segunda-feira, 15 de agosto de 2011

PENHORA EM CONTA CORRENTE

Trata-se de ação de execução, na qual foi penhorada, em conta bancária, quantia referente à restituição do imposto de renda. A devolução do imposto de renda retido ao contribuinte não descaracteriza a natureza alimentar dos valores a serem devolvidos, quanto se trata de desconto parcial do seu salário. É impenhorável o valor depositado em conta bancária, referente à restituição do imposto de renda, cuja origem advém das receitas compreendidas no art. 649, IV, do CPC. A verba relativa à restituição do imposto de renda perde seu caráter alimentar, tornando-se penhorável, quando entra na esfera de disponibilidade do devedor. Em observância ao princípio da efetividade, mostra-se desrazoável, em situações em que não haja comprometimento da manutenção digna do executado, que o credor seja impossibilitado de obter a satisfação de seu crédito, sob o argumento de que os rendimentos previstos no art. 649, IV, do CPC, gozam de impenhorabilidade absoluta. (...)

INTEGRA DO ACÓRDÃO

COMENTÁRIOS:

A decisão é da 3ª T. do STJ e foi relatada pela Minª. Nancy Andrigui. A questão da impenhorabilidade é histórica. A lex poetelia papiria editada antes de cristo pelo Império Romano proibia que o pagamento da dívida fosse pago pelo corpo do devedor, a partir de então a garantia do pagamento das dívidas passaram a recair sobre o patrimônio do devedor. Contudo, subtrair todo o patrimônio do devedor pode ser uma pena excessivamente onerosa e desnecessária. Excluir alguns bens do alcance do credor e da penhora é plenamente justificável. O art. 649 do CPC é a fonte legislativa em nosso ordenamento jurídico que excluiu alguns bens do alcance da constrição. Há ainda a Lei 8.009/1991, que instituiu mais uma impenhorabilidade, que é a do bem de família.

Nessa seara, materialmente, há um limite tênue entre a necessidade de cumprimento das obrigações que cada pessoa assume, aí vale lembrar, que sem o cumprimento das obrigações não há sociedade organizada, de outro lado, existe o sistema capitalista que tanta riqueza gerou nos últimos séculos. Para ele, o estímulo ao consumo e a produção não têm limites e não há nada de errado nisso. Este sistema, contudo, foi criado para tolerar um certo nível de inadimplência aceitável que é decorrente da própria atividade empresarial, cujo pilar de sustentação é a assunção do risco cada vez maior, de um lado, e o lucro cada vez maior, de outro lado, como prêmio ao final. O imperativo do cumprimento das obrigações encontra limite na própria sobrevivência digna do devedor e da sua família, pois aí reside a oportunidade do devedor/consumidor readquirir sua capacidade financeira para honrar compromissos antigos e assumir novos. Esta é a lógica do sistema.

Esta é uma questão que a Minª. Nancy Andrighi bem percebeu, cumprir as obrigações é necessário, contudo, é necessário reservar-se recursos para que o devedor possa viver com dignidade. São elucidativas as palavras da Ministra. Senão vejamos:


«... Todavia, a constatação acima não leva à conclusão de que impenhorabilidade em conta corrente seja absoluta, porque, se assim fosse, como frisei no julgamento do RMS 25.397/DF, de minha relatoria, DJ 03.11.2008, estar-se-ia protegendo situações absurdas em que, por exemplo, o «(...) trabalhador contraia empréstimos para cobrir seus gastos mensais, indo inclusive além do suprimento de necessidades básicas, de modo a economizar integralmente seu salário, o qual não poderia jamais ser penhorado. Considerando que, de regra, cada um paga suas dívidas justamente com o fruto do próprio trabalho, no extremo estar-se-ia autorizando a maioria das pessoas a simplesmente não quitar suas obrigações.».

A interpretação mais correta a se atribuir ao art. 649, IV, do CPC, nessas situações, é aquela que se leve em consideração a ratio legis que norteia o dispositivo, qual seja, a proteção da quantia monetária necessária para a subsistência digna do devedor e de sua família.

O valor excedente ao suprimento de necessidades básicas, encontrando-se depositado em conta corrente, perde o seu caráter alimentar e sua condição de impenhorabilidade e passa a se enquadrar no art. 655, I, do CPC. Esse dispositivo estabelece que a penhora terá como objeto, preferencialmente, dinheiro, em espécie ou em depósito ou aplicação em instituição financeira.

Dessarte, é possível penhorar os valores depositados na conta corrente do executado, a título de restituição de Imposto de Renda, desde que não haja comprometimento da sua digna subsistência. ...» (Minª. Nancy Andrighi).»

Nenhum comentário: