terça-feira, 31 de março de 2015

Juiz Sérgio Moro rasga a Constituição e queima a Convenção Americana



Publicado por Luiz Flávio Gomes - 8 horas atrás
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Juiz Srgio Moro rasga a Constituio e queima a Conveno Americana
Devagar com o andor porque o santo é de barro. O juiz de primeiro grau da Operação Lava Jato Sérgio Moro e Antônio César Bochenek (Presidente da Associação dos Juízes Federais) acabam de rasgar publicamente a Constituição brasileira, queimando, ao mesmo tempo, tal como fazia a Inquisição católica contra as “bruxas” nos séculos XV-XVIII, a Convenção AMERICANA de Direitos Humanos. A proposta surreal deles é a seguinte: “atribuir à sentença condenatória de primeiro grau, para crimes graves em concreto (sic), como grandes desvios de dinheiro público (sic), uma eficácia imediata, independentemente do cabimento de recursos” (Estadão 29/3/15). Fiquei arrepiado e de cabelo em pé com a descabelada e inoportuna ideia, gritantemente inconstitucional e inconvencional.
Tudo levava a crer que com a Operação Lava Jato o Brasil fosse passado a limpo, dentro da legalidade. Forjamos a esperança de que surgiriam, depois do devido processo, outros “bandidos quadrilheiros da república” (expressão usada no julgamento do mensalão por ministros do STF). Mas mirando bem de perto algumas das ideias disparatadas defendidas por Sérgio Moro, invadiu-me o pressentimento de que ele não oferece nenhuma garantia para a nação de que todo seu hercúleo trabalho esteja sendo feito dentro das regras do Estado de Direito. A continuar com ideias tão alopradas, ele pode se transformar na mesma decepção gerada pela seleção brasileira de 2014.
Estou com a sensação de que se encontram em fogo brando novas travessuras como as das Operações Castelo de Areia e Satiagraha, que foram declaradas nulas pela Justiça, deixando na impunidade criminosos de colarinho branco altamente perniciosos para os interesses nacionais. A ideia de estabelecer a prisão como regra (sic), logo após a sentença de primeiro grau (como se o juiz fosse Deus e não errasse), viola a Constituição brasileira (a presunção de inocência) e preocupantemente restabelece o espírito fascista do Código de Processo Penal de 1941, redigido durante o Estado Novo de Getúlio Vargas.
A milenar Inquisição inteiramente reformatada com o Malleus Maleficarum de 1487 (obra dos padres Krämer e Sprenger) já saiu do ordenamento jurídico brasileiro, mas muitos juízes e doutrinadores não saíram de dentro dela. A forma mentis inquisitiva está impregnada nas almas de ideias torquemadas, em pleno século XXI. Umberto Eco, com toda razão, disse que ainda não acertamos todas as nossas contas com a Idade Média. Nada mais verídico e entristecedor.
Para além de inconstitucional, a ideia aventada é flagrantemente inconvencional porque viola tanto a Convenção AMERICANA de Direitos Humanos (art. 8º) como a jurisprudência consolidada da Corte Interamericana, que asseguram a presunção de inocência em dois graus de jurisdição, só permitindo a prisão imediata de forma excepcionalíssima e quando presente um motivo concreto cautelar (réu ameaçando testemunhas, por exemplo). A proposta da Ajufe, subscrita por Sérgio Moro, ademais, viola a regra da “vedação de retrocesso” (conhecida como efeito cliquet). O direito da liberdade não pode retroceder. Era autoritário e despótico em 1941 e tudo isso virou pó com a CF de 88 e reformas legislativas posteriores, secundadas pela jurisprudência do STF. Todo esse avanço, sob pena de flagrante inconvencionalidade, não pode mais recuar.
Mais ainda: esse conjunto normativo internacional que garante a presunção da inocência assim como a regra da liberdade em dois graus de jurisdição conta com força supralegal (STF, RE 466.343-SP). Logo, qualquer lei em sentido contrário não teria nenhuma eficácia no Brasil. Seria tão infértil quanto um monge virtuoso. As leis somente são válidas quando apresentam dupla compatibilidade vertical: com a CF e com o ordenamento jurídico do sistema interamericano. Os bandidos do colarinho branco devem ser rigorosamente punidos pelas suas pilhagens ao patrimônio público, mas tudo deve seguir rigorosamente as regras do Estado de Direito, sob pena de a Operação Lava Jato morrer na praia (frustrando o desejo nacional de passar o Brasil a limpo).
Confira também a entrevista para a Tv Estadão:

Juristas comentam propostas de endurecimento do Processo Penal

TV Estadão | 30.03.2015
Luiz Flávio Gomes e José Amado divergem sobre proposição da Associação dos Juízes Federais sobre o tema
Luiz Flávio Gomes
Professor
Jurista e professor. Fundador da Rede de Ensino LFG. Diretor-presidente do Instituto Avante Brasil. Foi Promotor de Justiça (1980 a 1983), Juiz de Direito (1983 a 1998) e Advogado (1999 a 2001). [ assessoria de comunicação e imprensa +55 11 991697674 [agenda de palestras e entrevistas] ]

PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA - OAB vai contra prisão antes de fim de processo, defendida por Sergio Moro

O Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil discorda da sugestão do juiz federal Sergio Fernando Moro, responsável pelo inquérito da operação "lava jato", de que condenados em primeira instância por crimes como lavagem e desvio de dinheiro público aguardem na prisão o julgamento de recursos. A opinião de Moro foi exposta em artigo publicado nesse domingo (29/3) no jornal O Estado de S. Paulo.
Em abril de 2014, o Conselho Pleno da OAB aprovou por unanimidade o posicionamento da entidade, que entende ser inconstitucional alguém ser preso antes de se esgotarem as possibilidades de defesa, inclusive as fases recursais.
Para a OAB, qualquer proposta que vá nesse sentido atinge a presunção de inocência, uma cláusula pétrea da Constituição Federal, que, em seu artigo 5º, inciso 57, afirma que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”. Por se tratar de cláusula pétrea, o texto não pode ser modificado nem por Emenda Constitucional.
Em abril de 2014, o conselheiro federal Francisco Eduardo Torres Esgaib teve seu voto acolhido por unanimidade pelo Conselho Pleno da OAB Nacional. No relatório, o advogado afirma que propostas em sentido contrário padecem “do vício de inconstitucionalidade material, ao mitigar o princípio constitucional da presunção de inocência, cláusula pétrea inserida no inciso LVII do artigo 5º da Constituição Federal que garante o direito da não culpabilidade, até o trânsito em julgado da sentença penal”.

quinta-feira, 26 de março de 2015

E o juiz decretou a prisão marcando um "X"! Sentença ou quiz show?

