segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Falta de data em promissória não impede execução


A boa-fé do credor e a função social do contrato nortearam uma decisão recente sobre a exigibilidade de nota promissória sem data de emissão. Nas palavras do juiz substituto Carlos Henrique Abrão, da 37ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, “a mera irregularidade pautada na falta de datação do título não invalida sua condição de exigibilidade”. Ou seja, notas promissórias sem data de emissão não são nulas. Clique aqui para ler o voto.
No caso concreto, o título foi emitido como garantia pelo empréstimo de um veículo. A indicação da data na nota promissória é um de seus requisitos. Parte da doutrina afirma que o dia de emissão é apenas um requisito acidental. É a visão de que não há nulidade apenas pela ausência da data. O juiz, relator designado do caso, adotou essa corrente para embasar seu voto. Segundo ele, para que seja exigível, basta “existir expresso e inserido no título o aspecto do vencimento para minimizar qualquer irregularidade ou impossibilidade de cobrança”.
O assunto é tratado no caput do artigo 889 do Código Civil, de forma taxativa: “deve o título de crédito conter a data de emissão, a indicação precisa dos direitos que confere, e a assinatura do emitente”. A exigência possui três finalidades: atestar a capacidade do emitente e sua livre manifestação de vontade — requisitos essenciais da formação contratual —, fazer constar o vencimento do título e proteger terceiros.
Como explica o juiz, ao descartar a necessidade, “a cambial exigida não tem qualquer ressalva em relação ao emitente, ato jurídico perfeito, de livre manifestação de vontade e pessoa capaz, não houve lesão a terceiros, e mais, seu vencimento consta registrado”. Por isso, ele afirma que “a tese da nulidade cambial desprovida de data de emissão não pode, sinceramente, prevalecer diante dos elementos probatórios examinados”.
No mesmo sentido, João Eunápio Borges, escreve em seu livro Títulos de Crédito (Forense) que “toda obrigação tem, necessariamente, uma data, que é aquela em que se constitui, mas a declaração desta data não é indispensável à validade da letra de câmbio”.
A Súmula 387, do Supremo Tribunal Federal, prevê a possibilidade de complementação dos dados antes da cobrança ou do protesto. “A cambial emitida ou aceita com omissões, ou em branco, pode ser completada pelo credor de boa-fé antes da cobrança ou do protesto”, diz o enunciado.
Segundo o juiz, “não pode mero formalismo que presidia a criação do título ao tempo da Lei de Genebra, no início do século XX, em pleno modelo de economia globalizada, constituir-se em empecilho e nulidade da promissória, simples irregularidade, a qual, cotejada com as demais circunstâncias, favorece o credor”.
E mais: “A evolução do direito empresarial incorpora o meio eletrônico, quando milhares de títulos circulam, em impressão, livres de papéis, com os requisitos mínimos, e, por analogia, a cambial, consubstanciada na promissória, não pode ser descaracterizada”.

sábado, 29 de outubro de 2011

STF diminui pena de condenado por roubo e extorsão


Quando há extorsão seguida de roubo, na mesma ação, aplica-se o artigo 70 do Código Penal, que descreve o concurso formal. Isso quer dizer que, como os dois crimes foram cometidos em única ação, deve-se aplicar a mais grave das penas cabíveis, acrescida de um sexto até metade. Partindo dessa premissa, a 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal acompanhou o voto do ministro Marco Aurélio e diminuiu a pena de um homem que forçou a vítima a sacar dinheiro e a roubou.
"Os crimes foram cometidos contra o patrimônio e em um único acontecimento: a submissão da vítima à violência perpetrada. Assim, não se trata, no caso, de desígnios autônomos. Ainda que se pudesse entendê-los praticados em mais de uma ação, haveria a continuidade delitiva ante as condições de tempo, lugar e maneira de execução, chegando-se a acréscimo idêntico ao estabelecido para o concurso formal", escreveu o ministro na decisão.
No caso, um homem foi condenado, em primeira instância, a 20 anos de prisão em regime fechado por extorsão e roubo, em Niterói (RJ). De acordo com os autos, o homem, armado, forçou uma pessoa a ir ao caixa eletrônico, sacar R$ 260 e depois roubou seu relógio, cordão de ouro, talão de cheques e carteira de identidade.
Ele foi preso pela Polícia. Posteriormente, foi acusado apenas de extorsão (artigo 158, parágrafo 1º, do Código Penal) pelo Ministério Público Estadual. Nas alegações finais, a acusação acrescentou que o réu também havia cometido roubo (artigo 157, parágrafo 2º, incisos I e II, do Código Penal), e a condenação deveria ser pelos dois crimes.
O juiz entendeu ser um caso de concurso material de dois crimes, roubo e extorsão. Nessa situação, a condenação resulta da soma das penas pelos dois crimes. Para calcular a pena-base, a primeira instância observou os antecedentes criminais do acusado, o uso de arma para cometer o crime e estabeleceu a condenação em 20 anos de prisão.
Nos tribunais
A pena foi mantida pela segunda instância. A defesa entrou com um Habeas Corpus no Superior Tribunal de Justiça. Pediu que fosse afastado o concurso material e aplicado o concurso formal, e que a pena fosse reduzida, pois foi exagerada.
No STJ, a desembargadora convocada na época, Jane Silva, negou o pedido, em decisão monocrática. Afirmou que, para afastar o concurso material seria preciso reanalisar as provas, o que é vedado à Corte. Quanto ao exagero na pena, a ministra afirmou que o Habeas Corpus só seria aceito se o erro fosse aparente ou absurdo, o que não era o caso.
Insatisfeito, o réu foi ao Supremo. Além da aplicação do concurso formal, também pediu que a justificativa para a majoração da pena fosse revista. Diz a defesa que o juiz considerou como antecedentes criminais inquéritos policiais abertos contra o réu, mas cujos processos ainda não haviam transitado em julgado na época do cometimento do crime.
O ministro Marco Aurélio, relator do caso, concedeu parcialmente o pedido de HC. Ele disse que não podia mais analisar as causas para o aumento da pena. Quanto aos agravantes, considerou que foram usados “até em favor do réu”.
Já o pedido de aplicação do entendimento de concurso formal foi concedido. O ministro entendeu que ambos os crimes são da mesma espécie (descritos no Capítulo II do Título II do CP), e por isso deve ser aplicada uma pena única – no caso, a maior dos dois, acrescida de um sexto até metade.
O ministro fixou a pena em 11 anos e oito meses de reclusão em regime fechado e 93 dias-multa. O voto foi acompanhado pelos demais ministros da Turma.

