um significado  de outorga ou negativa de um pedido ou recurso, uma vez transcorrido o prazo estabelecido para a administração pronunciar-se.
Nesse compasso estabelecem-se  duas categorias  claramente distintas, quanto a repercussão do silêncio que podem ser identificadas, como silêncio negativo e silêncio positivo.
O primeiro, como já se pontuou resulta em admitir-se como rechaçada  a pretensão que não foi respondida ou resolvida  no tempo previsto em Lei.
Cumpre de plano indagar-se qual o proveito que resultaria para o administrado na extração de tal exegese.
Se examinarmos a Lei de Mandado de Segurança no Brasil (Lei 1.533 de 31 de dezembro de 1951), verificar-se no seu art. 5º o descabimento do remédio heróico contra ato de que caiba recurso administrativo, a que se atribua efeito suspensivo.
O Legislador claramente convidou a parte  a residir com anterioridade na instância administrativa, inibindo a exercitação da ação judicial, se aquela via enseja a suspensão da eficácia do ato.
A questão se complica, entretanto quando exercitado o recurso administrativo cabível, a administração não lhe confere solução, procrastinando o desate da matéria posta ao seu crivo, em situação de insegurança e desconforto para o interessado.
Nesse caso,  se, induvidosamente, o silêncio puder ser interpretado como negação do pedido, pelo menos  a parte poderá  agitar a via judicial, em busca da estabilidade da relação.
À falta de Lei específica muitas vezes  tem-se percorrido o tormentoso caminho de buscar-se a Justiça, tão somente para obter-se a pronuncia administrativa e a partir do resultado obtido, encetar-se nova lide judicial.
Por essa forma, a doutrina do silêncio  negativo representa  avanço no campo das relação entre administrado e administrador.
O segundo ponto que deve ser investigado consiste em saber se é possível adotar-se o silêncio negativo, sem previsão legal.
O nosso entendimento inclina-se pela afirmativa, lastreado na circunstância de que a ausência de pronunciamento deve inequivocamente merecer uma interpretação, considerando-se que se trata de uma conduta que produz efeitos  na órbita do administrado.
O art. 5º, inciso XXXIV, “a” da Constituição Federal assegura:
“ O direito de petição aos Poderes Públicos em defesa de direitos ou contra ilegalidades ou abuso de poder”.
Logo é evidente que ao direito de pedir corresponde o direito de obter a resposta  e ao considerar-se que essa resposta poderá ser positiva ou negativa é possível interpretar-se a ausência de manifestação explícita, em um sentido ou em outro.
Assim quando a Constituição estatui que nenhuma lesão se exclui da apreciação do Poder Judiciário esta lesão pode advir tanto de atos como de comportamentos.
Chegaremos pois à conclusão de que em regra  a administração quando não explicita o seu posicionamento assume comportamento, do ponto de vista lógico equivalente ao da negativa, como regra.
Não se ignora, que no plano privado em princípio deve prestigiar-se a máxima latina, segundo a qual: “ qui tacet utique non facetur”, porque o particular, salvo as determinações legais ou contratuais não está obrigado a se manifestar.
Ao contrário, o Poder Público diante do direito de petição tem o dever correspondente de resposta, na medida em que não lhe é dado o “non liquet”, porquanto o seu absenteísmo deve ser tomado como recusa, salvo situações que adiante serão examinadas.
A nossa ilação é, pois,  no sentido de que se deva conferir ao silêncio característica negativa sempre quando a natureza do ato o comporte e a Lei não vede expressamente  tal interpretação ou não lhe atribua outro efeito.
Tal raciocínio  tem espeque, inclusive, na teoria do ordenamento jurídico, segundo a qual ao particular  o que não lhe está proibido, está facultado.
Forma-se assim, como é sabido, um contínuo de licitudes e um descontínuo de ilicitudes, no âmbito da cidadania.
Porisso, o pleito exercitado pelo particular, a rigor submete-se frente a administração, a uma possibilidade de veto, veto este que deve ser exercitado em um determinado tempo.
Cabe agora saber, se a Lei não fixa um prazo para manifestação administrativa,  até quando  se deve aguardar o desfecho da postulação.
O problema não é singelo, tendo em vista a dificuldade de uniformização temporal para o proferimento das decisões, face a diversidade de grau de complexidade de cada matéria.
Não será, todavia, a lacuna legal que haverá de reduzir a pó o direito assegurado constitucionalmente.
Nesse caso, há de buscar-se o critério da razoabilidade, sem dúvida nenhuma categoria jurídica enquadrável no elenco dos chamados conceitos fluídos ou imprecisos, mas nem por isso inapropriável pelo interprete do direito.
Mais uma vez chama-se à colação Bandeira de Mello:
“ Logo, tem-se que aceitar, por irrefragável imposição lógica, que, mesmo que vagos, fluidos ou imprecisos, os conceitos utilizados no pressuposto da norma (na situação fática por ela descrita, isto é, no “motivo legal”) ou na finalidade, têm algum conteúdo mínimo indiscutível. De qualquer deles se pode dizer que compreendem uma zona de certeza positiva, dentro na qual ninguém duvidaria do cabimento da aplicação da palavra que os designa e uma zona de certeza negativa em que seria certo que por ela não estaria abrigada. As dúvidas só tem cabida no intervalo entre ambas. Isto significa que em inúmeros casos será induvidoso que uma situação é, exempli gratia, urgente, ou que seguramente não o é; que há um interesse público relevante ou que certamente não há; que dado cidadão tem reputação ilibada ou não a tem; que possui ou não possui notável saber; que determinado evento põe em risco a segurança pública, a moralidade pública, a tranquilidade pública ou, pelo contrário, que não as molesta”. (in. op cit. pag.29)