Circula nas redes — vi no Facebook do Aury Lopes Jr. — uma decisão de um juiz de direito apaguei o seu nome a Comarca, porque o que interesse é o fenômeno e não a pessoa  em que ele decreta a prisão preventiva em um formulário padrão, em que as alternativas de “fundamentação” (as aspas indicam ironia, ok?) são os dizeres do artigo 312 do CPP. Ei-la:
E ele tascou um X nas alternativas garantia da ordem publica e assegurar a aplicação da lei penal. Simples assim. Não há referência a um caso concreto específico. Há um formulário que fala de um tipo de crime. Incrível. Trata-se da ontoteologização do direito. O juiz achou o que os filósofos procuram há dois mil anos: o “ser em geral”. A substância de todos os crimes. A essência da prisão preventiva. Sabendo-se a essência, sabe-se tudo. Trata-se de algo como se passa na Novela do Curioso Impertinente, de Cervantes, em que o personagem Anselmo procura a essência de fidelidade.
Quando li essa decisão fiquei pensando em fugir para as montanhas. Pindorama é assim. Quando se cava um buraco e se chega lá embaixo, o que encontramos? Marque um X na alternativa “uma pá” para cavar mais fundo. E acertou. Pergunto-me: o que está acontecendo com o Direito em terrae brasilis? A estandardização e a literatura prêt-à-porter, prêt-à-parler e prêt-à-penser levou os juristas a esse patamar? Tenho a certeza que sim. Minhas perguntas são retóricas.
O que vale a liberdade de uma pessoa? Pode ela ser perdida por prisão preventiva marcada por um X, sem qualquer fundamentação ou referência ao fato concreto, como se fosse um quiz show? Juízes não tem responsabilidade política? Então a aplicação da lei virou isso? Aliás, agora me dou conta de que não faltou inspiração ao juiz.  Na Polícia Civil em vários Estados já existe o mesmo tipo de formulário para pedir as medidas protetivas da Lei Maria da Penha! Na Justiça do Trabalho a maioria dos pedidos também é apresentada em formulários. E se a ideia pega, poderíamos transformar tudo em formulário. O promotor marca um X no artigo violado! Para que descrever conduta típica? Para que fundamentar a decisão? Assim a justiça fica mais rápida alguns dirão, como se esse fosse o objetivo do Estado Democrático de Direito! Sim, sei que a decisão essa é de 2011. Não importa. Nem sei se esse procedimento era praxe. De todo modo, não está “prescrito” o episódio. O que importa, aqui, é discutir o simbólico. Com ele  o simbólico  podemos capturar o imaginário de determinados juristas.   
Essa nem o leitor que se assina Prætor e que critica todas as minhas colunas poderá defender (aliás, fico imaginando às quintas-feiras de manhã: Prætor levanta tremendo, emocionado... abre a ConJur e tasca seu comentário, em uma espécie de gozo fundamental; sem o Prætor, Senso Incomum não seria o que é!). E não sou só eu que penso assim! Registre-se o comentário bem-humorado do comentarista Alexandre Carvalho Simões (Advogado Autônomo - Criminal) na coluna do dia 19/03 (Abstraindo, é claro, o encaminhamento que dá ao meu segundo modelo de juiz):
“Praetor me fez lembrar de um versículo da bíblia: Saulo, Saulo porque me persegues? Todo mundo sabe que Saulo se tornou Paulo e que Paulo foi o maior apóstolo de Cristo. Assim será o Praetor, o maior apóstolo de Lenio Streck. Dizem que amor e ódio andam de mãos dadas... [...]”.
Destarte, se haverá a conversão do nosso Prætor, não sei. Mas pela fama que já alcança nosso interlocutor, esperamos a edição de um “(des)compreender direito: comentários críticos à coluna senso incomum”.  Talvez me force à tréplica, com um “Verdade e Implicância”.
Sigo. E para dizer que é despiciendo falar mais sobre essa “decisão” (Novamente entre aspas. Lembrem-se, decisão não é escolha que se resolve marcando X!). O que quero começar, agora, é uma nova cruzada. No NCPC conseguimos — lembrem-se que sofro de LEER  tirar o livre convencimento (emenda minha), introduzir a obrigação de decisão por coerência e integridade (artigo 926 por sugestão minha também) e o dever de fundamentação detalhada, como os leitores sabem muito bem, bastando, para tanto, ver as edições anteriores da ConJur para tomar conhecimento da luta que tivemos (este escriba, Dierle, Fredie, Alexandre Camara, Alexandre Morais da Rosa, André Karam, Georges Abboud, Eduardo Arruda Alvim, Rafael Tomas de Oliveira, entre outros).
Agora será a vez do Código de Processo Penal. Não me parece razoável que o novo CPP que está sendo gestado no Congresso preveja o poder de livre apreciação da prova. Eis a luta. Também do CPP teremos que expungir essa anomalia a-paradigmática. E teremos que colocar no CPP o dever de fundamentação, com a obrigação de, além de coerência e integridade, o juiz enfrentar todas as teses levantadas pelas partes. Já pensaram se aplicássemos a obrigação de coerência e integridade para o caso do juiz em liça?
Isso tudo para evitar que decisões como a do referido magistrado se repitam. Sabemos que hoje todos os tribunais dos Estados da nossa federação condenam acusados de furto, estelionato e trafico de entorpecentes lançando mão da inversão do ônus da prova. Isso jamais aconteceria se tivéssemos um CPP similar ao NCPC.
Na verdade, faço uma penitência: não precisaríamos colocar nada disso nos códigos se cumpríssemos a Constituição. O dever de fundamentação na Europa é um direito inalienável. É um direito humano fundamental. Aqui virou mercadoria de quiz show. Aqui virou caricatura. Sim, porque inverter o ônus da prova é retroceder séculos no direito. É retornar às ordálias. Você é culpado até provar o contrário. Ou seja, pegue este ferro quente na mão. Se não lhe queimar, é inocente. Bingo. Binguíssimo.
A etapa II da guerra contra o solipsismo! O novo CPP!
Por tudo isso, inicio hoje a etapa II da guerra contra o solipsismo em Pindorama. No início, minha luta era olhada de soslaio. Ah, lá vem o Lenio Streck falando contra o solipsismo. Que palavra seria essa? Alguns riam. Pois é: a palavra solipsista vem do alemão Selbsüchtiger, que quer dizer “viciado em si mesmo”. Sim, a realidade para o sujeito solipsista existe só a partir do ele, viciado em si, pensa.  Eis o dilema do jurista contemporâneo. No século XIX, no positivismo clássico, o jurista era viciado na lei (a lei era tudo; previa todas as hipóteses de aplicação). Era o século da razão, em que o direito pretendeu aprisionar a complexidade social em leis (França), conceitos (Alemanha) e precedentes (Inglaterra). Bingo. Saltamos para o século da vontade. Só que nunca conseguimos controlar essa vontade. E viramos viciados em nós mesmos. De um vício passamos a outro. Quase pior. É como saltar do personagem Angelo I para o Angelo II, da peça Medida por Medida, de Shakespeare.  Solipsismo é algo como crack gnosiológico. Basta experimentar uma vez e não larga mais. Eis o que aconteceu no direito.
Daí a nossa luta. Daí a minha cruzada. As inscrições estão abertas para cerrarmos fileiras nessa batalha. Se antes se olhava de soslaio minha luta, agora já começam a murmurar pelos quatro cantos. Oiço cousas como “poxa: de fato o NCPC tirou fora a palavra livre na questão do convencimento”. “— Então se o legislador tirou...é porque de fato quis”! E eu acrescento: É porque entendeu que, de fato, como defendo há muito tempo, o livre convencimento não se dá bem com a nossa Constituição. E a obrigação de coerência e integridade complementa essa alteração paradigmática.
Vai depender de nós. Da doutrina. Que, insisto mais uma vez, está na hora de voltar a doutrinar. Parar de ficar caudatária de decisões tribunalícias. A doutrina deve constranger os tribunais a decidir corretamente, e não o contrário, ou seja, doutrinar com base nas decisões proferidas. Temos de implementar o NCPC. E lutar para alterar o projeto do CPP. Sim. Lá está. Eu vi. Em pleno século XXI, até agora o legislador está mantendo o poder de livre apreciação da prova. E, o pior: com advogados participando da Comissão de redação do NCPP. Será que eles não sabem o que é sentir na carne o poder da livre apreciação? Hein? Será que eles imaginam uma sentença como a comentada nesta coluna? Cartas para a coluna.
fonte - CONJUR