sexta-feira, 28 de outubro de 2011

Exame de Ordem é constitucional, decide Supremo


Por unanimidade, o Supremo Tribunal Federal decidiu, nesta quarta-feira (26/10), que o Exame de Ordem é constitucional. De acordo com os ministros, a exigência de aprovação na prova aplicada pela Ordem dos Advogados do Brasil para que o bacharel em Direito possa se tornar advogado e exercer a profissão não fere o direito ao livre exercício do trabalho previsto na Constituição Federal.
Segundo a decisão, o Exame de Ordem é um instrumento correto para aferir a qualificação profissional e tem o propósito de garantir condições mínimas para o exercício da advocacia, além de proteger a sociedade. "Justiça é bem de primeira necessidade. Enquanto o bom advogado contribui para realização da Justiça, o mau advogado traz embaraços para toda a sociedade", afirmou o relator do processo, ministro Marco Aurélio.
Sobraram críticas à proliferação dos cursos de Direito de baixa qualidade no país e ao fato de que grande parte das faculdades vende sonhos, mas entrega pesadelos, como disse Marco Aurélio. "O crescimento exponencial dos bacharéis revela patologia denominada bacharelismo, assentada na crença de que o diploma de Direito dará um atestado de pedigree social ao respectivo portador", sustentou o ministro.
O relator do recurso entendeu que a lei pode limitar o acesso às profissões e ao seu exercício quando os riscos da atuação profissional são suportados pela sociedade. Ou seja, se o exercício de determinada profissão pode provocar danos a outras pessoas além do indivíduo que a pratica, a lei pode exigir requisitos e impor condições para o seu exercício. É o caso da advocacia.
Em um voto longo, o ministro Marco Aurélio rebateu todos os pontos atacados pelo bacharel em Direito João Antonio Volante, que recorreu ao STF contra decisão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, que julgou legítima a aplicação do Exame de Ordem pela OAB. O recurso foi infrutífero.
De acordo com o relator do recurso, o exercício de determinadas profissões ultrapassa os interesses do indivíduo que a exerce. Quando o risco da profissão é apenas do próprio profissional, como no caso dos mergulhadores, o Estado impõe reparação em dinheiro, com adicionais de insalubridade, por exemplo. Mas quando o risco pode determinar o destino de outras pessoas, como no caso dos médicos e dos engenheiros, cabe ao Estado limitar o acesso a essa profissão, impondo condições, desde que não sejam irrazoáveis ou inatingíveis.
As condições e qualificações servem para proteger a sociedade, disse Marco Aurélio. Segundo ele, é sob essa ótica que se deve enxergar a proteção constitucional à dignidade humana na discussão do Exame de Ordem. O argumento contrapõe a alegação do bacharel, de que a prova da OAB feria o direito fundamental ao trabalho. Logo, seria uma afronta à dignidade humana.
A alegação não surtiu efeito. "O perigo de dano decorrente da prática da advocacia sem conhecimento serve para justificar a restrição ao direito de exercício da profissão?", questionou Marco Aurélio. Ele mesmo respondeu: "A resposta é positiva."
Decisão unânime
Os outros oito ministros presentes no julgamento também decidiram que o Exame de Ordem vem ao encontro do que determina o inciso XIII do parágrafo 5º da Constituição: "É livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer." Para os ministros, o Estatuto da Advocacia atende exatamente ao comando constitucional.
Ao votar depois de Marco Aurélio, o ministro Luiz Fux afirmou que o Exame de Ordem é uma condição para o exercício da advocacia pela qual se verifica se o indivíduo tem qualificação técnica mínima para exercer a profissão. E que não conhece forma melhor para verificar essas qualificações. Não admitir a verificação prévia da qualificação profissional é como admitir "o arrombamento da fechadura para só depois lhe colocar o cadeado".
Fux, no entanto, fez críticas aos critérios de transparência da OAB. Para ele, a OAB tem de abrir o Exame para a fiscalização externa. Hoje, a Ordem aplica a prova e faz a fiscalização. De qualquer maneira, o ministro destacou que o Exame é baseado em critérios impessoais.
Depois de Fux, Toffoli votou acompanhando o ministro Marco Aurélio sem comentários. O voto foi comemorado como uma lição de racionalidade do julgamento. A ministra Cármen Lúcia, em seguida, fez pequenas considerações e também decidiu pela constitucionalidade do Exame de Ordem.
O ministro Ricardo Lewandowski, em seu voto, também destacou a "higidez e transparência do Exame de Ordem" que, segundo ele, é fundado em critérios impessoais e objetivos e garante aos candidatos o direito ao contraditório. Ou seja, assegura o direito de recurso.
Ao votar também em favor do Exame de Ordem, o ministro Ayres Britto fez um paralelo com a exigência de concurso para juízes. "Quem tem por profissão interpretar e aplicar a ordem jurídica deve estar preparado para isso. O mesmo raciocínio se aplica ao Exame de Ordem", disse. Os ministros Gilmar Mendes, Celso de Mello e o presidente do Supremo, ministro Cezar Peluso, completaram o julgamento que, por unanimidade, confirmou a constitucionalidade do Exame de Ordem.
Gilmar Mendes fez comentários com base em direito comparado e lembrou que em outros países também se sabe, de antemão, que o diploma é de bacharel em Direito e que para exercer a advocacia é necessário passar em testes de qualificação. Mas, como Luiz Fux, Mendes defendeu uma fiscalização maior para o Exame de Ordem. "É preciso que haja uma abertura para certo controle social do Exame para que ele cumpra sua função constitucional".
Para o ministro Celso de Mello, a exigência de Exame de Ordem é inerente ao processo de concretização das liberdades públicas. O decano do Supremo afirmou que a legitimidade da prova da OAB decorre, também, do fato de que direitos poderão ser frustrados se houver permissão para que "pessoas despojadas de qualificação e desprovidas de conhecimento técnico" exerçam a advocacia.
A sessão foi tranquila apesar do clima de animosidade entre bacharéis e dirigentes da Ordem. O presidente do Conselho Federal da OAB, Ophir Cavalcante Junior, foi levemente hostilizado em alguns momentos. Em um deles, no intervalo da sessão, quando foi abordado por um bacharel que reclamou do termo "imperícia" usado em sua sustentação oral. Ophir manteve-se tranquilo.
Quando o placar já apontava a constitucionalidade do Exame de Ordem, um bacharel se levantou e bradou: "Eu sou advogado". Os seguranças, então, retiraram o bacharel e outras dez pessoas do plenário que fizeram menção de se manifestar. Uma mulher retirada passou mal e foi atendida pelo serviço médico do Supremo. Alguns bacharéis choraram. Ao final da sessão, a segurança do STF estava alerta para qualquer nova manifestação, mas os bacharéis em plenário já estavam resignados.
O presidente nacional da Ordem dos Advogados do Brasil, Ophir Cavalcante, classificou como "uma vitória da cidadania brasileira" a decisão do STF. "Além de a advocacia ter sido contemplada com o reconhecimento de que a qualidade do ensino é fundamental na defesa do Estado Democrático de Direito, a cidadania é quem sai vitoriosa com essa decisão unânime do STF. Isso porque ela é a grande destinatária dos serviços prestados pelos advogados", afirmou Ophir ao conceder entrevista após as seis horas de julgamento da matéria em plenário.
Para Ophir, a constatação a que os nove ministros chegaram é a de que, em razão da baixa qualidade do ensino jurídico no país, o Exame de Ordem é fundamental tanto para incentivar os bacharéis a estudar mais quanto para forçar as instituições de ensino a melhorarem a formação oferecida. Segundo ele, quem mais ganha com isso é a sociedade.
Questionado no que a decisão do STF mudará o Exame de Ordem, o presidente da OAB afirmou que nada muda. No entanto, a decisão faz crescer a responsabilidade da entidade no sentido de trabalhar para aperfeiçoar a prova. "Trabalharemos mais para que o exame seja cada vez mais justo, capaz de aferir as condições técnicas e a capacitação daqueles que desejam ingressar na advocacia", finalizou.

terça-feira, 25 de outubro de 2011

“Os problemas não estão nos artigos da Constituição”

“Você não precisa de muitos heróis se você escolhe cuidadosamente”, disse John Hart Ely, célebre jurista norte-americano, para honrar a memória de Earl Warren, presidente da Suprema Corte dos Estados Unidos, nas décadas de 1950 e 1960. No Brasil, alegando falta de heróis, não nos envergonhamos de celebrizar todos os dias gente cuja maior contribuição à humanidade jamais ultrapassará as quatro linhas de um campo de futebol, ou os 15 minutos de fama que lhes confere a tela plana das televisões, ou dos computadores. Contudo, num país cuja história é, desde suas origens, protagonizada por personagens como Anchieta, Zumbi dos Palmares, Tiradentes, Ruy Barbosa, José Bonifácio, Machado de Assis, Oswaldo Cruz, Villa-Lobos, Irmã Dulce e Juscelino Kubitschek, talvez fosse o caso de escolhermos um pouco mais cuidadosamente os nossos ícones.
A propósito, 19 de outubro de 2011 há de ser lembrado, por todos os juristas que se comprometeram com o aperfeiçoamento democrático e com a concretização da Constituição de 1988, como o dia em que o famoso constitucionalista português José Joaquim Gomes Canotilho, um grande amigo do Brasil, cessa suas funções como professor catedrático da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra.
O notável professor edificou uma vida voltada ao estudo do Direito, onde o que mais ressalta é o compromisso permanentemente renovado com a dignidade da pessoa humana, com a consolidação da democracia e com a efetivação dos direitos fundamentais. Herdeiro da tradição iluminista, sempre confiante na capacidade do homem de conformar o próprio destino, Canotilho acabou tendo profunda influência no desenvolvimento do Direito Constitucional que se ensina nas Academias brasileiras e que tem aplicação em nossos tribunais. Divergindo de um antigo costume de intelectuais estrangeiros, entretanto, jamais ministrou conselhos, ou receitas, para os nossos problemas. Ao contrário, vezes sem conta, repetiu lá fora que via nos juristas brasileiros o que havia de mais criativo no estudo do Direito Constitucional e, comprovando essa admiração, dedicou a sua principal obra, Direito Constitucional e Teoria da Constituição, aos seus alunos brasileiros.
Nada mais adequado, pois, do que prestar uma justa homenagem ao professor Canotilho, precisamente, no momento em que a Constituição de 1988 se vê ameaçada por mal explicadas propostas de assembléias constituintes. A Constituição brasileira, no resumo do grande jurista português, “foi um grito de modernidade ouvido trinta anos depois da criação de Brasília, um estatuto de contraste com a ditadura da qual o país se libertou.” Mas a nossa Constituição, como qualquer outra, lembra o mestre português, não tem capacidade suficiente, só por si, para fazer transformações sociais. Portanto, “o desencanto que pode haver, embora se debite à Constituição, é, na verdade, com os agentes concretos da vida do país. Os problemas estão nas ruas do país, não nos artigos da Constituição”.
Talvez seja essa a lição menos compreendida do mestre português: a Constituição não cria o paraíso pelo simples fato de existir, pois, aqui, como no Fausto do Goethe, a vida e a liberdade não são dádivas atribuídas por qualquer governo, ou documento escrito, e só as fazem por merecer os povos que as tem de conquistar todos os dias.
Néviton Guedes é desembargador federal do TRF da 1ª Região e Doutor em Direito pela Universidade de Coimbra.

segunda-feira, 24 de outubro de 2011

Infiltração em apartamento pode gerar dano moral

POR: Daphinis Citti de Lauro

Uma das situações mais desagradáveis, para quem mora em condomínio, é a infiltração de água originada de outro apartamento, ocasionando manchas no teto e nas paredes, bolor nos armários, mau cheiro e até mesmo a impossibilidade de usar algumas partes de seu imóvel.