Estabeleça-se, pois, que à falta de Lei, deve-se entender que a manifestação administrativa deve-se exercitar, segundo as circunstâncias, em prazo RAZOÁVEL.
Aí está um conceito plenamento suscetível de ser aprisionado factualmente, de modo a permitir-se saber, com relativa margem de segurança se a administração extrapolou ou não, em termos de tempo, a faixa de razoabilidade.
A rigor poder-se-ia invocar o postulado inglês para sustentar que os atos devem ser praticados e a resposta ser dada, na omissão da Lei “as soon as possible”, vale dizer, logo que possível.
De qualquer modo, não se poderá perder o horizonte das raízes históricas no direito comparado, suscetíveis de instrumentar a interpretação analógica.
Como já fixado, no direito francês estabeleceu-se um prazo de 04 meses, no máximo para qualquer solução.
Na Espanha idêntico lapso foi adotado pelo regulamento administrativo de 1954.
O mesmo ciclo temporal foi estabelecido na Itália.
No Brasil podemos desenvolver o discurso, por via indireta. É que a ação mandamental está sujeita a prazo decadente de 120 dias, quando então o ato administrativo não mais pode ser atacado, por essa via.
Fixou-se assim um período máximo de tolerância para o administrado. Usando-se o mesmo parâmetro e para criar-se um critério isonômico, a mesma regra poderá ser aplicada quanto ao silêncio da administração, estabelecendo-se assim tal período, em qualquer hipótese como o máximo admissível para a pronúncia tempestiva.
Isso não quer dizer, que dadas as circunstâncias possa o prazo ser substancialmente menor, quando a demanda encaminhada não envolva maior complexidade “verbi gratia” o fornecimento de certidões.
A razoabilidade será aferida ademais tanto em função da natureza da tarefa a ser empreendida pelo órgão público, quanto diante da urgência ou da utilidade da outorga ou do deferimento pretendido.
Daí é que não se pode permitir ao Poder Público prazo tal, que torne inútil o pronunciamento.
O que é preciso insistir é no fato de que a ausência de previsão legal nem impede a adoção do silêncio negativo, nem muito menos  o entendimento da existência de um lapso prazal.
Urge agora  contemplar a chamada figura do silêncio positivo de aplicação menos frequente, exatamente pelas peculiaridades de que se investe.
Haverá silêncio positivo quando a abstenção administrativa possa importar  em concessão da pretensão deduzida.
Fiorini em sua obra “Derecho Administrativo”(2), traz o depoimento, no sentido de que no sistema Argentino, enquanto o silêncio negativo é a regra, o silêncio positivo decorre sempre de lei.
Essa observação, pode, a grosso modo, ser generalizada nos sistemas jurídicos contemporâneos que dão tratamento à matéria.
Garrido Falla (3) já havia assinalado algumas dificuldades inerentes a exegesa positiva do silêncio.
Questionou, por exemplo a dificuldades de que se teria de submeter a administração, a um pronunciamento não emanado de forma direta.
A observação procede  quando se tem em conta a perspectiva de obter-se um benefício que dependa diretamente  da interferência da entidade pública, como será o caso  do funcionário que postule adicional remuneratório por tempo de serviços.
Nesse caso, com muita probalidade a atribuição de tal efeito resultará inócua, a exigir a implementação da vantagem, pela via judicial.
Não será assim, todavia, quando se cogite de licença para prática de uma determinado ato, cujo exercício dependerá apenas do particular, desde que o Poder Público não o obstacule.
É a situação especificamente da licença para construção ou edificação onde o interessado há de buscar a aquiescência do Poder Público, que se desatará em procedimento inteiramente vinculado.
Muito especificamente a legislação do Município de Salvador num dos poucos exemplos encontradiços, a tal respeito, permite que o munícipe inicie a construção, se decorrido o prazo a obtenção do Alvará não foi este concedido.
Embora possa por muitos ser considerado um avanço e estamos em companhia destes, não há negar a existência  de alguns transtornos decorrentes de tal postura.
É facilmente perceptível a dificuldade de comercialização de um imóvel, cuja licença de construção não foi expressamente concedida, pela insegurança de que se nutrirão os espíritos dos adquirentes em potencial.
Tudo isso porque em verdade como bem assinalado na doutrina, para configuração do silêncio positivo  é necessário que o ato vindicatório se encontre em estrita conformidade com a lei. Mais do que isso, que o requerimento não apreciado, tenha sido instruído com todos os documentos que possibilitariam sua regular apreciação.
Afora esses aspectos, gera-se uma outra dificuldade, qual seja  a de ir-se a juízo  para pacificação do direito deduzido, quando  por presunção legal já este teria sido acatado.
Como anota com propriedade Ernesto Garnica(4):
“ Sob a perspectiva do interessado a efetivação do silêncio positivo é sobretudo duvidosa. Quando seja discutível se o pedido se acomoda ou não à legalidade o interessadoa se opta por atuar, ver-se-á submetido a um inevitável risco; como anotou Santamaria Pastor, o interessado se encontrará ante o dilema de fazer ou não fazer o uso do silêncio sem que ao menos possa em princípio provocar os tribunais para que aclare a sua situação, já que não pode atuar  como demandante para que se confirme um ato presumido, por silêncio positivo”. (In. El Silencio Administrativo en el Derecho Español, editora Civitas S/A., 1992, pag.179).
Ainda é de se registrar que o silêncio positivo deve ser restrito àquelas situações resultantes de procedimentos e atos vinculados, de tal sorte a emprestar-lhes um mínimo grau de certeza.
Andou bem, entretanto, no particular, o Código de Procedimentos Administrativo da Espanha, quando no seu art. 95 estabeleceu a existência de silêncio positivo em relação a recursos administrativos pendentes, quando a decisão de origem é favorável ao administrado.
Nesse caso, tendo sido a relação jurídica acertada na instância inferior não se justifica que se lhe impeça a executoriedade por conta da passividade do órgão hierárquico de maior grau.
É de registrar-se por fim o nosso sentimento de que ao se cuidar de silêncio positivo deveremos contar com lei expressa, ao contrário do que defendemos quando se cuida de silêncio negativo.
De outras nodalidades de silêncio
A dicotomia simplista entre silêncio negativo e silêncio positivo não abrange todo leque de situações que juridicamente podem ocorrer.
Certamente há de se ter presente que em determinadas situações não se poderá cogitar nem de interpretação negativa, nem de interpretação positiva, por estrita impossibilidade lógica, devendo-se nesse caso limitar-se o legislador a estabelecer a responsabilização do agente retardatário.
Tal ocorrerá quando o ato administrativo resulte de uma construção a ser elaborada pelo agente público.
Não será possível, portanto diante de uma licitação cujo resultado não foi declarado, de modo a proclamar-se vencedor um entre vários concorrentes, lograr-se a atribuição de uma solução em favor de um ou de outro, ultrapassando-se a organização estatal.
Em hipóteses que tais o remédio será mesmo compelir-se o administrador a praticar o ato, já que não se concebe alternativa diversa.
O mesmo se diga em relação ao professor de Universidade Pública que dispõe de um prazo para atribuição de notas a determinadas provas, mas por não atendê-lo, não dará azo, a que por exemplo se repitam notas anteriores ou se venha a suprir a avaliação por outro modo.
Para esses casos construímos  o enlace conceitual de atos administrativos insubstituiveis.
Poderíamos ainda falar no que rotularemos como silêncio preclusivo, onde o decurso do tempo dispensa pura e simplesmente a prática do ato.
Tal situação se verifica no direito parlamentar brasileiro, quando exemplificativamente uma comissão técnica deixa de opinar na oportunidade adequada sobre certo projeto, que então é encaminhado a Plenário, com supressão da instância.
Em algumas outras situações a emissão de parecer é dispensada, quando o parecerista transpõe a barreira temporal.
Nesses casos, a formalidade é simplesmente dispensada e a manifestação administrativa torna-se inexigível.
Da manifestação tardia da administração
Questão que vem a baila concerne a possibilidade de vir a administração a atuar em processo administrativo, findo o prazo que a lei lhe concedeu, e quando portanto já se podem extrair os efeitos  do silêncio.
Pensamos que a questão deve ser encaminhada em torno da indagação a quem aproveitam os efeitos do silêncio.
Se concluímos  que se trata de instituição de proteção do administrado, não haverá dúvida de que poderá este beneficiar-se da solução tardia quando se profira em seu favor, ainda quando o decurso de prazo lhe pudesse autorizar a conclusão negativa.
Sem dúvida, entretanto, se a parte ao captar o sentido negativo do silêncio já atuou na via judicial, não cabe a administração pugnar pela improcedência da lide, porquanto induvidosamente a alçada da decisão foi transferida a outra esfera.
É certo que o reconhecimento do pedido ainda que extemporâneo deverá ser sempre levado em conta, mesmo em sede judicial, quando a ação perderá o objeto, sem prejuízo da responsabilidade da administração pelos danos causados.
Questão outra a ser deslindada é aquela em que o silêncio negativo possa ter-se operado, com afetação de direitos de terceiros, beneficiados pela não concessão.
Nesse caso, entendemos não ser possível a afetação de direitos oriundos da presunção de não outorga, dado que não podem ser prejudicados aqueles que agiram em boa fé.
É preciso que se tenha em conta que a relação travada entre o administrado e a administração pública pode projetar efeitos externos que devem ser resguardados.
Esse aspecto mais se flexibiliza, quando não tenhamos prazo certo fixado em lei.
De qualquer modo em sede do direito brasileiro a equação pode ser encontrada nos termos da súmula 473 do Supremo Tribunal Federal, segundo a qual:
“S. 473 - A administração pode anular seus próprios atos quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque deles não se originam direitos, ou revogá-los por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos e ressalvada, em todos os casos a apreciação judicial”.
Desse modo, tal como se tivesse praticado o ato de modo concreto, o administrador pode anular ou revogar os efeitos emergentes da prática silencial, atendidas as consequências exteriorizadas na súmula, cuja matiz doutrinária sabe-nos acertada.
Esse entendimento deve-se ressaltar prevalece tanto em relação ao silêncio negativo, quanto ao positivo, sendo que neste último só será admissível a via anulatória em face do respeito que o Poder Público deve ao ato jurídico perfeito e acabado.
O estágio brasileiro
Adiantamos no início desse trabalho o incipiente tratamento dado a matéria no cenário nacional, onde a legislação esparsa e não sistematizada está em companhia da ausência de  maiores avanços na construção científica do tema.
É certo que em sede de jurisprudência podemos registrar a existência da súmula 429, que admite genericamente o uso de Mandado de Segurança contra omissão da autoridade, sem contudo traçar com maior clareza a extensão do conceito de tal conduta omissiva, nem precisar suas exatas consequências.
De um modo geral o tema vem tratado entre nós com ênfase no direito de indenização ao prejudicado, à luz da teoria do abuso de poder.
Nesse sentido os trabalhos clássicos de Caio Tácito(5), o abuso de poder administrativo no Brasil e Seabra Fagundes(6) - Responsabilidade no Estado Indenização por retardada decisão administrativa.
Pretende pois este ensaio avivar o interesse dos artifices do direito no debate de tão empolgante questão.