quarta-feira, 25 de março de 2015

"Gritar fora Dilma é fácil, difícil é gritar fora Castello Branco"

O direito fundamental à liberdade de expressão, notadamente assegurado pelo Texto Constitucional, permite movimentos da sociedade como aos que assistimos no dia 15 de março de 2015, em que uma fatia significativa da sociedade ocupou as ruas dos principais centros do país para manifestar e protestar.
O mesmo direito que permitiu os protestos em diversas cidades do Brasil, permitiu, em outros tempos, a chamada marcha da maconha, em que manifestantes organizaram-se para defender publicamente a liberação dessa substância. Não se faz aqui juízo de VALOR sobre as propriedades medicinais ou psicotrópicas da conhecida erva.
Muito se falou, à época das marchas, que a manifestação popular representava uma incitação ao crime, capitulando-a nas hipóteses dos artigos 286 (incitação ao crime) e 287 (apologia ao crime) do Código Penal, sob o argumento de que não haveria liberdade alguma, tampouco de expressão, quando se defendesse a prática de alguma ilegalidade e, no caso, a maconha é classificada como um entorpecente.
Instado a se manifestar, por força da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 187, o Supremo Tribunal Federal entendeu por garantir duas liberdades individuais revestidas de caráter fundamental: O direito de reunião e o direito à livre expressão de pensamento.
Sob a perspectiva do direito de liberdade de expressão, acertadamente o Supremo Tribunal Federal entendeu que, a despeito de a maconha constituir efetivamente uma droga ilícita, dado que incluída na relação de entorpecentes, a manifestação que ocupou as ruas buscava contrapor esse entendimento majoritário, sustentando a descriminalização dessa droga. Vale dizer que a garantia da contraposição das minorias às maiorias representa efetivamente a ideia democrática da liberdade de expressão.
A propósito, Hans Kelsen dizia que “a vontade da comunidade, numa democracia, é sempre criada através da discussão contínua entre a maioria e a minoria, através da livre consideração de argumentos a favor e contra certa regulamentação de uma matéria.”
Considerou-se, portanto, inexistirem, de um lado, os elementos típicos dos artigos 286 e 287 do CPB, vez que a hipótese revelava o exercício de um direito de reunião e de manifestação de pensamento.
Vale transcrever excerto da ementa:
A LIBERDADE DE EXPRESSÃO COMO UM DOS MAIS PRECIOSOS PRIVILÉGIOS DOS CIDADÃOS EM UMA REPÚBLICA FUNDADA EM BASES DEMOCRÁTICAS – O DIREITO À LIVRE MANIFESTAÇÃO DO PENSAMENTO: NÚCLEO DE QUE SE IRRADIAM OS DIREITO DE CRÍTICA, DE PROTESTO, DE DISCORDÂNCIA E DE LIVRE CIRCULAÇÃO DE IDEIAS – ABOLIÇÃO PENAL (ABOLITIO CRIMINIS) DE DETERMINADAS CONDUTAS PUNÍVES – DEBATE QUE NÃO SE CONFUNDE COM INCITAÇÃO À PRÁTICA DE DELITO NEM SE IDENTIFICA COM APOLOGIA DE FATO CRIMINOSO – DISCUSSÃO QUE DEVE SER REALIZADA DE FORMA RACIONAL, COM RESPEITO ENTRE INTERLOCUTORES E SEM POSSIBILIDADE LEGÍTIMA DE REPRESSÃO ESTATAL, AINDA QUE AS IDEIAS PROPOSTAS POSSAM SER CONSIDERADAS, PELA MAIORIA, ESTRANHAS, INSUPORTÁVEIS, EXTRAVAGANTES, AUDACIOSAS OU INACEITÁVEIS.
Novamente estamos diante de manifestações deflagradas nas ruas do Brasil e podemos perceber uma profusão de reivindicações. Melhoria do ensino, melhores condições na saúde, na segurança pública, solicitação de apear da cadeira do planalto a presidente da República, mediante o procedimento de impeachment, entre outros tantos pedidos, que, se de um lado causam incômodo a diversos setores (jurídico, político, econômico, financeiro...), de outro constituem a voz de grande parte da população (maioria ou minoria).
Nenhuma ilegalidade há nisso, muito pelo contrário, trata-se efetivamente da consagração de um Estado Democrático de Direito, tendo em vista que as manifestações transcorrem dentro de um estado legal.
Mas, no meio das manifestações, eis que aparecem algumas faixas requisitando intervenção militar. Bem, podemos sustentar que a reivindicação, feita por uma, duas, três pessoas, ou quantas sejam, quer expressar a preocupação com a situação política do país e que, na visão dessa minoria, seria necessária a aplicação do artigo 142 da Constituição Federal[1].
A Lei Complementar 97, de 9 de junho de 1999, regulamentando o artigo supracitado, estabelece que as Forças Armadas se submetem ao Ministério do Estado e da Defesa, órgão do poder Executivo sob o comando da Presidente da República.
Dito isto, podemos concluir que os pedidos de intervenção militar — sob a perspectiva acima — constituem livre manifestação de pensamento, pois há um grupo minoritário de pessoas que entende, por mais chocante, insuportável, desagradável a ideia, ainda que sob o argumento de que as instituições políticas brasileiras estão de alguma forma comprometidas em razão de atos de corrupção que pululam no noticiário, ser necessário que a presidência da República convoque as Forças Militares para restabelecerem a ordem.
Portanto, essa intervenção constitucional, ainda que também absolutamente desnecessária no plano democrático, ocorrerá de acordo com as diretrizes baixadas em ato da presidência da república[2].
No entanto, como se estabeleceria o direito fundamental da livre manifestação de pensamento se a proposta tivesse a finalidade de produção de um golpe militar?
A ideia aqui não é apresentar as razões retrógradas ou mesmo estapafúrdias daqueles que defendem a ideia de a nação ser novamente controlada por forças autoritárias. A questão é saber se a defesa pública dessa corrente está inserida no direito fundamental da livre manifestação de pensamento.
Pensamos que não!
Qualquer manifestação em defesa de um golpe militar viola a forma política de como o estado brasileiro deve representar os VALORES de sua nação. O artigo 1º da Constituição Federal assegura que o país é um Estado Democrático de Direito.
Um Estado Democrático a significar que o governo é formado pelos cidadãos, em que os representantes são escolhidos livremente pelo voto. Estado de Direito que impõe estruturas estatais pautadas pelos critérios do Direito, e não pelas da força, da prepotência ou do arbítrio[3].
A ideia de intervenção militar como golpe constitui ruptura ao plano jurídico social existente, com rompimento das garantias dos direitos fundamentais, sociais e políticos. Significa dizer que o povo, titular do poder num Estado Democrático, renuncia o controle de sua vida, oferecendo-a ao poder autoritário.
Não se discute, portanto, uma ponderação de VALORES constitucionais, em que, em determinada hipótese, um se sobrepõe a outro; mas sim ruptura da própria ordem democrática.
Manifestar apoio à ruptura do Estado Democrático de Direito é efetivamente romper com o modelo de Estado que a atual sociedade, depois de anos de luta, deve preservar; é, portanto, ato de profunda lesa-pátria.
Como dizia Rui Barbosa, "a liberdade não entra no patrimônio particular, como as coisas que estão no comércio, que se dão, trocam, vendem, ou compram: é um verdadeiro condomínio social; todos o desfrutam, sem que ninguém, o possa alienar; e, se o indivíduo, degenerado, a repudia, a comunhão, vigilante, a reivindica".

[1] CF 142. As Forças Armadas constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica, são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, soba a autoridade suprema do Presidente da República, e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem.
[2] Art. 15, § 2º, da Lei Complementar nº 97, de 1999
[3] Cf. Jairo Gomes Leal. Princípios de direito eleitoral. São Paulo: Atlas, 2011

terça-feira, 24 de março de 2015

O que fazer em caso de crimes cometidos pelo WhatsApp?