Infelizmente, em grande parte das vezes, o proprietário da unidade causadora hesita em mandar efetuar o conserto, porque naturalmente vai ter despesa, sujeira, pó etc.

Não raro, sem pesquisar, atribui a causa às áreas comuns do condomínio, como coluna, por exemplo, ou vai adiando a solução.

O problema é que, quanto mais tempo demorar para tomar alguma providência, maior será a sua despesa, pois além de ter que consertar o seu encanamento, ainda terá que deixar o apartamento de baixo no estado anterior ao vazamento, inclusive com pintura nova.

E, logicamente, é inaceitável causar incômodo ao outro morador e ficar de braços cruzados, ignorando o sofrimento, a angústia alheia.

É aconselhável que o morador vítima de vazamentos e infiltrações primeiramente tente resolver o problema de forma amigável. Caso não consiga, deve notificar o proprietário da unidade causadora, dando-lhe prazo para que conserte o vazamento.

E se mesmo assim não obtiver êxito, não há alternativa senão propor ação judicial, para que a parte causadora seja obrigada a mandar executar os consertos, sob pena de multa diária.

A boa notícia é que, além da indenização por dano material, a 9ª Câmara do Tribunal de Justiça de São Paulo, na Apelação 9195915-92.2004.8.26.0000, em que figurou como relator o desembargador dr. Antonio Vilenilson, em acórdão datado de 12 de julho de 2011, confirmou sentença do juiz de Primeira Instância, condenando também em dano moral.

Inicialmente o juiz havia arbitrado a indenização por danos morais em R$ 1.200. O Tribunal de Justiça elevou-a para R$ 10 mil levando em consideração o caráter pedagógico da indenização, uma vez que o problema se arrastou por vários anos e o autor da ação sofreu limitação do uso de seu apartamento.
A ementa do acórdão é a seguinte:

“Dano moral. Procedente. Infiltração originada do apartamento vizinho. Descaso da proprietária em resolver o problema. Atentando-se para o caráter pedagógico da indenização, acolhe-se recurso para aumentar a indenização”.

O Dano moral está previsto na Constituição Brasileira, no capítulo dos Direitos e Deveres Individuais e Coletivos. O artigo 5º diz que “Todossão iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:”

... “X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”.

Os danos materiais são aqueles avaliáveis em dinheiro. São os prejuízos patrimoniais, mais fáceis de serem quantificados.

Os danos morais, por sua vez, são os que causam sofrimento, abalo moral, constrangimento.

Para o grande jurista Pontes de Miranda, citado no livro “Dano Moral”, de José Antonio Remédio, José Fernando Seifarth de Freitas e José Júlio Lozano Júnior (Editora Saraiva, 2000), “nos danos morais a esfera ética da pessoa é que é ofendida; o dano não patrimonial é o que só atingindo o devedor como ser humano, não lhe atinge o patrimônio”.

E o grande problema é justamente a quantificação desse dano moral. Por essa razão, os valores de condenação em dano moral são bastante distintos.

Assim, o juiz aprecia caso a caso e também, como na decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo acima citada, leva em conta também o aspecto pedagógico, para que o causador do dano moral, aprenda e da próxima vez, se houver, considere melhor o problema.

domingo, 23 de outubro de 2011

CRÉDITO CONSIGNADO VIRA TEMA DE DECISÕES NO STJ

Crédito consignado cai no gosto do trabalhador e vira tema de decisões no STJ
 
A tentação está em cada esquina. São inúmeras as ofertas de empréstimo com desconto em folha, e as taxas de juros menores em razão da garantia do pagamento seduzem os trabalhadores. Segundo o Banco Central, o consignado responde por 60,4% do crédito pessoal. Ainda que os órgãos públicos monitorem a margem consignável para evitar o superendividamento dos servidores, é comum as dívidas acabarem comprometendo altas parcelas dos vencimentos.

No Superior Tribunal de Justiça (STJ), decisões sobre o empréstimo consignável formaram jurisprudência que busca proteger os trabalhadores, sem desrespeitar os contratos. Em fevereiro de 2011, a Terceira Turma decidiu que a soma mensal das prestações referentes às consignações facultativas ou voluntárias, como empréstimos e financiamentos, não pode ultrapassar o limite de 30% dos vencimentos do trabalhador (REsp 1.186.965). O recurso no STJ era de uma servidora pública gaúcha, contra um banco que aplicava percentual próximo dos 50%.
A ação foi movida pela servidora, que pediu a redução do teto do desconto. O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) rejeitou a tese, pois entendeu que o desconto era regular e que só deveria haver limitação quando a margem consignável fosse excedida. No STJ, a servidora invocou decisão do TJ de São Paulo, que limita o desconto a 30%.

Dignidade da pessoa

O relator, ministro Massami Uyeda, levou em consideração a natureza alimentar do salário e o princípio da razoabilidade, para atingir o equilíbrio entre os objetivos do contrato firmado e a dignidade da pessoa. Com isso, “impõe-se a preservação de parte suficiente dos vencimentos do trabalhador, capaz de suprir as suas necessidades e de sua família, referentes à alimentação, habitação, vestuário, higiene, transporte etc.”, completou.
A Lei 10.820/03 dispõe sobre a autorização para desconto de prestações em folha de pagamento dos empregados regidos pela CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) e o Decreto 6.386/08 regulamenta o artigo 45 da Lei 8.112/90, que trata da consignação em folha de pagamento dos servidores públicos. De acordo com o ministro, essas legislações determinam que a soma mensal das prestações destinadas a abater os empréstimos realizados não deve ultrapassar 30% dos vencimentos do trabalhador.

Fiscalização

Quando o desconto é na folha de pagamento do servidor público, a Segunda Turma do STJ entende que é cabível acionar o ente estatal para responder à ação. Foi o que decidiram os ministros no julgamento do recurso de uma pensionista do Exército, que buscava a redução da margem descontada em razão de empréstimo (REsp 1.113.576).

Para a relatora do recurso, ministra Eliana Calmon, “não obstante a concordância do mutuário na celebração do contrato de empréstimo com a instituição financeira, cabe ao órgão responsável pelo pagamento dos proventos dos pensionistas de militares fiscalizar os descontos em folha, como a cobrança de parcela de empréstimo bancário contraído, a fim de que o militar ou o pensionista não venha a receber quantia inferior ao percentual de 30% da remuneração ou proventos”.

Indenização

Quando age com negligência, o ente público fica obrigado a indenizar. Foi o que ocorreu no caso de uma segurada do INSS no Rio Grande do Sul (REsp 1.228.224). Ela viu parte de seus rendimentos ser suprimida do contracheque em razão de contrato de empréstimo consignado, mas o documento era falso. A segurada ajuizou ação contra o instituto pelo dano moral.

O tribunal de justiça estadual entendeu que eram ilegais os descontos nos proventos de aposentadoria da autora, porque não existia o acordo de empréstimo consignado, e que a autarquia previdenciária agiu com desídia ao averbar contrato falso.

No recurso analisado pela Segunda Turma do STJ, os ministros reafirmaram que, caracterizada a responsabilidade subjetiva do Estado, mediante a conjugação concomitante de três elementos – dano, negligência administrativa e nexo de causalidade entre o evento danoso e o comportamento ilícito do poder público –, a segurada tem direito à indenização ou reparação civil dos prejuízos suportados. O relator, ministro Herman Benjamin, considerou inviável alterar o valor dos danos morais, fixado em R$ 5 mil, por não serem exorbitantes ou irrisórios.

Bloqueio
Em outro recurso que chegou ao STJ, a Terceira Turma determinou que o banco se abstivesse de bloquear os valores referentes ao salário e à ajuda de custo de um cliente para cobrir o saldo devedor de sua conta. O relator, ministro Humberto Gomes de Barros, já aposentado, ressaltou que a conduta do banco não se equipararia ao contrato de mútuo com consignação em folha de pagamento, pois, neste último, apenas uma parcela do salário é retida ante a expressa e irrevogável autorização do mutuário (REsp 831.774).

Garantia
Em 2005, a Segunda Seção decidiu que é proibido ao cidadão revogar, unilateralmente, cláusula de contrato de empréstimo em consignação (REsp 728.563). A hipótese é válida indistintamente para cooperativas de crédito e instituições financeiras de todo o Brasil. O entendimento foi o de que as cláusulas contratuais que tratam dos descontos em folha de pagamento não são abusivas, sendo, na verdade, da própria essência do contrato celebrado.