Prestação de serviço não é condição para regime aberto

A Súmula 493 do Superior Tribunal de Justiça vedou a aplicação das penas substitutivas previstas no artigo 44 do Código Penal como condição para a concessão de regime aberto ao preso. “É inadmissível a fixação de pena substitutiva (artigo 44 do CP) como condição especial ao regime aberto”, diz a súmula aprovada pela 3ª Seção do STJ.
A jurisprudência foi delineada pela 3ª Seção no julgamento do Recurso Especial (REsp) 1.107.314, que seguiu a sistemática dos recursos repetitivos, nos moldes do artigo 543-C do Código de Processo Civil. A Seção entendeu não haver norma legal disciplinando o que são “condições especiais”, já que o artigo 115 da Lei de Execução Penal deixou a cargo do magistrado estabelecê-las. Entretanto, a maioria do órgão julgador votou no sentido de que essas não podem se confundir com as penas restritivas de direito previstas no artigo 44 do CP.
O artigo 115 da LEP diz que “o juiz poderá estabelecer condições especiais para a concessão de regime aberto”, sem prejuízo de algumas condições gerais e obrigatórias trazidas pela própria lei, como não sair da cidade sem autorização judicial e voltar para casa nos horários determinados. Alguns tribunais de Justiça editaram normas complementares ao artigo 115 da LEP, prevendo entre elas a prestação de serviços à comunidade. Porém, a Seção destacou que legislar sobre direito penal e processual é competência privativa da União, prevista no artigo 22 da Constituição Federal, portanto as cortes estaduais devem “se abster de editar normativas com esse conteúdo”.
O ministro Napoleão Nunes Maia Filho, que relatou o recurso, apontou que as condições não podem se confundir com as punições previstas na legislação penal, como o caso dos serviços comunitários. Segundo ele, é lícito ao juiz estabelecer condições especiais para o regime aberto, complementando o artigo 115 da LEP, “mas não poderá adotar a esse título nenhum efeito já classificado como pena substitutiva (artigo 44 do CP), porque aí ocorreria o indesejável bis in idem, importando na aplicação de dúplice sanção”.
Em outro precedente da súmula, o Habeas Corpus 228.668, o ministro Gilson Dipp apontou que a 5ª Turma do STJ vinha entendendo que a prestação de serviços à comunidade ou a prestação pecuniária podiam ser adotadas como condição especial. Porém, o recurso repetitivo firmou a jurisprudência de que isso não é possível. O ministro determinou que outra condição especial, além dos serviços, devia ser imposta.
Já no HC 125.410, relatado pelo ministro Jorge Mussi, o condenado teve sua pena de reclusão convertida em prestação de serviços à comunidade. Ele não cumpriu a sanção e a pena foi convertida em privativa de liberdade, sem a condição especial. Posteriormente o Ministério Público recorreu e o Tribunal de Justiça de São Paulo o atendeu. Impôs a prestação dos serviços como condição para o cumprimento da pena em regime aberto.
A defesa alegou que isso seria utilizar duas penas autônomas como sanção e que os serviços comunitários não são cumuláveis com pena privativa de liberdade. O ministro Mussi concluiu que houve constrangimento ilegal no caso. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

segunda-feira, 27 de agosto de 2012

Juíza usa princípio penal para julgar causa eleitoral

Na dúvida, libere a pesquisa. Assim decidiu a Justiça Eleitoral do Acre ao autorizar a divulgação de uma pesquisa eleitoral no Estado contestada por uma coligação. “Afinal é de se aplicar em beneplácito do in dubio pro reo (na dúvida, a favor do réu), isso porque a garantia da liberdade de expressão e o direito à informação deverão prevalecer sobre a pretensão restritiva ainda que legislativa do Estado — sempre interpretada pela via excepcional”.
A decisão é da juíza Maha Kouzi Manasfi e Manasfi, da 1ª Zona Eleitoral de Rio Branco, que indeferiu a impugnação de pesquisa eleitoral do Ibope/Rádio TV Amazons (afiliada da Globo) pedida pela coligação Produzir para Empregar (PP, PDT, PPS, DEM, PRP, PSDB PT do B), encabeçada pelo tucano Tião Bocalom. A coligação afirma que o levantamento não atende aos requisitos da legislação eleitoral.
A chapa encabeçada por Bocalom alegou que a pesquisa não informou os bairros em que foi feita. Sustentou ainda que continha itens capazes de influenciar o eleitor, já que o levantamento pedia uma avaliação dos governos federal, estadual e municipal. Outros pontos contestados pela coligação foram a identificação dos entrevistados e o questionamento sobre problemas da cidade.
Segundo a juíza, o Ibope informou no prazo os bairros em que a pesquisa foi feita. Quanto às demais acusações, alegou que pesquisas de rejeição/aprovação são comuns e que a identificação dos entrevistados é necessária para assegurar a idoneidade dos dados. O instituto disse ainda que uma tarjeta impede a identificação das pessoas consultadas.
Os procedimentos do Ibope, porém, foram vistos com ressalvas pela juíza. “Ora, a impressão que tenho não é das melhores quanto à preservação da identidade do entrevistado, já que o método de controle pode (parece, na verdade!) ser falível e precisa ser aperfeiçoado", afirmou.
Maha também teceu críticas aos itens que avaliam as administrações municipal, estadual e federal. “Se a atual administração municipal local, assim como o governo estadual ou a presidência pretenderem avaliar suas gestões, que contratem cada um a sua pesquisa. A carona nas pesquisas alheias, no Acre, não são bem-vindas.” Apesar dessas ressalvas, Maha rejeitou o pedido de suspensão da pesquisa.
A utilização do princípio in dubio pro reo dividiu especialistas. Para o presidente da Comissão Eleitoral da OAB-SP, Silvio Salata, a juíza foi infeliz ao utilizar o conceito. “Ela estava um pouco indecisa e quis prevalecer a garantia da liberdade de expressão”. Para Salata, a juíza deveria ter determinado a exclusão dos aspectos que ela considerasse capazes de induzir o entrevistado. “Não existe in dubio pro reo, porque a jurisdição dela poderia impedir a divulgação dos quesitos que ela está comentando”.
Já para o advogado criminalista Jair Jaroleto a utilização do princípio tratou-se apenas de uma “questão semântica”. “Ela se expressou de uma maneira diferente sobre uma questão extrapenal, mas na verdade o que ela quis dizer foi que a prova não era suficiente para gerar a procedência do pedido”, avalia.
Apesar de reconhecer que o uso do princípio pode gerar questionamentos da parte vencida, ele acha difícil que a decisão seja revertida num tribunal superior. “Ela não se utilizou de uma legislação penal para julgar num ambiente eleitoral”.