O WhatsApp é um dos mais populares aplicativos no Brasil. Cresceu ao integrar o celular à comunicação via Internet, de forma gratuita. Não se justifica mais o envio de torpedos SMS pagos se é possível se comunicar com maior eficiência em uma interface gratuita. Além disso, o aplicativo permite o envio de conteúdo multimídia, áudio e vídeo e a criação de grupos. A aplicação diz ter 38 milhões de usuários no Brasil. 430 milhões de usuário no mundo.
A qualquer cidadão, com um pacote mínimo de dados, é permitido se valer dos benefícios do mensageiro. Porém, tal aplicação, hoje de responsabilidade do provedor de serviços Facebook, vem sendo utilizada como plataforma para a prática de crimes eletrônicos, nomeadamente, compartilhamento de conteúdo ofensivo, ameaçador, difamatório e envolvendo crimes de intolerância e pornografia infantil.
Graças a possibilidade de criação de grupos, usuários podem criar “grupos fechados” e adicionar somente quem desejar. Quem é adicionado não recebe um convite mas entra de imediato, devendo deixar o grupo caso não se sinta confortável. E se o grupo compartilha conteúdo ilegal? Seu nome pode ser listado como um participante, mesmo não tendo aceitado convite algum.
Diante da vingança pornô, ou da cópia indevida de fotos e vídeos íntimos, privados ou de cunho sexual envolvendo uma pessoa, era comum a criação de blogs anônimos, perfis ou páginas em redes sociais divulgando o conteúdo que “caiu na rede”. De posse da “URL” ou do link específico da postagem (com a numeração do usuário (id), página ou postagem) era possível mover ação para identificação da pessoa por trás da ofensa, bem como para remoção do conteúdo.
Porém, no Whatsapp, vítimas de crimes na Internet sofrem com um agravante: a mensagem com conteúdo inverídico corre de celular para celular, ponto a ponto, ou é postada em grupos que sequer a vitima faz parte ou conhece, sendo que muitas vezes não tem como especificar o “local” em que o conteúdo foi compartilhado, dentro do serviço, quanto mais precisar “qual” telefone realizou a postagem inicial.
Os tempos são outros. Se antes a vítima comparecia à polícia ou a um escritório de advocacia com cópias das postagens, hoje comparece informando que “ouviu dizer” que em algum no lugar no WhatsApp suas fotos ou vídeos em situação íntima estão circulando.
E o cenário se ultraja, pois com a Lei 12.965/2014, o Marco Civil da Internet, nos termos do seu art. 21, o provedor deverá indisponibilizar, tão logo notificado extrajudicialmente, o conteúdo envolvendo imagens, vídeos ou outros materiais contendo cenas de nudez ou de atos sexuais de caráter privado em relação a vítima, sob pena de ser responsabilizado. Por outro lado, esta notificação deverá ter elementos que permitam a identificação específica do material apontado como violador da intimidade. Mas como identificar?
Neste contexto, algumas orientações e procedimentos simples podem auxiliar aqueles que tiveram problemas com o uso indevido do WhatsApp para a divulgação de conteúdo íntimo:
1. Converse com quem viu a mensagem ou que participa do grupo referido e verifique se podem transmitir o conteúdo ou ao menos indicar os nomes dos grupos, nomes ou números telefônicos das pessoas responsáveis pelo conteúdo ofensivo; Lembrando que se conseguir entrar no grupo, só verá as mensagens posteriores ao ingresso;
2. Tenha em mente que o nome que aparece em um contato pode ser fantasiado, então, busque pelo número de telefone utilizado pelas mensagens; Embora com certeza usuários e grupos tenham um “ID” na aplicação, ao contrário de outras redes sociais, tal dado não é exibível ao público;
3. Se algum amigo recebeu o conteúdo, ele pode fazer um backup da conversa e remeter para um e-mail ou mesmo lhe remeter o conteúdo; Se algum conhecido é participante do grupo, ele pode extrair uma lista de todos os participantes;
4. Você não vai conseguir pesquisar por repositório de grupos na Internet e só consegue entrar em um grupo se te adicionarem – O que é bem diferente das redes sociais convencionais; Por outro lado, considere o Google na busca por pessoas mencionando o grupo no Whatsapp;
5. Uma pessoa pode estar cadastrada no Whatsapp com um numero que não mais detém ou (em casos específicos) de terceiros; Cuidado em tomar conclusões precipitadas. Converse com um perito digital; Jamais processe alguém por achismo ou presunção;
6. Registre todo o material envolvendo o conteúdo ofensivo, se necessário lavre uma ata notarial, onde um cartório irá constatar que acessando a aplicação pelo usuário x, na data e hora y, obteve acesso ao conteúdo ilegal;
7. É um erro processar a operadora de telefonia ou provedor de Internet para que forneça dados de um usuário do Whatsapp; Embora o WhatsApp atue com números telefônicos (como ID na aplicação), cada usuário faz um cadastro independente no sistema. O provedor de conexão deverá ser acionado após a vitima descobrir o Ip ou os dados do telefone do responsável;
8. No pedido de dados de acesso a aplicação, solicite também os números telefônicos cadastrados e o IMEI (número de série do equipamento) (O WhatsApp registra esta informação);
9. De posse dos dados cadastrais do responsável pela publicação do conteúdo (após fornecimento dos dados pelo provedor de conexão ou telefonia), pode ser o caso da determinação judicial de uma busca e apreensão do equipamento celular para verificar se o conteúdo lá se encontra, podendo os chats serem recuperados mesmo após a exclusão;
10. Ordem judicial específica poderá requerer o extrato das comunicações feitas de um usuário WhatsApp para outro.
Com estas orientações e medidas a vítima minimizará a dificuldade de apuração da autoria de um crime virtual cometido na plataforma, lembrando que, embora o WhatsApp declare em seus termos que está sob a Lei da Califórnia, ao tratar informações de brasileiros, deve oferecer foro no Brasil para resolução de litígios e principalmente, está obrigado, pelo Marco Civil da Internet, a guardar os registros de acesso a aplicação por 6 (seis) meses. Portanto, a vitima deve agir rapidamente.
Advogado e Perito em Informática.
Advogado, perito digital, vice-presidente da Comissão de Informática da OAB/SP. Professor da Escola Superior da Advocacia - ESA. Árbitro da CIAMTEC.br e Professor de Cursos Preparatórios.

terça-feira, 17 de março de 2015

Afinal, o que é família?

"Meio irmão; meio pai; meio filho; de quantas metades é feita a nova família?"

Perguntas como estas são cada vez mais comuns em debates de Direito de família e são utilizadas na chamada da nova novela da Rede Globo, "Sete Vidas", que estreou no último dia 9. A trama promete tratar de assuntos polêmicos e ainda pendentes de consolidação no ordenamento jurídico brasileiro.

Um dos assuntos a serem abordados será a possibilidade de se conhecer o doador de esperma, no caso da utilização do método de concepção através de banco de doadores. Este tema está cada vez mais em evidência, pois se tem agora a primeira geração de crianças concebidas através de técnicas que utilizam material genético doado, em idade a questionar suas origens. A discussão é trazida pelos meios de comunicação – como está fazendo a Rede Globo – e pela indústria do cinema, conforme se verifica, por exemplo, no filme de 2014 intitulado "Delivery man" (cujo título, no Brasil, é "De Repente Pai").

A concepção através de material doado é utilizada a fim de atender uma necessidade biológica do casal que passa por dificuldades na concepção de um filho. A legislação brasileira aceita esta prática e a defende, uma vez que a CF incentiva o planejamento familiar, sendo a prática disciplinada na resolução 1358/92 do Conselho Federal de Medicina, a qual prevê a impossibilidade de fins lucrativos e que "os doadores não devem conhecer a identidade dos receptores e vice-versa" (art. 2, IV).

No caso de inseminação artificial heteróloga – quando o doador do esperma for uma terceira pessoa – a filiação é presumida desde que haja autorização do marido ou companheiro (art. 1597, V, CC). Tem-se o reconhecimento da filiação sócio afetiva, sendo pai aquele que assistiu a criança desde o seu nascimento. O doador não pode ser considerado pai da criança para os fins de direito. Está correto, portanto, o jargão popular sendo o qual "pai é quem cria".