O desconto em folha é inerente ao contrato, “porque não representa apenas uma mera forma de pagamento, mas a garantia do credor de que haverá o automático adimplemento obrigacional por parte do tomador do mútuo, permitindo a concessão do empréstimo com margem menor de risco", afirmou no julgamento o relator, ministro Aldir Passarinho Junior, já aposentado.

O ministro afastou o argumento de que o desconto em folha seria penhora de renda, prática proibida pelo Código de Processo Civil. Segundo ele, esse não é o caso do desconto em folha, sendo distintas as hipóteses.

O Código de Defesa do Consumidor está prestes a passar por mudanças. É provável que a comissão criada no Senado para sugerir as alterações inclua o empréstimo consignado no novo texto da lei.

terça-feira, 18 de outubro de 2011

PENA EXCESSIVA


CONDENADA A RECLUSÃO EM REGIME ABERTO OBTÉM LIBERDADE
A 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça concedeu a liberdade para a estrangeira de 21 anos, mãe de dois filhos, todos portadores de HIV, condenada a dois anos e quatro meses de reclusão em regime aberto, mas que ficou presa durante todo o processo. Ela está detida desde o flagrante no aeroporto de Brasília, em junho de 2008, quando tentou embarcar com cinco quilos de cocaína para a África do Sul. De acordo com o voto da relatora, ministra Laurita Vaz, "ainda que a condenada tenha sido presa em flagrante e assim permanecido durante toda a instrução, este fato não é, por si só, suficiente para impedir a concessão da benesse de apelar em liberdade".
A Justiça Federal do Distrito Federal, ao condená-la, deixou de aplicar pena restritiva de direito ou multa, "por ela ter experimentado sanção de natureza qualitativa e quantitativa superior à necessidade de prevenção e reprovação do crime". O juiz também determinou que fosse transferida, pela Polícia Federal, a uma instituição religiosa em São Paulo que abriga estrangeiros em situação similar à da ré.
SolturaA sentença foi alvo de Embargos de Declaração do Ministério Público Federal (MPF), por suposta omissão relativa ao alvará de soltura. O juiz justificou: "Não determinei a expedição desta ordem pelo fato de que o presídio iria liberá-la sem proceder sua transferência para outra instituição, o que importa dizer que a condenada perambularia pela ruas do Distrito Federal sem qualquer perspectiva de emprego ou de moradia."
"Esta situação afronta a dignidade da pessoa humana, mormente em razão do estado de saúde da ré (portadora do vírus HIV), e pelo fato de ser estrangeira, não contando com o apoio de parentes ou amigos neste país. Além disso, esta situação propiciaria um retorno às práticas ilícitas diante das dificuldades que seriam vivenciadas no cotidiano", afirma o juiz nos Embargos.
"Assim, para melhor conforto psicológico da ré, e de modo a evitar sua inserção em ambiente facilitador de práticas ilícitas, melhor que aguarde a finalização de seu procedimento de expulsão em uma comunidade religiosa que abriga condenados em situação similar à sua", completou.
O MPF apelou da decisão, buscando excluir a minorante aplicada pelo juiz, agravar a pena e fazer incidir uma majorante, além da imposição do regime inicial fechado. O Tribunal Regional Federal da 1ª Região, em liminar em Mandado de Segurança, concedeu efeito suspensivo à Apelação.
A Defensoria Pública da União sustentou que a ré é primária, de bons antecedentes e só cometeu o crime por dificuldades financeiras. Não existiriam motivos para sua prisão preventiva e a sentença teria, na verdade, aplicado perdão judicial tácito à condenada. Por isso, ela deveria ser imediatamente transferida à instituição religiosa, nos termos da sentença, ou posta em liberdade, com expedição do alvará.
Efeito suspensivoPara a ministra Laurita Vaz, a questão do perdão judicial não poderia ser apreciada pelo STJ por não ter sido objeto de deliberação nas instâncias ordinárias. Julgar a questão de forma originária no Habeas Corpus apresentado ao tribunal configuraria supressão de instâncias.
Quanto à liminar concedida ao MPF, a relatora apontou que a jurisprudência do STJ foi contrariada pelo TRF-1. "É incabível a impetração do Mandado de Segurança para conferir efeito suspensivo a recurso de apelação do Ministério Público, que não impede, de todo modo, a execução provisória da sentença de primeiro grau", explicou.
"Ademais, não obstante ser cabível Mandado de Segurança na esfera criminal, para sua utilização faz-se necessária a presença dos requisitos constitucionais autorizadores da violência ou ameaça de violência a direito líquido e certo, por ato ilegal ou abusivo de autoridade pública. No caso em comento, não foram demonstrados tais requisitos", completou.
Prisão e apelaçãoConforme a ministra, o simples fato de a condenada ter respondido presa à instrução criminal não serve para vedar a soltura enquanto a apelação do MPF é processada. A jurisprudência do STJ afirma que o réu nessa condição não tem direito de apelar em liberdade, mas no caso analisado a ré permaneceu presa por tempo "mais do que suficiente à concessão de todos os benefícios da execução da pena".
Ela acrescentou que a fixação do regime aberto também torna ilegal a prisão para aguardar julgamento de Apelação, "porquanto não pode a acusada aguardar o julgamento de seu recurso em regime mais gravoso do que aquele fixado na sentença condenatória". O HC do STJ determina a revogação da prisão preventiva imposta à condenada. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.
HC 131.150

sábado, 15 de outubro de 2011

CNJ decide que OAB deve cuidar da sala do advogado


POR PEDRO CANÁRIO
O Conselho Nacional de Justiça decidiu, na quinta-feira (13/10), que o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro não pode tratar de assuntos referentes à sala da OAB nos fóruns do estado. Segundo o CNJ, a sala é território da Ordem e é uma das prerrogativas constitucionais para a atuação dos advogados nos tribunais.
A decisão se deu no julgamento de Procedimento de Controle Administrativo impetrado pela OAB do Rio contra a Resolução 27/2011 do TJ, que a proibia, entre outras coisas, de cobrar pelo uso das copiadoras de suas salas nos fóruns do estado. O argumento para a edição da Resolução, segundo a OAB, é que o TJ comprou suas copiadoras por meio de licitação, e a Ordem violou essa licitação ao equipar a sala com máquinas próprias, não licitadas. Em requerimento ao CNJ, a OAB-RJ reclamou que o tribunal não pode "intrometer-se" nos assuntos da advocacia e, portanto, não pode disciplinar o uso das salas — ou de suas copiadoras.
Em decisão liminar (leia abaixo), o conselheiro Silvio Rocha deu razão aos advogados. Declarou, por ora, inválidos os artigos 3º, 4º, 6º, incisos II, III, IV, V e VI e artigo 9º,  inciso VIII, da Resolução 27/2011. A liminar ainda será discutida pelo pleno do CNJ.
Mas a OAB já comemora a decisão. Para o advogado Felipe Santa Cruz, diretor de apoio a subseções da OAB-RJ e presidente da Caixa de Apoio aos Advogados do Rio (Caarj), a posição do conselheiro Rocha é importante para os planos da Ordem no estado. "Estamos tentando implantar estruturas de digitalização, de cópia de documentos e de apoio aos advogados. Só que isso tem incomodado o tribunal, que vem criando problemas e não sabemos por que", conta. As salas, na verdade, conforme explica Santa Cruz, só atendem advogados, como parte do programa "OAB no Século 21", que ajuda os profissionais a entrar na era digital.
Santa Cruz ainda encontrou outro motivo para que o TJ deixe as salas da OAB em paz: "Se o advogado é bem atendido ali, ele pode sair das filas das copiadoras comuns, permitindo que o TJ atenda melhor a população". Ele ainda relata que, em fóruns pequenos, as empresas não têm interesse em participar das licitações, então acabam sendo usadas as copiadoras das salas da OAB.