Somente depoimento policial não vale para condenação

O depoimento policial, por si só, não vale como prova suficiente para a condenação em processo criminal. Com esta conclusão, a 4ª Vara Criminal de Vitória (ES) absolveu um jovem acusado de tráfico de drogas, expediu o alvará de soltura e determinou a devolução do dinheiro encontrado em seu bolso.




De acordo com os autos, o jovem foi visto em um beco conhecido por abrigar intenso tráfico de drogas. Os policiais que estavam no local afirmaram tê-lo visto entregar e receber algo de uma adolescente. Com ela encontraram 12 pedras de crack e um papelote de cocaína. No bolso do acusado havia R$ 90.



Ao longo do processo foram ouvidos um dos dois policiais, a adolescente, uma amiga dela, o réu e sua mãe. O policial disse ter visto a entrega do dinheiro, apesar da pouca iluminação no local. A adolescente e a amiga negaram ter comprado droga do acusado. O réu negou a acusação e disse que recebeu o dinheiro de sua mãe para ir a uma festa de carnaval, para onde se dirigia quando foi abordado e preso pelos policiais. A mãe confirmou.



No momento da abordagem policial, havia outras pessoas no local, de acordo com os depoimentos. No entanto, elas não foram ouvidas no processo. A juíza Rosa Elena Silverol não entendeu o motivo.



Na sentença, ela deixa claro que os depoimentos policiais são prestigiados pela doutrina e pela jurisprudência, mas não podem ser analisados de forma isolada. São necessárias outras provas nos autos para fundamentar uma condenação. “A simples condição de policial não traz garantia de ser o mesmo considerado infalível em suas ações, especialmente naquelas decorrentes da sua função, exercida, quase sempre, em situação de intenso estresse”, observou a juíza.



No caso analisado, a juíza considerou frágil o depoimento do policial. E ressaltou que a condenação anterior do réu, destacada pelo Ministério Público na denúncia, não deve interferir nas provas e na materialidade do processo posterior.



De acordo com a sentença, de fato, há uma probabilidade de os fatos descritos pela acusação terem ocorrido. Entretanto, no processo criminal deve haver provas. Não podem existir dúvidas. “Não ausência de certeza quanto à acusação, vigora o princípio do in dubio pro reo”, concluiu a juíza.



Leia a sentença:



Processo : 0006620-40.2012.8.08.0024 (024.12.006620-4)

Petição Inicial : 201200199270

Situação: Tramitando

Ação : Penal Pública Comum

Natureza : Toxicos

Data de Ajuizamento: 23/02/2012

Vara: VITÓRIA - 4ª VARA CRIMINAL

Distribuição Data: 27/02/2012 17:08

Motivo: Redistribuição por Sorteio

Partes do Processo

Autor MINISTERIO PUBLICO

Réu V. M. J.

999981/ES - DEFENSOR PUBLICO

Vítima AS

Juiz: ROSA ELENA SILVEROL



PROCESSO Nº 024.12.006620-4



S E N T E N Ç A



Vistos etc...



O Ministério Público ofereceu denúncia em desfavor de V. M. J., qualificado nos autos, imputando-lhe a prática dos crimes previstos nos arts. 33, caput, da Lei 11.343/06 e art. 244-B, da Lei 8.069/90, na forma do art. 70, do Código Penal.



Narra a denúncia que:



“[...] no dia 10 de fevereiro de 2012, por volta das 22 horas e 30 minutos, no beco 05, bairro Ilha do Príncipe, Vitória – ES, o denunciado V. forneceu drogas conhecidas como crack e cocaína (auto de apreensão de fls. 15 e auto de constatação provisório de substância tóxica de fls. 06) a uma adolescente, quando foi visto por Policiais Militares.



Emerge dos autos que Policiais Militares, se dirigiram ao mencionado local, por ser conhecido como onde há imenso tráfico de drogas, pararam em um terreno baldio e ficaram observando a movimentação, escondidos por um muro.



Consta que os Policiais viram o momento em que o denunciado V. forneceu treze pedras da droga conhecida como crack à adolescente Jennifer e esta lhe entregou a quantia de noventa reais em dinheiro, oportunidade em que os abordaram, procederam a busca pessoal e apreenderam a droga em poder da adolescente e o dinheiro em poder do denunciado V., conforme auto de apreensão de fls. 15. [...]”



No Inquérito Policial, iniciado por auto de prisão em flagrante, constam: declarações; Auto de Constatação Provisória de Substância Tóxica (fls. 06); Auto de Apreensão de 12 (doze) pedras de substância similar a crack, 01 (um) papelote de substância similar a cocaína e a quantia de R$ 165,00 (cento e sessenta e cinco reais) em espécie (fls. 15); Boletim Unificado (fls. 18/19); decisão convertendo a prisão em flagrante em preventiva (fls. 47/49).