A regra no Brasil é a de que o doador deve permanecer anônimo, sendo que sua identidade não deve ser conhecida sob qualquer hipótese. Destaca-se, apenas, a possibilidade do médico ter acesso às informações em determinados casos. O anonimato do doador é garantido também no artigo 7º da Declaração Internacional do Genoma Humano.

Por outro lado, a Convenção Internacional do Direito da Criança preza o melhor interesse do menor. Assim como no Estatuto da Criança e do Adolescente (lei 8.069/90), o interesse da criança deve prevalecer, sendo lícito ao infante conhecer suas origens genéticas, se assim desejar. Assim, cria-se o grande impasse sobre o tema. Qual o interesse que deve prevalecer? O da criança em conhecer seu pai biológico ou o do doador, em ter sua identidade preservada?

Tramita atualmente na Câmara dos deputados o PL 115/15, que busca disciplinar as técnicas de reprodução humana assistida. Seu texto protege o anonimato do doador, sendo que sua identidade apenas pode ser revelada em casos específicos. Na busca do equilíbrio entre o interesse da criança e o direito ao anonimato do doador, deve-se também se preservar a segurança jurídica dos pais que criaram aquela criança. A Carta Magna preza pela vontade de se criar uma família, sendo que este desejo inexiste no doador. Não se pode afirmar que pelo fato de se ter uma ligação biológica o doador é pai da criança, afinal ele não pode ter a obrigação de assumir as crianças que vierem a ser concebidas.

Outro ponto importantíssimo é o reconhecimento de vínculo entre crianças geradas de material genético de um único doador. Biologicamente, essas crianças possuem material genético comum, mas essa relação deve ter consequências jurídicas? Essa questão se torna ainda mais delicada ao adentrarmos nas consequências no campo das sucessões. Dificilmente haverá e será reconhecida uma ligação passível de consequências jurídicas entre doador e criança gerada pelos métodos de inseminação heteróloga. O mencionado PL busca afastar qualquer vínculo de filiação nestes casos - Nenhum vínculo de filiação será estabelecido entre o ser concebido com material genético doado e o respectivo doador, ainda que a identidade deste venha a ser revelada nas hipóteses previstas no artigo 19 deste Estatuto (artigo 48), e ainda "(...)não será estabelecido o vínculo de filiação e não decorrerá qualquer direito pessoal ou patrimonial ou dever oriundo do vínculo paterno-filial" (art. 50 §único). Salvo qualquer mudança na legislação, a criança gerada por inseminação artificial heteróloga terá direitos apenas em relação à sua mãe e ao pai sócio afetivo, o qual consentiu com a técnica médica e registrou a criança, sendo considerado pai da criança para todos os fins, mesmo que seu vínculo com a mãe acabe. Mas e a questão dos meio-irmãos? Pode este vínculo ser reconhecido pelo direito? Crianças de um mesmo doador devem ser consideradas irmãs aos olhos do direito ou este é um vínculo meramente biológico?

O CC prevê, no caso de sucessão, que os irmãos serão herdeiros caso inexistam ascendentes ou descendentes vivos do de cujus. O artigo 1.841 trata de como se dará a herança no caso de concorrência de irmãos bilaterais (de pai e mãe) com irmãos unilaterais (apenas de pai ou de mãe). Se uma dessas crianças geradas a partir de material genético doado vier a falecer não deixando outros herdeiros, podem estes chamados meio-irmãos virem a ser seus herdeiros? É possível que estas relações sejam transportadas também para o campo do direito sucessório? Parece razoável que seja seguida a mesma linha do doador, não se reconhecendo vínculo jurídico entre estas crianças.

Existem sites que auxiliam na busca do doador ou de possíveis meios-irmãos, como é o caso do donorsiblingregistry.com. Páginas eletrônicas como essa, no entanto, não quebram o sigilo existente do doador com as clínicas. É necessário um cadastro voluntário tanto da criança gerada como do doador. A busca é feita por pessoas que sentem necessidade de conhecer suas origens, por razões muitas vezes psicológicas. Quando há êxito neste encontro, surge uma nova relação, a qual pode trazer consequências às relações familiares. O direito deve caminhar a fim de disciplinar e reconhecer estas relações; no entanto, não pode gerar insegurança jurídica aos casais que se utilizam das novas técnicas da medicina para constituir família. Deve haver sempre um equilíbrio entre o interesse da criança, do doador e também daquele que utilizou a técnica. Estamos diante de uma possível redefinição do conceito de família, como o próprio site mencionado afirma "The DSR is helping to redefine the meaning of Family". Cabe aos juristas acompanharem estas novas relações, a fim de atenderem os interesses de todos os envolvidos.

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*Tamara Zugman Knopfholz é advogada do escritório Domingues Sociedade de Advogados e pós-graduada em Direito Civil pela PUC/PR.

segunda-feira, 16 de março de 2015

NOVAS REGRAS PARA TELECOMUNICAÇÃO

O deputado Chico Lopes (PCdoB-CE) anunciou, em discurso no plenário da Câmara, que começou a vigorar, a partir desta terça-feira (10), as novas regras do Regulamento Geral de Direitos do Consumidor dos Serviços de Telecomunicações. Segundo o novo código, o cliente pode cancelar automaticamente seu plano pela Internet e a rescisão do contrato deve ser processada no site da operadora sem a intervenção de um atendente.  
Agência Câmara
Chico Lopes anuncia novas regras para telecomunicação 
O deputado Chico Lopes destacou que em caso de descumprimento das regras o consumidor deve denunciar a operadora à Anatel. 
As operadoras também devem disponibilizar, em seus sites, uma área com informações, como o perfil de consumo, a cópia do contrato e os boletos de cobrança do plano assinado. Gravações com as solicitações do consumidor devem ser mantidas por, no mínimo, 90 dias e também podem ser acessadas no site. Essa área poderá ser acessada mediante login e senha, que devem ser informados no ato da compra do plano.

Para o deputado, eleito esta semana o primeiro vice-presidente da Comissão de Defesa do Consumidor da Câmara, “essa é mais uma conquista dos consumidores e mais um avanço nosso em defesa do consumidor, em prol daqueles que precisam desse serviço.”

O parlamentar destacou que “essa é uma medida que vem da luta dos militantes, dos que defendem os consumidores”, acrescentando que o serviço de telefonia no Brasil é um dos piores do mundo, além de ser um dos mais caros.