sexta-feira, 14 de outubro de 2011

Prazo para agravar em ações penais é de cinco dias

O prazo para entrar com agravos contra despachos denegatórios, no Supremo Tribunal Federal, em processos penais, é de cinco dias. O entendimento foi fixado, por maioria, em sessão plenária na quinta-feira (13/10). Os ministros reconheceram a falha na redação da Resolução 451, que trata do assunto. Eles reforçaram a validade da Súmula 699 do Supremo, que já fixa o prazo em cinco dias, de acordo com o artigo 28 da Lei 8.038/1990.
A Resolução foi editada no início deste ano, para tentar fixar o entendimento do Supremo de uma nova lei, a Lei do Agravo (12.322/2010). O texto muda alguns procedimentos para recorrer de decisões que negam a subida de recursos especiais. Antes dessa lei, os prazos eram de dez dias para os processos civis e cinco dias para os penais. A nova resolução, contudo, fala apenas em dez dias para processos civis, sem mencionar os casos criminais.
Foi aí que o Superior Tribunal de Justiça se viu obrigado a fixar nova jurisprudência sobre o assunto. Entendeu que o prazo de dez dias para recorrer deve ser aplicado aos dois tipos de processo, afastando o que diz a Súmula 699. O STF, por sua vez, editou a Resolução 451/2010, afirmando que valia o que está na Lei do Agravo.
Os advogados, então, em obediência ao que decidiu o STJ, passaram a considerar o prazo de dez dias também em ações que tramitam no Supremo. E foi essa a discussão da sessão do STF, levantada pelo ministro Dias Toffoli, em questão de ordem. Por maioria, os ministros decidiram que ainda vale a Súmula 699 — e, portanto, o prazo de cinco dias em processos penais —, apesar do que diz a Resolução 451.
Na verdade, quando editou a resolução, o Supremo queria dizer que valiam os ditos na Lei do Agravo, mas os prazos continuavam inalterados. Mas os ministros decidiram, por maioria, que a Resolução 451 ficou mal redigida, o que permitiu a interpretação dúbia.
O ministro Dias Toffoli propôs que o prazo de 10 dias fosse mantido, desde a data da publicação da Resolução 451 até que sua redação seja refeita. Sugeriu ainda que o advogado deveria atestar boa-fé para que o recurso fosse aceito. Por maioria, a sua proposta foi rejeitada pelo Plenário da corte.
Paradoxo
Durante a sessão, foi levantada a questão de os processos penais lidarem com a liberdade do réu, um direito mais sensível do que os tratados em ações cíveis. Seria, então, necessário um prazo maior.
Mas o assunto foi resolvido de maneira simples: foi vencedor o entendimento de que o acusado sempre pode impetrar um Habeas Corpus, que não tem prazo e sempre pode ser decidido liminarmente. Esse argumento, segundo o advogado Pedro Paulo Guerra de Medeiros, que acompanhou a sessão, é um paradoxo.
Ele conta que há nos tribunais superiores uma política tácita de não acolher Habeas Corpus. Segundo Medeiros, os ministros alegam que o HC não pode ser usado como substituto recursal, nem para análise de provas e nem para questionar decisão transitada em julgado.
De acordo com o advogado, os tribunais superiores não gostam de Habeas Corpus. “Eles dizem que você vai sempre ter a opção do Habeas Corpus, mas quem conhece sabe que isso que eles estão falando é demagogia, porque eles estão negando [os HCs].”