Oferecida a denúncia (fls. 02), foram determinadas a notificação do acusado para os fins do art. 55 da Lei 11.343/06, a destruição das drogas apreendidas, bem como a requisição dos Laudos Toxicológico, de Lesões Corporais e de Exame Clínico, mantida a prisão cautelar (fls. 04).



Certidão com registro em desfavor do acusado do processo nº 024.110.162.971, desta 4ª Vara Criminal, que o condenou à pena de dois anos e seis meses de reclusão, substituída por prestação de serviços à comunidade (fls. 03 e 36).



Laudo de Exame de Lesões Corporais do acusado (fls. 11).



Notificado (fls. 12v.), o acusado apresentou defesa preliminar (fls. 21/28).



Laudo de Exame Químico (fls. 17/19).



A denúncia foi recebida em 17/05/2012 (fls. 30/31) e o acusado citado pessoalmente (fls. 37v.).



Realizada a audiência de instrução e julgamento, o acusado foi interrogado e ouvida 01 (uma) testemunha arrolada pelo Ministério Público e 01 (uma) arrolada pela defesa. O Ministério Público apresentou alegações finais orais, requerendo a condenação do acusado nas iras do art. 33, caput, c/c art. 40, inc. VI, ambos da Lei 11.343/06, com a incidência da agravante de pena da reincidência (fls. 38/40 e 54/60).



A defesa apresentou alegações finais na forma de memoriais, discorrendo de forma pormenorizada acerca das provas existentes nos autos, aduzindo que existem contradições entre elas. Que o depoimento do único policial ouvido em Juízo não é firme o suficiente para a condenação do acusado no tráfico de drogas e, por isso, deve ser aplicado o princípio do In Dubio Pro Reo (fls. 64/71).



É o breve relatório. Fundamento e decido.



Finalizada a instrução, o Ministério Público apresentou alegações finais requerendo a condenação do acusado nas iras do art. 33, caput, com a incidência da causa de aumento do art. 40, inc. VI, da Lei 11.343/06, além da agravante da reincidência.



A defesa, por sua vez, requereu absolvição do acusado com supedâneo no princípio do In Dubio Pro Reo, sustentando que as provas produzidas nos autos não são suficientes à ensejar o édito condenatório pretendido pelo Ministério Público.



A materialidade do tráfico de drogas encontra-se demonstrada no Inquérito Policial pelos Autos de Apreensão (fls. 15), de Constatação Provisória de Substância Tóxica (fls. 06) e de Exame Químico (fls. 17/19), onde os Senhores Peritos atestaram que as substâncias apreendidas contêm benzoilmetilecgonina, conhecida como crack.



Quanto à autoria, vejamos:



Ao ser ouvido pela autoridade policial, o acusado V. negou os fatos, dizendo que os noventa reais que trazia consigo lhe foram entregues pela mãe (fls. 04, do IP). Em Juízo, o acusado V. deu a mesma versão. Vejamos (fls. 39/40):



“[...] foi preso perto de sua casa; não conhece a adolescente J. e não viu quando a polícia a apreendeu; estava com R$ 90,00 que sua mãe havia lhe dado para passar o carnaval; não viu apreensão de drogas nesse dia; não sofreu nenhum constrangimento quando prestou depoimento na polícia; confirma o depoimento prestado na fase policial, constante de fls. 04 do IP e esclarece que já viu J. algumas vezes no bairro. […] na ocasião que foi preso estava indo para o carnaval do Sambão do Povo, local onde vários de seus amigos e conhecidos também se encontravam. [...]” (grifei).



Em poder do acusado V., foram apreendidos somente os noventa reais em dinheiro e nada mais, conforme consta do Auto de Apreensão nº 264/2012 (fls. 15, do IP).



Às fls. 61 foi juntada declaração firmada pela genitora do acusado, R. C. M., afirmando que havia dado ao acusado a quantia de noventa reais para ele ir ao carnaval, pois é trabalhador, não é traficante e estava prestando serviços em uma peixaria na Vila Rubim.



A testemunha B. C. R., que acompanhava o acusado no momento da abordagem e prisão, não foi ouvida pela autoridade policial, não se sabe porquê, como ressaltado pela defesa. Ouvida em Juízo, declarou o seguinte (fls. 59/60):



“[...] na época dos fatos trabalhava como motoboy; no dia dos fatos tinha acabado de sair da casa de seu irmão e se dirigia ao ponto da Vila Rubim, objetivando ir para a sua casa; encontrou com o acusado na descida do beco da Rua Jurema Barroso; no momento que desciam juntos o beco, foram abordados por uma guarnição da policia; logo após ser abordado o depoente foi liberado, mas não sabe dizer porque o acusado V. ficou preso, podendo afirmar, com certeza, que os dois foram abordados juntos e na mesma ocasião, mas revistados por policias diferentes; apenas o depoente e o acusado estavam andando em conjunto; primeiramente ocorreu a abordagem dos adolescentes logo após foi efetuada a abordagem em relação ao depoente e o acusado; conhece somente uma adolescente moreninha de vista; não tem relacionamento com nenhuma das adolescentes; não viu o acusado portando nenhuma droga; o acusado falou ao depoente que estava indo para o carnaval; o acusado estava de calça jeans e camisa, com roupa normal; o depoente não foi conduzido ao DPJ sendo liberado no mesmo instante da abordagem; presenciou a abordagem em relação ao acusado; conhece o acusado há vários anos; sabe que a mãe do acusado é dona de casa e seu pai pedreiro; não pode afirmar se a mãe do acusado também trabalhava como diarista; o beco onde ocorreu a abordagem é pouco iluminado; não se recorda de quantos policiais era formada a guarnição, podendo somente afirmar que eram mais de dois policiais. […] entre a abordagem do depoente e do acusado e a abordagem das adolescentes, ocorreu um intervalo de dez a quinze segundos, pois foi tudo muito rápido; as primeiras a serem revistadas foram as adolescentes que estavam a uma distância de quatro a cinco metros do depoente e do acusado e depois dessa revista é que o depoente e acusado foram revistados; o depoente não foi colocado junto com as adolescentes para a revista; tem conhecimento que o acusado já foi condenado e cumpriu pena por tráfico de drogas.[...]” (grifei)



