domingo, 19 de maio de 2013

Precisamos começar a dar exemplo dentro de casa

Sergio Tostes é advogado, formado pela Faculdade de Direito da UERJ, Mestre em Direito pela Harvard University e pela New York University, advogado militante há 45 anos e sócio senior de Tostes e Associados Advogados

Desde a Proclamação da República, sempre que alguma crise institucional se prenunciava no Brasil, pairava ostensiva ou veladamente um fantasma: a intervenção militar. Esse quadro mudou radicalmente com a posse, em 1985, do primeiro presidente civil após o golpe de 1964. De lá para cá, especialmente a partir da promulgação da Constituição de 1988, toda crise institucional tem sido resolvida no âmbito dos três poderes constitucionalmente constituídos. Esse registro é relevante no quadro atual de grave crise institucional do país, com o confronto aberto entre setores dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário.
Fato é que, quando as crises institucionais se apresentam nos dias de hoje, logo aparecem representantes qualificados de cada um dos três Poderes da República para botar água na fervura, diagnosticar o fato gerador da crise e, finalmente, saná-la. De certa forma, é o processo constitucional de freios e contrapesos sendo manejado com equilíbrio, sensatez e espírito republicano. Por que, então, vivemos sobressaltados por essas crises, geralmente — repito, geralmente — motivadas por interesses subalternos de agentes públicos também menores?
Antes que ocorra uma esgarçadura desnecessária, faça-se um repto. Ao invés de um Poder medir forcas com o outro por motivações, via de regra, tolas, que cada Poder olhe para dentro de si e analise o que está errado em suas próprias entranhas. Cada um deve considerar os aspectos de sua atividade constitucional que possam estar desapontando o destinatário final do exercício do poder público: o povo brasileiro.
Comecemos o exercício observando dentro de nossa própria casa, o Judiciário. Uma boa forma de fazê-lo, com efetividade, é autilização do método cartesiano: dividir as questões em tantas partes quantas sejam necessárias para resolver cada uma delas. E, de preferência, partindo das mais simples para as mais complexas.
Perguntemos, então, a nós mesmos se estamos bem cumprindo nossa missão, se ficarmos inertes em situações preocupantes tais como: Quando as partes de um processo judicial esperam meses e meses para cumprimentos de providências meramente burocráticas; quando magistrados, mesmo na comarca da capital, ignorando as regras expressas das leis e dos ordenamentos a eles cometidos, não se fazem encontradiços para as partes e os advogados, no seu horário normal de trabalho do serviço público; quando ocorrem promoções por antiguidade ou merecimento de magistrados que, notoriamente, não são detentores da indispensável qualificação técnica e moral; quando as vagas destinadas nos tribunais a advogados e promotores são preenchidas por critério casuístico, por vezes, em função de alguma relação de parentesco.
Esse questionamento se estende também às organizações de classe, inclusive, no âmbito dos advogados que se deixam levar pela lassidão dos princípios morais; exatamente aquilo de que deveriam ser os grandes bastiões.
Enquanto isso, o Executivo e o Legislativo cometem erros atentatórios à moralidade e ao pudor quando, em nome de princípios difusos como a suposta "governabilidade", fazem concessões ou mesmo cometem aberrações anti republicanas.
Comecemos a dar o exemplo dentro de casa, sanando nossas deficiências e, em seguida, prossigamos para que a democracia no Brasil, mais do que uma conquista, pavimente o caminho para acabarmos de vez com a prevalência secular dos interesses dos“donos do poder”. Seja como faziam os donos de engenho de antanho, seja como o fazem hoje os que manipulam a máquina pública em seu próprio benefício.

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