INVENTÁRIO POR ATO NOTARIAL - PASSO A PASSO


1. Disposições de caráter geral e normas pertinentes - A Lei nº 11.441/2007 alterou dispositivos da Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973, Código de Processo Civil, possibilitando a realização de Inventário e Partilha por via Administrativa; vem sendo, também nominado de Inventário Extrajudicial, Inventário Notarial ou por Ato Notarial por ser realizado perante um Cartório de Notas.**
Aqui vamos tratar dos assuntos relacionados ao Inventario Extrajudicial, procurando fazê-lo de forma resumida e focando en passant, superficialmente, os temas mais questionados.
A matéria está normada nos artigos 982 e 983 do CPC, os quais, com as alterações introduzidas pela L. 11.441/07, passaram a ter a seguinte redação: ”Art. 982. Havendo testamento ou interessado incapaz, proceder-se-á ao inventário judicial; se todos forem capazes e concordes, poderá fazer-se o inventário e a partilha por escritura pública, a qual constituirá título hábil para o registro imobiliário. Parágrafo único. O tabelião somente lavrará a escritura pública se todas as partes interessadas estiverem assistidas por advogado comum ou advogado de cada uma delas, cuja qualificação e assinatura constarão do ato notarial. Art. 983. O processo de inventário e partilha deve ser aberto dentro de 60 (sessenta) dias a contar da abertura da sucessão, ultimando-se no 12 (doze) meses subseqüentes, podendo o Juiz prorrogar tais prazos, de ofício ou a requerimento das partes.”
A alteração do art. 982 foi a que possibilitou aos interessados maiores, capazes e concordes, a lavratura do Inventário por ato notarial, desde que não haja testamento deixado pelo de cujus; a do art. 983 aumentou o prazo paras a abertura do inventário de 30 para 60 dias, contados da data do falecimento do autor da herança, e estendeu o prazo do seu término de 6 (seis) para 12 (doze) meses; evidentemente este prazo se refere ao Inventário Judicial, mas por não ter sanção, dificilmente vem sendo cumprido em Juízo, o que não ocorre com o prazo da abertura do Inventário que importa, quando não cumprido, no pagamento de multa fiscal.
Isso vale dizer, em resumo, que temos duas situações distintas: a) o Inventário será sempre judicial quando houver testamento; interessado incapaz; ou mesmo sendo capazes, não houver concordância entre os interessados; b) poderá ser tanto judicial ou por via notarial (Escritura lavrada em Cartório), se não houver testamento e todos os interessados forem capazes e estiverem concordes; esta hipótese do Inventário ser feito extrajudicialmente, em Cartório, é uma faculdade que os interessados podem optar por ela ou pela via Judicial.
Na hipótese de falecimento de um dos cônjuges, não se esquecer que a parte a ser inventariada é somente a do cônjuge falecido; a do sobrevivente, não.
A lei 11.441/07 tratou também da Separação e Divórcio por via administrativa ou ato notarial, mas aqui trataremos tão somente da hipótese de Inventário.
Após a entrada em vigor da Lei 11.441/07, em 05-01-2007 (data da sua publicação no DOU), o Conselho Nacional de Justiça editou a Resolução nº 35 de 24 de abril de 2007 disciplinando a aplicação da L. 11.441/07 pelos serviços notariais e de registro, de sorte a evitar divergências em sua interpretação e uniformizar a adoção de medidas em todo o território nacional.
É oportuno consignar que o texto da Lei 11.441/07 usa a expressão “via Administrativa”, enquanto a Resolução do CNJ fala em “via extrajudicial” e “atos notariais”.
Nós preferimos a expressão: Inventário por ato notarial ou extrajudicial.
A Corregedoria Geral de Justiça dos Tribunais estaduais editaram Resoluções e Provimentos com instruções para os Cartórios nos respectivos Estados; a propósito, v.g., no Estado de São Paulo, o DJE de 19-12-2007 publicou o Provimento nº 33/2007 (cf. SITE www.tj.sp.gov.br ); no Estado de Minas Gerais no DJE de 02/03/2007 publicou o Provimento nº 164/CGJ (cf. SITE www.tj.mg.gov.br ); no Estado de Mato Grosso temos o Provimento 02/2007, de 06-02-2007 e Provimento nº 34/2007, ambos da CGJ/TJMT adequando normas à Resolução nº 35/2007 do CNJ (cf. SITE www.tj.mt.gov.br ) e assim por diante...
2. Quem pode fazer o Inventário em Cartório - A Lei 11.441/07 ao dar nova redação ao art. 982 do CCi 2002 estabeleceu que só as pessoas maiores de idade, capazes e concordes entre si é que poderão fazer o Inventário em Cartório, por via notarial e que sejam herdeiras, cônjuge supérstite ou cessionário de direitos hereditários, é curial.
Se entre os herdeiros houver um menor (incapaz) ou pessoa declarada judicialmente incapaz é impossível fazer o Inventário em Cartório; igualmente, se todos os interessados não chegarem a um acordo quanto à forma sugerida, o Inventário deverá ser feito em Juízo, pela via tradicional.
Não se faz o Inventário extrajudicial se o autor da herança deixou Testamento.
3. Documentação e elementos necessários para o Inventário extrajudicial - Os documentos necessários para a lavratura do Inventário por ato notarial são os seguintes:
a) Comprovante de pagamento do Imposto de transmissão de bens imóveis ITBI e ITCD, quanto houver doação ou transmissão translativa;
b) Certidões negativas de tributos em nome do Espólio (Municipal, Estadual e Federal)
c) Certidão de óbito do autor da herança;
d) Documento de Identidade Oficial e CPF dos interessados e do autor da herança;
e) certidão de casamento do cônjuge sobrevivente e dos herdeiros casados, assim como do pacto antenupcial registrado, se houver;
f) Certidões de propriedade dos bens imóveis, fornecidas pelos CRI das Comarcas onde estiverem localizados os bens;
g) documentos comprobatórios dos bens móveis, direitos e ações, inclusive de cotas em empresas e aqueles trazidos à colação pelos herdeiros;
h) certidão negativa da inexistência de testamento, onde houver Cartório específico de registro, o que poderá ser suprido por declaração das partes no corpo da Escritura;
i) procuração com poderes específicos para os interessados que não puderem comparecer pessoalmente ao ato notarial.
j) as partes deverão constituir um Advogado que deverá comparecer ao ato notarial, podendo ser um só para todos, ou cada interessado apresentar seu Advogado; a procuração da parte presente ao ato notarial poderá ser feita apud acta, isto é, no corpo da Escritura; esse(s) Advogado(s) deverá entregar ao Tabelião uma cópia de sua Carteira de Identidade fornecida pela OAB;
k) Uma minuta da Escritura apresentada pelo(s) Advogado(s) das partes, sendo esta facultativa.
l) Carnê do IPTU dos bens imóveis.
m) Indicação do Inventariante
4. Procedimento do Inventário em Cartório - Depois que as partes escolherem seu(s) Advogado(s) este deverá passar aos interessados todas as instruções e informações sobre o procedimento a ser adotado, indicar a documentação e pedir as respectivas cópias, inclusive esclarecendo o custo e o valor de seus honorários, segundo normas da OAB, fazer um contrato por escrito e combinar o serviço a ser prestado.
Providenciado o pagamento dos Impostos e de posse de todas as certidões e documentação necessária, os interessados ou o(s) Advogado(s) escolhido(s), indicará de sua livre escolha, o Cartório de Notas no qual será lavrada a Escritura de Inventário e Partilha, entregando a um Escrevente de sua confiança, a minuta (quando houver) da Escritura e os documentos, agendando uma data para comparecimento dos interessados.
Na data aprazada, deverão estar presente todos os interessados e respectivo(s) Advogado(s); não se deve olvidar que os herdeiros devem indicar um deles para ser o Inventariante, com poderes, inclusive, “ad judicia” para atuar nos litígios em andamento.
A estrutura da Escritura deve obedecer, preferencialmente, uma ordem cronológica na sua elaboração, por títulos, v.g.: I) qualificação das partes; II) Do autor da herança; III) Do Óbito; IV) Da Inexistência de Testamento e de outros herdeiros; V) Do cônjuge supérstite; VI) Dos Herdeiros; VII) Da Nomeação de Inventariante; VIII) Dos Advogados que representam as partes na Escritura; IX) Dos Bens Imóveis; X) Dos Direitos, Ações, Móveis; XI) Dos Litígios; XII) Das Dívidas); XIII) Das Renúncias; XIV) Das Doações translativas e abdicativas e bens trazidos à colação; XV) Das Certidões e documentos apresentados; XVI) Das declarações das partes e Advogados manifestando concordância com os termos da Escritura; XVII) Dos Impostos pagos; XVIII) Das Declarações finais.
É aconselhável que o Escrevente já tenha feito a Escritura de comum acordo com o(s) Advogado(s) que irão “assistir” as partes, devendo ler na presença dos interessados e esclarecer as dúvidas eventualmente levantadas por qualquer parte.
Entendemos que a lei 11.441/2007 não foi feliz quando exigiu a presença de um Advogado para “assistir“ as partes; o instituto jurídico da “assistência” é específico para certos casos e juridicamente no Inventário extrajudicial as partes não são assistidas, mas sim, representadas por Advogado.
Depois de encerrado o ato notarial com a assinatura dos interessados ser-lhes-á entregue um translado para ser levado ao registro no CRI, ou nos CRIs se os bens imóveis estiverem localizados em Circunscrições diferentes; esse documento ou certidão do Inventário servirá também para ser apresentado ao DETRAN para a transferência de propriedade de veículos, às Repartições públicas e empresas para regularizar a nova propriedade do titular dos bens, direitos e ações.
Os documentos das partes e interessados entregues no Cartório, deverão ficar arquivados em livro próprio, razão pela qual não deverá ser apresentado no original, salvo para conferência pela Escrevente.
Em certos casos, como os previstos no art. 1523 do CCi 2002 e outros que a situação possa exigir, é possível aos herdeiros comparecerem ao Cartório para ser lavrada uma Escritura de Inventário Negativo, superando assim impedimento matrimonial para o casamento, ou outra qualquer necessidade.
Há quem defenda que somente o cônjuge supérstite tem interesse no Inventário Negativo, dispensada a presença dos herdeiros, mas entendemos que, com o devido respeito das opiniões em contrário, que a ele devem comparecer as mesmas partes que compareceriam ao Inventário extrajudicial, se bens a inventariar houvesse.
Havendo cônjuge supérstite, este poderá na própria Escritura do Inventário extrajudicial, fazer a doação de sua meação aos filhos, com reserva a si de usufruto vitalício (cf. arts. 1390 e seguintes do CCi 2002).
5. Autor da herança - O autor da herança é o de cujus, a pessoa que faleceu e que deixou bens a serem inventariados; sua certidão de óbito, de casamento, se houver, identidade e CPF deverão fazer parte da documentação a ser entregue ao Cartório, por cópia autenticada.
6. Da Ordem da Vocação hereditária e parentesco - O art. 1.829 do CCi 2002 estabelece a ordem da sucessão legítima, como sendo:
I) aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente. Salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens (art. 1.640, parágrafo único), ou se, no regime de comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares.
II – aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge;
III) ao cônjuge sobrevivente;
IV) aos colaterais.
Segundo doutrinam GISELDA MARIA FERNANDES NOVAES HIRONAKA, “a sucessão considera-se aberta no instante real ou presumido da morte de alguém, fazendo nascer o direito hereditário e operando a substituição do falecido por seus sucessores a título universal nas relações jurídicas em que aquele figurava”. 
“Chama-se legítima a sucessão que provém por força de lei, isto é, cabe ao diploma legal em vigor dizer quem recolherá a herança. Vimos, ao tratar da abertura da sucessão e de sua transmissão, que a herança é entregue aos herdeiros sem necessidade de uma ação própria para adquiri-la. Mas nem todos os herdeiros, nomeados pelo Código Civil, têm igual direito, nem poderia ser dividida a herança em tantas partes quantos forem os herdeiros legítimos. Possivelmente em qualquer herança seriam dezenas de chamados e, com a divisão entre todos, o valor de cada um poderia ser irrisório”. 
Aberta a sucessão apura-se a "legítima" que é a "porção da herança que o testador não pode dispor por ser, por lei, reservada aos herdeiros necessários” ; o art. 1.847 do CCi 2002 explicita como se apura o valor destinado à legítima dos herdeiros necessários; “Art. 1.847. Calcula-se a legítima sobre o valor dos bens existentes na abertura da sucessão, abatidas as dívidas e as despesas com funeral, adicionando-se, em seguida, o valor dos bens sujeitos à colação”.
A Ordem da Vocação Hereditária abrange os colaterais até o 4º grau, segundo dispõe o art. 1.839 do CCi 2002: “Se não houver cônjuge sobrevivente, nas condições estabelecidas no art. 1.830, serão chamados a suceder os colaterais até o quarto grau”.
Maria Luíza Povoas Cruz de maneira objetiva e clara esclarece a ordem de consanguinidade ou parentesco natural em linha reta e na colateral ou transversal. Diz a ilustre Magistrada: “Os parentes em linha reta são os ascendentes (pais, avós etc) e os descendentes (filhos, netos, bisnetos etc). Frisa-se que a linha reta é infinita, sendo as pessoas que fazem parte dela sempre considerados parentes à luz do Código Civil, por mais remota que seja a distância. Nos termos dos artigos 227, § 6º, da CF e 1.596 do Código Civil, não há mais diferenciação quanto à filiação. O nosso ordenamento jurídico civil reconhece o parentesco e o direito sucessório somente até o 4º grau (artigos 1.592 e 1.839 do Código Civil), como sendo de: 2º grau – irmãos; 3º grau – sobrinhos e tios; 4º grau, tios-avós e sobrinhos netos”.
Já na classe dos colaterais, são chamados à sucessão os herdeiros na seguinte ordem: a) irmãos colaterais de 2º grau; b) tios e sobrinhos, colaterais de 3º grau; c) primos, tios-avós e sobrinhos-neto, colaterais de 4º grau.
A sucessão se faz por cabeça e por estirpe ou representação; por exemplo, na sucessão de “A” herdaram 4 (quatro) filhos: “B”, “C”, “D” e “E”, sendo que cada um herda, por cabeça, 1/4 (um quarto) ou 25% da legítima; todavia se um dos irmãos, v.g. “B”, for falecido e deixou três filhos “M”, “N” e “O”, cada um destes (M, N e O) herdarão 1/3 de ¼ ou 1/3 de 25%; esta sucessão dos filhos de “B” é chamada por estirpe ou representação.
A título meramente esclarecedor, se na sucessão de “A”, não concorrer os filhos “B”, “C”, “D” e “E”, mas somente os netos (filhos de B, C, D e E), não importa o número de netos deixados por cada filho, pois não haverá sucessão por representação, mas sim por cabeça; todos os netos ou herdeiros de uma mesma classe herdarão por cabeça.
Se “B” deixou um filho, “C” dois filhos, “D” três filhos e “E” quatro filhos, a herança líquida será dividida em partes iguais entre os 10 (dez) netos, recebendo cada um, por sua legítima 1/10 ou 10% do monte partível.
O Código Civil no título da Sucessão Legítima (art. 1.829 e seguintes), norma as hipóteses de sucessão de irmãos bilaterais, unilaterais, a ordem da vocação hereditária, a concorrência com cônjuge sobrevivente e demais possibilidades de sucessão.
Chamada à sucessão uma classe mais próxima, automaticamente ficam excluídas as mais remotas.
7. Divergência entre herdeiros - Se não houver entendimento entre os herdeiros para que o Inventário seja feito por ato notarial, os interessados deverão fazê-lo por via Judicial.
8. Bens a serem inventariados - Devem ser inventariados todos os bens imóveis, móveis, direitos, ações e participações em sociedade, assim como saldo bancário, veículos, obras de artes, aeronaves, iates, lanchas, veleiros, animais PO e POI, semoventes etc...
O Imposto de transmissão incide sobre o valor de todos os bens, razão pela qual, para ficar menos oneroso o Inventário, como será feito amigavelmente, sugerimos que a partilha dos bens que não depende de transferência por registro, pode ser por acordo sem relacionar no Inventário; todavia se for de razoável valor, o Advogado constituído deverá avaliar a pertinência ou não dessa medida, posto que se entrar na declaração de Imposto de Renda, deverá ser fornecida ao fisco a origem.
9. Bens no exterior - “A competência para escrituras públicas de inventário e partilha no Brasil, cinge-se aos bens situados no território nacional. Essa a regra para o inventário judicial (arts. 80 e 96 do CPC) que se aplica igualmente à escritura pública”. 
Assim não podem ser objeto de Inventario extrajudicial os bens que o autor da herança tenha deixado no exterior; todavia, nada impede que no corpo da Escritura seja feita disposição sobre eles desde que não façam parte do monte-mor e haja a ressalva que serão inventariados no país de sua localização observadas as leis locais.
10. A intervenção de Advogado - O § 2º, do art. 1.124-A do CPC, com a redação dada pela Lei 11.441/2007, dispõe que “O tabelião somente lavrará a escritura se os contratantes estiverem assistidos por advogado comum ou advogados de cada um eles, cuja qualificação e assinatura constarão do ato notarial”.
Isto quer dizer que é indispensável a presença de um Advogado para “assistir” ou representar as partes na Escritura de Inventário lavrada por via extrajudicial, em Cartório.
Questiona-se a hipótese da parte interessada outorgar procuração a um Advogado para representá-la na Escritura; há autores que vêm entendendo que mesmo nesta hipótese deve ter um outro Advogado.
Com o devido respeito das posições em contrário, entendemos que o objetivo da lei é a “assistência jurídica” às partes, para que não fiquem à mercê do que fazer ou deixar de fazer, assim como possibilitar a lavratura da Escritura dentro dos parâmetros legais.
Ora, se a parte constituiu um Advogado para representá-la, o objetivo da lei será alcançado, pois é um profissional habilitado que estará presente na Escritura; além do mais, não se pode olvidar que o Tabelião não é mero espectador no ato notarial; ele também tem o dever de orientar as partes quanto ao significado do ato, esclarecer e orientar as dúvidas dos interessados.
11. Cessão de Direitos, renúncia translativa e abdicativa - A cessão de direitos assim como a renúncia translativa ou abdicativa são formas de transferência de direitos hereditários a outrem, herdeiro ou não.
A Cessão de Direitos Hereditários, que também é feita por Escritura Pública, está prevista no art. 1.793 do CCi 2002: “O direito à sucessão aberta, bem como o quinhão do que disponha o co-herdeiro, pode ser objeto de cessão por escritura pública”.
O cessionário deve comparecer à Escritura e assumir as mesmas obrigações de qualquer outro herdeiro, submetendo-se às normas que regulam o direito à legítima.
Quanto à Renúncia, tanto pode ser translativa como abdicativa; pode se referir aos bens da legítima ou somente a uma parte deles; esta tanto pode ser por escritura pública, em separado, como na própria escritura do Inventário.
A renúncia pura e simples denomina-se abdicativa, e os bens que caberiam ao renunciante vão para o monte partível e serão incluídos na legítima que será partilhada entre os demais.
Na sucessão legítima, a parte do renunciante acresce à dos ouros herdeiros da mesma classe, e, sendo ele o único desta, devolve-se aos da subseqüente.
Já a renúncia, v.g. que os filhos fazem em favor da genitora, quando falece o pai, é denominada renúncia translativa ou “in favorem” assim como aquela feita em favor de um outro herdeiro, preferencialmente por doação; o que acontece com a renúncia translativa e doação é que há necessidade de ser pago, além do imposto causa mortis,recolhido ao fisco antes da lavratura da Escritura de Inventário, o imposto de transmissão inter vivos.
O herdeiro também poderá, ou por Escritura Pública em separado, ou no corpo do ato notarial do Inventário, fazer a doação de toda sua legítima ou de parte dela, pagando também os dois impostos (causa mortis inter vivos); nesta hipótese normalmente não se fala em renúncia in favorem de outro herdeiro, mas de doação.
Doutrina Ulderico Pires dos Santos que “a renúncia feita por um herdeiro, em favor do outro que o renunciante indicar como beneficiário, não beneficia a este, e sim ao monte. Se a sua intenção for a de beneficiar a determinado herdeiro com a sua parte na herança, terá de fazê-lo por meio de doação, que nada tem a ver com a renúncia”. 
Na hipótese de doação, havendo vários herdeiros, os demais deverão, por título expresso no corpo da Escritura Pública do Inventário Extrajudicial, manifestar sua concordância com a doação, não se opondo a ela.
Quando na divisão do monte partível não houver possibilidade de divisão cômoda entre os herdeiros, ou porque o bem a partilhar é só um imóvel, por exemplo, ou vários bens de divisão impossível em partes iguais, é possível um herdeiro receber parte maior do que outro, fazendo a “torna” ou “devolução em dinheiro” do que for necessário para completar sua legítima; sobre a parte a maior que o herdeiro obrigado à torna receber, pagará o devido imposto de transmissão sobre a diferença acima de sua legítima.
Na hipótese de bens existentes no exterior entendemos que poderá ser feita a referência desses bens na Escritura, esclarecendo que o Inventário deles será feito no país onde estejam localizados, obedecendo as normas de cada país; todavia, seu valor não poderá entrar para o monte e se algum herdeiro resolver ficar com eles, isto deverá constar da Escritura que ditará o critério de divisão da herança no Brasil, sem levar em consideração o bem ou bens existentes no exterior, podendo o Advogado orientar os herdeiros para a possibilidade de renúncia abdicativa da legítima do herdeiro que ficar com os bens no exterior, ou, dependendo dos valores, fazer a devida compensação com torna de quem ficar com legítima acima do valor legal.
12– Imposto de transmissão causa mortis, inter vivos e doações. Nos Inventários por ato Notarial todos os impostos devidos, deverão ser recolhidos antecipadamente, antes da Escritura, pois no corpo desta, ao final, o Escrevente habilitado a lavrar a Escritura deverá transcrever os dados das respectivas guias pagas.
Deverá ser recolhido o ITBI (imposto causa mortis) referente aos valores da herança, assim como o ITCMD relativo às doações.