No local onde foi feita a abordagem, encontravam-se duas adolescentes, também não ouvidas em Juízo. É certo que as provas indiciárias não têm o mesmo valor probatório daquelas produzidas em Juízo. Apesar disso, em homenagem à busca da verdade real, creio ser interessante transcrever os depoimentos das adolescentes. Vejamos:



“... afirma ser usuária de crack há seis meses, informando que na noite de sexta-feira, dia 10/02/2012, por volta das 22 horas, encontrava no bairro Ilha do Príncipe, e no momento em que foi abordada por policiais militares estava andando na companhia de mais três meninas do bairro, e após ter sido revistada foi encontrada escondido em seu bolso da bermuda 12 pedras de crack e 01 papelote de cocaína; que segundo esclarece que o dinheiro apreendido, oitenta reais, era de sua amiga B., e noventa reais, do seu amigo V. M. J.. Que no momento em que foi “enquadrada” pela polícia militar, tinha outras pessoas próximo à declarante, as quais foram dispensadas, ficando apreendida a declarante, que tem 14 anos de idade, e B., também tem 14 anos de idade. Que a droga apreendida pertence à declarante, sendo que B. e V. não levavam drogas consigo; que a declarante não recebeu das mãos de V. drogas e dinheiro, e não entregou dinheiro a V.; que a adolescente infratora nega o fato de ter vendido pedras de crack para a pessoa que encontra-se detida de nome V. M. J..” (declarações da adolescente J. S., fls. 16, do IP).



“... na noite de sexta-feira, dia 10/02/2012, por volta das 22 horas, encontrava no bairro estava andando na companhia de mais três meninas do bairro, , e após ter sido revistada nada foi encontrado; que ao revistarem J., no bolso da bermuda dela foi encontrado 12 pedras de crack e 01 papelote de cocaína; que segundo esclarece que o dinheiro apreendido, oitenta reais, era seu, e noventa reais, do seu amigo V. M. J.. Que no momento em que foi “enquadrada” pela polícia militar, tinha outras pessoas próximo a declarante, as quais foram dispensadas, ficando apreendida a declarante, que tem 14 anos de idade, e J., que também tem 14 anos de idade. Que a droga apreendida pertence a J., sendo que a declarante e V. não levava drogas consigo; que não é verdade que J. entregou dinheiro a V..” (declarações da adolescente B. C. S., fls. 17, do IP).



A negativa de autoria do acusado V. tem apoio nas declarações prestadas pela testemunha presencial, B. C., ouvida sob o princípio do contraditório e da ampla defesa. De igual teor, são as informações prestadas pelas duas adolescentes que estavam em companhia do acusado V. no momento da abordagem.



Ditas provas me convenceram que as drogas apreendidas encontravam-se no bolso da adolescente J.. Não existe contradição quanto à isso.



A acusação está sustentada única e exclusivamente no depoimento prestado pelo policial militar J. J. O. J., única testemunha ouvida a requerimento do Ministério Público. Em Juízo, referido policial declarou o seguinte (fls. 57/58):



“[...] reconhece o acusado e se recorda dos fatos; estava em patrulhamento de rotina e se dirigiram ao local narrado na denúncia que é conhecido pelo tráfico de drogas; viram grande movimentação de pessoas no local e se esconderam em um terreno baldio para observação; o depoente presenciou quando a adolescente J., uma moreninha, que estava comercializando entorpecentes, se dirigir ao acusado e pegar drogas com ele, também presenciou J. entregando o dinheiro proveniente da venda de drogas para o acusado; além de J. havia outras duas ou três jovens no beco, parecendo que exerciam a função de "olheiras" mas nada de ilícito foi encontrando com elas, que também eram adolescentes; o acusado nunca havia sido abordado pelo depoente; quando houve a transação entre J. e o acusado a policia fez a abordagem, apreendendo a droga em poder de J. e o dinheiro com o acusado; não se recorda se o dinheiro estava em notas trocadas; no momento da abordagem o acusado e a adolescente tentaram despistar dizendo que não estavam cometendo tráfico mas tal situação ficou muito clara para a polícia diante do flagrante; confirma as declarações na fase policial, constante de fls. 02 do IP. […]se recorda que no momento o depoente viu um rapaz passando, salvo engano ele era namorado de uma das adolescentes, fez a abordagem ao tal rapaz mas nada de ilícito foi encontrado em seu poder; que as diligências foram feitas após às dez horas da noite, sendo que o beco onde os fatos aconteceram tinha uma iluminação um pouco fraca; não se recorda se o acusado estava trajando alguma fantasia de carnaval, mas acredita que não, mas se lembra que era noite de carnaval e havia desfile de escolas de samba no Sambão do Povo. […] o depoente estava do outro lado do muro de um terreno baldio, o acusado e as adolescentes estavam no beco, há uma distância de menos de dois metros e viu quando o acusado entregou alguma coisa para a adolescente J. e também viu quando ela entregou o dinheiro ao acusado, mas só foram constatar que era droga, quando abordaram a J. e encontraram as pedras de crack que estavam guardadas no bolso da bermuda que ela usava; e viu quando ela guardou as drogas no bolso da bermuda; dada a curta distância que o depoente encontrava-se das pessoas envolvidas não tinha como não ter certeza do que ocorreu [...]”