E cobrou da agência reguladora, a Agência Nacional de Telecomunicação (Anatel), que fiscalize e puna, com multa pesada, as operadoras que atuam no país, “para que respeitem, acima de tudo, o consumidor que paga a conta e cobra os seus direitos. As operadoras têm obrigação de cumprir os seus deveres”, enfatiza o parlamentar.

Deveres das operadoras

De acordo com o Regulamento Geral de Direitos do Consumidor dos Serviços de Telecomunicações, as operadoras devem disponibilizar ao consumidor os documentos de cobrança dos últimos seis meses, relatório detalhado dos serviços prestados no período, mecanismo de comparação de planos de serviços e ofertas promocionais, além de histórico de demandas no último semestre. As operadoras devem ainda oferecer na Internet um mecanismo de comparação de planos de serviços e ofertas promocionais.

Pelas novas regras, sempre que o consumidor questionar o valor ou o motivo de uma cobrança, a empresa terá 30 dias para resposta, senão terá de automaticamente corrigir a fatura (caso ela não tenha sido paga), ou devolver em dobro o valor questionado (caso a fatura tenha sido paga). O consumidor pode questionar faturas com até três anos de emissão.

As operadoras não podem enviar mensagens de cunho publicitário, a não ser que o consumidor autorize previamente Além do acesso à integralidade da oferta, o cliente deve receber um sumário claro com destaque às cláusulas restritivas e limitadoras no ato da contratação;

O deputado Chico Lopes destacou ainda que “em caso de descumprimento das regras o consumidor deve denunciar a operadora à Anatel.”

Do Portal Vermelho
De Brasília, Márcia Xavier 

quarta-feira, 11 de março de 2015

Liminar, tutela antecipada, tutela provisória, tutela definitiva, tutela cautelar, tutela satisfativa. Como distinguir?