Além dos impostos os interessados deverão pagar as despesas com a Escritura e Advogado.
13 - Monte-mor e monte-partível. Por monte-mor entende-se todo o acervo hereditário, a totalidade dos bens deixados pelo autor da herança; é a denominada expressão econômica de todo o patrimônio do falecido, que dará o valor do Inventário; é representado pela totalidade dos bens sucessíveis, antes de deduzidas as despesas e encargos da herança; é sobre ele que incide o percentual correspondente ao recolhimento do imposto causa mortis.
Para a ministra Nancy Andrighi, "no inventário, o pedido tem como expressão econômica, invariavelmente, todo o patrimônio do de cujus, consequentemente, o valor da causa há de ser atribuído ao monte-mor". (STJ REsp 454948)
O monte partível é a herança líquida, depois de deduzidos do acervo os legados, o imposto causa mortis e as dívidas do espólio, diz Gisele Leite, em artigo publicado na Revista Jus Vigilantibus, de 22-12-2002.
Resumindo, o acervo hereditário, em seu todo, na abertura da sucessão é representado por um patrimônio que tem um valor econômico, que é chamado de monte-mor; depois que forem pagas as dívidas, despesas e encargos da herança, o que sobrar para formar a legítima dos herdeiros e cônjuge supérstite (quando houver) é o monte-partível.
14 – PartilhaA finalidade do ato notarial pelo qual é lavrada uma Escritura Pública é inventariar o patrimônio do de cujus (autor da herança) apurar o “Monte-mor” e resolvidas as questões financeiras do espólio, atribuir e transferir aos interessados a sua legítima.
Os interessados são: o cônjuge sobrevivente (meeiro), cuja meação não entra no Inventário e Partilha, herdeiros (aqueles relacionados à ordem da vocação hereditária) e cessionários ou donatários se houver.
A partilha será feita depois que as dívidas, despesas e encargos do espólio tiverem sido pagos, ou resolvido entre os herdeiros como serão pagas as dívidas e recairá sobre os bens remanescentes no acervo hereditário, excluída a meação do cônjuge supérstite, quando houver, pois esta não entra no monte-partível como dito acima.
A Partilha só existirá se forem vários os concorrentes à herança; se for só um, não haverá partilha, mas sim adjudicação.
Ainda que feita por ato notarial, a partilha pode ser anulada ou rescindida por via judicial, se for constatado que nela têm vícios e defeitos que a invalidam, tais como aqueles previstos na legislação codificada civil: erro, dolo e coação.
15 - Rerratificação da Escritura e sobrepartilhaA rerratificação da Escritura de Inventário é sempre possível para corrigir erros, omissões e até mesmo para atender às exigências de Notas de Devolução do Tabelião do Cartório de Registro de Imóveis, tantas quantas forem necessárias para atender às normas de Registro Público.
Normalmente faz-se rerratificação quando os números de RG e CPF constaram irregulares na Escritura, ou quando a descrição de bens não obedeceu rigorosamente as características constantes dos títulos e Matrículas.
À Escritura de rerratificação deve ser feita por Escritura Pública, obedecendo as mesmas formalidades da Escritura original, e a ela devem comparecer as mesmas partes, ainda que representadas por novos procuradores com poderes outorgados por Instrumento Público.
A sobrepartilha é necessária para inventariar e partilhar bens que não constaram da Escritura originária do Inventário.
Geralmente são bens que estavam em litígios e as partes interessadas preferiram deixá-los para partilhar após o término do processo, não havendo impedimento para serem inventariados os direitos em litígio, deixando apenas para partilha futura o objeto do litígio; neste caso a partilha inicial é parcial.
Dizem os doutrinadores que geralmente são deixados para sobrepartilha os bens que dependem ainda de uma decisão judicial para integrar sem qualquer problema a legítima dos herdeiros; os sonegados, aqueles que algum herdeiro recebeu como adiantamento de legítima e não os levou à colação; bens que estão em local de difícil acesso ou distantes dos interessados e no prazo de sessenta dias, não dispõem de tempo ou condições suficientes para avaliá-los e proceder à partilha.
Tanto a rerratificação como a sobrepartilha devem ser feitas por Escritura Pública, nos moldes da Escritura do Inventário, com a presença das mesmas partes e obedecendo a mesma formalidade.
16 - Dívidas do Espólio e litígiosAs dívidas do Espólio devem ser pagas pelo Inventariante escolhido pelos herdeiros; para tanto usará de recursos existentes em caixa ou alienará algum imóvel cujo valor seja suficiente para pagamento da dívida.
As partes podem também reservar um determinado bem para pagamento da dívida, colocando tal bem na legítima de todos, ou de um só, tudo dependendo da capacidade financeira da herança e do acordo entre as partes.
Se necessário, com a concordância de todos os herdeiros poderão requerer em Juízo um Alvará para alienação antecipada do imóvel ou dação em pagamento; se houver discordância entre os herdeiros, a Escritura não poderá ser lavrada e as partes interessadas deverão fazer o Inventário pela via Judicial.
O Inventariante deverá ingressar com pedido de substituição processual nos processos em litígios, onde o autor da herança era parte, e defender os interesses do Espólio até final liquidação do processo.
Os litígios devem ser relacionados na Escritura de Inventário, na qual os herdeiros poderão decidir que o objeto do litígio entra na legítima de um determinado herdeiro, ou ficará para sobrepartilha.
Os herdeiros não respondem por dívidas do autor da herança que sejam superiores ao valor da herança, conforme dispõe o art. 1.792 do CCi 2002: “O herdeiro não responde por encargos superiores às forças da herança; incumbe-lhe, porém, a prova do excesso, salvo se houver inventário que a escuse, demonstrando o valor dos bens herdados”.
17 – Sonegados e Colação. O processo de Inventário é o instrumento de arrecadação de todos os bens deixados pelo de cujus, autor da herança, e que serve para documentar a transferência do patrimônio, originário da herança, que nos termos da legislação civil transmite o domínio e posse a seus herdeiros e sucessores, no momento da abertura da sucessão, apud Prof. DrSalomão de Araújo Cateb, in Direito das Sucessões, Ed. Atlas, São Paulo, 2008.
No processo de Inventário são arrecadados todos os bens do autor da herança, inclusive aqueles que o falecido transferiu aos herdeiros; a omissão pelos herdeiros dos bens recebidos em vida do autor da herança, caracteriza a sonegação, pois quem esconde e omite bens que deva fazer a colação, pratica ilícito civil e é punido; diz o art. 1.992 do CCi 2002: “O herdeiro que sonegar bens da herança, não os descrevendo no inventário quando estejam em seu poder, ou, com o seu conhecimento, no de outrem, ou que os omitir na colação, a que os deva levar, ou que deixar de restituí-los, perderá o direito que sobre eles lhe caiba”.
Se o bem recebido pelo herdeiro como adiantamento de legítima já tiver sido alienado, ele deverá pagar ao monte da herança o valor do respectivo bem à data da abertura da sucessão, salvo se o doador dispensar o donatário da colação, e isto acontece quando a doação sai da parte disponível do doador. (art. 1.995 CCi 2002).
O princípio básico da colação é igualar as legítimas, como norma o art. 2002 do CCi 2002: “Os descendentes que concorrerem à sucessão do ascendente comum são obrigados, para igualar as legítimas, a conferir o valor das doações que dele em vida receberam, sob pena de sonegação”.
Doutrina Gisele Leite em artigo publicado a 30-12-2002 na Revista Jus Vigilantibus: “Ressalte-se que antes da avaliação do monte hereditário, deve-se proceder a colação que é o ato pelo qual os herdeiros descendentes que concorrem à sucessão do ascendente comum declaram no inventário as doações e os dotes que dele em vida receberam, sob pena de sonegados, para que sejam conferidas e igualadas as respectivas legítimas (art. 1.786 C)".
É dever imposto ao herdeiro, pois a doação dos pais aos filhos importa adiantamento da legítima(art. 1171 CCi). Aliás, o dote no velhusco código previsto no regime dotal de bens é um adiantamento de legítima(o novo Codex Civil sepultou definitivamente tal regime matrimonial de bens).
A colação é feita em substância, isto é, os bens doados retornam em espécie à massa hereditária para ulterior partilha (art. 1787 CCi). Pode ser feita também por estimação, voltando ao monte apenas o seu valor, se o donatário já os tiver alienado (art. 1.792 CCi)".
Em outras palavras, Carlos Maximiliano doutrina que “Colação é o ato de reunir ao monte partível quaisquer liberalidades, diretas ou indiretas, claras ou dissimuladas, recebidas do inventariado, por herdeiro descendente, antes da abertura da sucessão”.
Como dito, a finalidade jurídica da colação e efeitos de sonegados, visam igualar as respectivas legítimas, para que um herdeiro não venha a receber mais do que os outros; as legítimas devem ser iguais para todos, ressalvada a hipótese de ter saído da metade disponível do doador.
18 – Registro. Uma vez terminada a Escritura de Inventário, o Cartório fornecerá aos interessados um traslado da Escritura, assim como tantas certidões quantas forem necessárias para regularizar a transferência de bens aos herdeiros (veículos, aeronaves, barcos, telefones, ações etc e até mesmo imóveis).
É preferível que cada herdeiro receba uma certidão da Escritura de Inventário e Partilha para providenciar os registros dos bens que lhes foram destinados na partilha; alguns preferem um só traslado que será levado a registro junto aos CRI de cada bem, e depois são extraídas várias certidões dos novos registros para serem entregues aos interessados.
O Cartório de Registro de Imóveis tem o dever de examinar e conferir a Escritura de Inventário e Partilha, com o que consta de seus registros de sorte a garantir o princípio da continuidade e legalidade; qualquer dúvida ou divergência será objeto de Nota de devolução para que o interessado providencie a rerratificação.
É aconselhável que os interessados e especialmente o Advogado que deve comparecer à lavratura do ato notarial, confira e reconfira antes de autorizar as assinaturas, todos os dados da Escritura, zelando principalmente para que na descrição dos bens imóveis, seja obedecido ipsis literis, os dados da especificação dos imóveis tal qual consta do registro, pois se houver qualquer divergência, não dará registro.
É na hora do registro que o Tabelião o CRI verificará se já foram averbadas alterações de nomes de ruas, numeração de imóveis, estado civil das partes, divórcio, segundo casamento, pacto antenupcial, quando houver e outros dados que estiverem em divergência com os dados já registrados; havendo alteração, será solicitado ao interessado por Nota de Devolução, as devidas correções.
Quando for apresentada para registro uma Escritura ela receberá um número de prenotação, válido por 30 (trinta) dias; dentro de prazo se houver alguma exigência do CRI, o interessado deverá cumpri-la sob pena de ser cancelada a prenotação.