É bem verdade que os depoimentos de policiais nos processos criminais são prestigiados pela doutrina e jurisprudência. No entanto, tal prova deve ser analisada à luz das demais produzidas nos autos, uma vez que a simples condição de policial não traz garantia se ser o mesmo considerado infalível em suas ações, especialmente naquelas decorrentes da sua função, exercida, quase sempre, em situação de intenso estresse.



Segundo o policial militar JOEL JOSÉ, o local onde aconteceram os fatos era um beco com iluminação um pouco fraca. Ao mesmo tempo em que disse ter presenciado J. “...se dirigir ao acusado e pegar drogas com ele, também presenciou J. entregando o dinheiro proveniente da venda de drogas para o acusado...” , disse ainda, no mesmo momento em que foi ouvido em Juízo, que “... viu quando o acusado entregou alguma coisa para a adolescente J. e também viu quando ela entregou o dinheiro ao acusado, mas só foram constatar que era droga, quando abordaram J. e encontraram as pedras de crack que estavam guardadas no bolso da bermuda...”.



Como já dito, apesar da credibilidade que deve ser dada ao depoimento de policiais, as declarações prestadas por um único policial ouvido judicialmente neste processo, não são firmes, incontroversas e indenes de dúvidas para sustentar a condenação do acusado V., pois a prova baseada neste depoimento é frágil quanto à autoria. Condenação anterior do réu não interfere nas provas de autoria e materialidade de processo posterior.



É certo que existe uma probabilidade de que os fatos ocorreram como sustentado pelo Ministério Público. Entretanto, no processo criminal tudo deve ser cabalmente provado, sem nenhuma sombra de dúvida, os fatos devem ser realmente esclarecidos, em todos os seus detalhes e circunstâncias, nada pode ser presumido.



Não ausência de certeza quanto à acusação, vigora o princípio do in dubio pro reo.



Acerca da hipótese, o renomado mestre Guilherme de Souza Nucci, na obra Código de Processo Penal Comentado, 7ª edição, pág. 672, recomenda:



“Prova insuficiente para a condenação: é outra consagração do princípio da prevalência do interesse do réu – in dubio pro reo. Se o juiz não possui provas sólidas para a formação do seu convencimento, sem poder indicá-las na fundamentação da sua sentença, o melhor caminho é a absolvição.”



E assim concluo porque o Código de Processo Penal adota o sistema do livre convencimento motivado do juiz, exceto nos crimes sujeitos ao Tribunal do Júri.



Uma vez que não estou plenamente convencida que o acusado V. estava comercializando drogas ilícitas no momento em que foi abordado e preso, acolho as razões expendidas pela douta defesa porque, como já dito, a dúvida deve sempre beneficiar o réu. Vejamos:



EMENTA: APELAÇÃO CRIMINAL - TRÁFICO DE DROGAS - MATERIALIDADE COMPROVADA - AUTORIA DUVIDOSA - PROVA INSUFICIENTE - ALEGAÇÃO DE INOCÊNCIA PELO APELADO - DEPOIMENTO DE POLICIAIS - INCONCLUSIVOS - DÚVIDA RAZOÁVEL ACERCA DA PROPRIEDADE DO ENTORPECENTE - MEROS INDÍCIOS PARA CONDENAÇÃO - INSUFICIENTE - SENTENÇA ABSOLUTÓRIA - MANUTENÇÃO - APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DO IN DUBIO PRO REO - RECURSO DESPROVIDO. 1. Em que pese a materialidade do delito restar comprovada, a autoria se mostra duvidosa, diante dos inconclusivos depoimentos prestados pelas testemunhas arroladas pela acusação e da negativa apresentada pelo apelado e pelo menor que o acompanhava. 2. Muito embora existam sérios indícios da ocorrência do delito, o mesmo não se pode afirmar no que concerne à autoria, tendo em vista que o conjunto probatório se mostra precário em se a droga ¿dispensada¿ da motocicleta pertencia exclusivamente ao apelado ou se este tinha conhecimento de que o menor que o acompanhava a portava. 3. No Processo Penal vigora o princípio segundo o qual, para alicerçar um decreto condenatório, a prova deve ser clara, positiva e indiscutível, não bastando a mera possibilidade acerca do delito e da autoria fundada em indícios. 4. Sendo a prova insuficiente para a demonstração do crime, pois não permite o contexto probatório esclarecer se o réu praticou, ou não, a atividade ilícita, deve militar em seu favor o princípio do in dubio pro reo. 5. Recurso a que se nega provimento.1



DISPOSITIVO



EM FACE DO EXPOSTO, JULGO IMPROCEDENTE A PRETENSÃO PUNITIVA ESTATAL para ABSOLVER o acusado V. M. J., qualificado nos autos, na forma do art. 386, inc. VII, do Código de Processo Penal, da imputações que lhe são feitas neste processo.



Expeça-se, imediatamente, ALVARÁ DE SOLTURA.



AUTORIZO a devolução de R$ 90,00 ao V., mediante termo. Os valores apreendidos em poder da B., se depositados à disposição deste Juízo, deverão ser transferidos ao Juízo da Vara da Infância e Juventude.



Sem custas. Após o trânsito em julgado, PROCEDAM-SE às comunicações e ARQUIVEM-SE.



P.R.I.-se.



Vitória, 15 de agosto de 2012



1 TJES, Classe: Apelação Criminal, 11110058358, Relator : SÉRGIO BIZZOTTO PESSOA DE MENDONÇA, Órgão julgador: PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL, Data de Julgamento: 27/06/2012, Data da Publicação no Diário: 05/07/2012.