Todos sabemos que há diferentes espécies de tutela. Saber distingui-las é fundamental, não só para concursos como para o trabalho diário com o Direito. A seguir, estão os pontos distintivos, seguidos de exemplos que muito ajudarão a compreender o tema.
Tutela definitiva – Há tutela definitiva quando o órgão julgador decide a respeito do que foi pedido pela parte. O vocábulo pedido, aqui, é utilizado no sentido técnico e, por isso, abrange apenas a postulação que integra o mérito da causa. Ao prestar a tutela definitiva o órgão julgador decide a questão principal do processo.
Observem, a seguir, exemplos de tutela definitiva:
1 - na sentença, o pedido é acolhido para que seja imposta ao réu a obrigação de pagar ao autor o valor que o autor entende que lhe é devido a título de indenização (tutela definitiva satisfativa – CPC, art. 269, I);
2 – na sentença, o pedido formulado pelo autor é rejeitado (tutela definitiva satisfativa– CPC, art. 269, I);
3 – por sentença, é indeferida liminarmente a petição inicial em razão da pronúncia de prescrição ou de decadência (tutela definitiva satisfativa – CPC, arts. 269, I, e 295, IV); e
4 – num processo cautelar antecedente a um processo de conhecimento, é deferido, na sentença, o pedido formulado pelo autor, de adoção de medidas de arresto ou de sequestro (tutela definitiva cautelar – CPC, arts. 817 e 823).
Bem se vê, pois, que a tutela definitiva tanto pode ser satisfativa como pode ser cautelar.
Tutela provisória – Há tutela provisória quando o órgão julgador antecipa os efeitos da tutela definitiva (não importando se a tutela definitiva é satisfativa ou cautelar), bem como quando o órgão julgador, num processo sem natureza cautelar, determina, no curso do procedimento, a adoção de uma medida de natureza cautelar (CPC, art. 273,§ 7º). A tutela provisória, seja ela satisfativa, seja cautelar, será substituída pela tutela definitiva.
Vejamos quatro exemplos de tutela provisória:
1 - num processo em que o pedido principal é o de que seja determinado o fornecimento de uma certidão negativa, o juiz ordena, de imediato, antes do proferimento da sentença, o fornecimento da certidão negativa (tutela provisória satisfativa – CPC, art. 461, § 3º);
2 – num processo em que o pedido principal é o de realização de um arresto (um processo cautelar, portanto), o juiz, antes da sentença, determina que o arresto seja realizado (tutela provisória cautelar – CPC, arts. 814/816);
3 - num processo de conhecimento (sem natureza cautelar, portanto) em que o autor pede que seja imposta ao réu a obrigação de lhe entregar determinada coisa, o juiz ordena, no curso do procedimento, o sequestro da coisa a ser futuramente entregue (tutela provisória cautelar – CPC, arts. 273, § 7º, e 822); e
4 - num processo em que o autor pede que seja imposta ao réu a obrigação de lhe pagar uma quantia em dinheiro, o juiz defere, no curso do procedimento, a adoção de uma medida de arresto (tutela provisória cautelar – CPC, arts. 273, § 7º, e 814/816).
Assim, tal qual acontece com a tutela definitiva, a tutela provisória tanto pode ter natureza satisfativa como natureza cautelar.
Tutela antecipada – Quando a tutela provisória é do tipo que antecipa, total ou parcialmente, exatamente os mesmos efeitos da tutela definitiva, diz-se que se trata de uma tutela antecipada. Neste sentido estrito, a tutela antecipada é espécie de tutela provisória. Aquele que pretende obter uma tutela antecipada quer que, antes do momento em que será concedida a tutela definitiva, lhe seja dado acesso, total ou parcialmente, ao mesmo bem da vida que é objeto do pedido principal. Esta tutela, por ser provisória, será, depois, substituída, no mesmo processo, pela tutela definitiva.
Muitos autores chegam a afirmar que tutela antecipada e tutela provisória são a mesma coisa. Quem assim pensa, usa a expressão tutela antecipada de forma mais abrangente. Neste ponto, vale considerar que somente pode ser antecipado o que foi pedido ao final. E como a tutela provisória pode ter natureza distinta da tutela definitiva (CPC, art. 273§ 7º), nos casos em que isto acontecer, não estará sendo concedida, no sentido estrito, uma tutela antecipada.
Para facilitar a fixação, vamos sacar, dos exemplos dados anteriormente, dois exemplos de tutela antecipada:
1 - num processo em que o pedido principal é o de que seja determinado o fornecimento de uma certidão negativa, o juiz ordena, de imediato, antes do proferimento da sentença, o fornecimento da certidão desejada (tutela antecipada satisfativa – CPC, art. 461, § 3º);
2 - num processo em que o pedido principal é o de realização de um arresto (um processo cautelar, portanto), o juiz, antes da sentença, determina que o arresto seja realizado (tutela antecipada cautelar – CPC, arts. 814/816).
A tutela antecipada, como espécie que é da tutela provisória, pode, obviamente, ter natureza satisfativa ou cautelar, a depender de a tutela definitiva que está sendo antecipada ser satisfativa ou ser cautelar.
Tutela satisfativa – Há tutela satisfativa quando o órgão julgador certifica a existência ou a inexistência de um direito (processo de conhecimento) ou efetiva um direito previamente certificado (processo de execução), bem como quando ele concede, provisoriamente, acesso ao bem da vida objeto da disputa (tutela antecipada em processo de conhecimento ou de execução).
Assim, tratando-se de processo de conhecimento ou de execução, a tutela definitiva tem natureza satisfativa. Assim como tem natureza satisfativa a tutela antecipada que vier a ser concedida em qualquer dos dois tipos de processo.
Percebam que o adjetivo satisfativa, ao qualificar a tutela, não indica que a pretensão deduzida pelo autor tenha sido satisfeita e que, portanto, o autor tem razão. Não. A satisfatividade está relacionada à apreciação, com resultado positivo ou negativo, do pleito formulado.
Dentre os exemplos dados anteriormente, alguns são claramente de tutela satisfativa:
1 - na sentença, o pedido é acolhido para que seja imposta ao réu a obrigação de pagar ao autor o valor que o autor entende que lhe é devido a título de indenização (tutela definitiva satisfativa – CPC, art. 269, I);
2 – na sentença, o pedido formulado pelo autor é rejeitado (tutela definitiva satisfativa– CPC, art. 269, I);
3 – por sentença, é indeferida liminarmente a petição inicial em razão da pronúncia de prescrição ou de decadência (tutela definitiva satisfativa – CPC, arts. 269, I, e 295, IV); e
4 - num processo em que o pedido principal é o de que seja determinado o fornecimento de uma certidão negativa, o juiz ordena, de imediato, antes do proferimento da sentença, o fornecimento da certidão desejada (tutela provisória satisfativa – CPC, art. 461, § 3º).
Tutela cautelar – Há tutela cautelar quando o órgão julgador adota uma providência para conservar determinada situação, resguardando-a dos efeitos maléficos do tempo, sem que, com isto, esteja permitindo o acesso ao bem da vida objeto da disputa. Por meio da tutela cautelar, assegura-se a conservação do direito afirmado, de modo a que, depois, a decisão por meio da qual vier a ser concedida a tutela satisfativa possa produzir todos os seus efeitos.
O arresto e o sequestro (CPC, arts. 813/821 e 822/825) são exemplos bem evidentes de tutela cautelar. Observem que, no caso do arresto, o bem arrestado servirá para garantir o futuro cumprimento de uma obrigação de dar dinheiro. Com ele, o credor não tem acesso ao dinheiro. O mesmo ocorre com o sequestro: o seu objetivo é preservar a coisa a ser entregue. E mesmo que uma das partes fique como depositária do bem arrestado ou sequestrado, ela, na qualidade de depositária, estará atuando como auxiliar da justiça, e não como titular de direito sobre o bem.
Vamos agora identificar, dentre os exemplos anteriormente dados, aqueles em que há tutela cautelar:
1 - num processo em que o autor pede que seja imposta ao réu a obrigação de lhe pagar uma quantia em dinheiro (um processo de conhecimento, portanto), o juiz defere, no curso do procedimento, a adoção de uma medida de arresto (tutelaprovisória cautelar – CPC, arts. 273, § 7º, e 814/816);
2 - num processo de conhecimento (sem natureza cautelar, portanto) em que o autor pede que seja imposta ao réu a obrigação de lhe entregar determinada coisa, o juiz ordena, no curso do procedimento, o sequestro da coisa a ser futuramente entregue (tutela provisória cautelar – CPC, arts. 273, § 7º, e 822);
3 – num processo cautelar antecedente, é deferido, na sentença, o pedido formulado pelo autor, de adoção de medidas de arresto ou de sequestro (tutela definitiva cautelar– CPC, arts. 817 e 823); e
4 – num processo em que o pedido principal é o de realização de um arresto ou de um sequestro (um processo cautelar, portanto), o juiz, antes da sentença, determina que o arresto ou o sequestro seja realizado (tutela provisória cautelar – CPC, arts. 814/816 ).
Liminar – Uma decisão judicial qualquer – não importa se provisória ou definitiva, ou se cautelar ou satisfativa – será uma decisão liminar quando proferida no limiar, no início da instalação de um determinado quadro processual. Observem: não necessariamente no início do processo, mas no início de uma determinada fase ou mesmo de um certo momento processual.
O vocábulo liminar, pois, está atrelado ao momento em que a decisão é proferida. Nesta linha, até uma sentença pode ser proferida liminarmente, se o caso for, por exemplo, de indeferimento da petição inicial (CPC, art. 295), de improcedência prima facie do pedido (CPC, art. 285-A) ou de rejeição liminar dos embargos opostos a uma execução fundada em título extrajudicial (CPC, art. 739). Do mesmo modo, o relator pode, liminarmente, converter o agravo por instrumento em agravo retido (CPC, art.527II, e seu parágrafo único).
Comumente, na vida forense, há uma tendência, equivocada, para confundir tutela provisória com tutela liminar, como se fossem a mesma coisa. Não são.
Basta lembrar que, como já vimos, há possibilidade de a tutela definitiva ser concedida liminarmente (ex.: por sentença, é indeferida liminarmente a petição inicial em razão da pronúncia de prescrição ou de decadência – CPC, arts. 269I, e 295, IV).
Ao lado disso, a tutela provisória pode ser concedida por meio de uma decisão proferida liminarmente ou não. É só imaginar que há situações em que o juiz resolve ouvir primeiro a parte contrária para somente depois decidir a respeito do pleito de concessão de uma tutela provisória. A decisão que ele proferir depois de apresentada a defesa será uma decisão por meio da qual ele concederá uma tutela provisória, mas não será uma decisão liminar. Porém, se o juiz conceder a tutela provisória sem sequer ouvir a parte contrária, estaremos diante de uma tutela provisória concedida liminarmente.